terça-feira, 30 de junho de 2020

Possessed - Exploration (1971 - 2006)


Tem histórias que são dignas de um best seller, carregadas de dramaticidade e que não está restrito apenas ao quesito musical, mas marcadas por algumas tragédias que impacta decisivamente a sua história, a sua trajetória musical e só as bandas obscuras e undergrounds nos proporciona esses momentos, alguns pitorescos, outros exóticos e alguns tristes, muito triste. É o caso da banda POSSESSED. 

Não se enganem essa não é a famosa banda de death metal norte americana formada no início da década de 1980, mas nascida na Inglaterra, em meados para o final dos anos 1960, mais precisamente em 1969. O Possessed era uma banda underground que flertava na cena blues e rock da região britânica de West Midlands e tinha na figura de Vernon Pereira, vocalista e guitarrista, o ponto central de sua história.


O indiano Vernon Pereira foi para a Inglaterra aos 15 anos de idade e integrou a Band of Joy, banda inglesa formada na região de West Bromwich, em 1965 e por vezes conhecia por Robert Plant and the Band of Joy  que abrigou, além de Plant, como também o baterista John Bonham, sendo esses que veriam formar o Led Zeppelin, mais tarde. 

Vernon, que era primo da esposa de Plant, chegou a tocar no Band of Joy por algum tempo quando conheceu Mick Reeves, baixista e também guitarrista que tinha tocado na banda SugarStack que tinha como vocalista Al Atkins e aí vem mais uma pitoresca curiosidade: Quando Reeves saiu da SugarStack, Atkins e os demais músicos que permaneceram decidiram reformular a banda, a começar pelo nome, mudando para simplesmente Judas Priest! Sim, o Judas Priest tão conhecido entre os headbangers!

 
Essa banda seria o embrião do Judas Priest. Vernon e Reeves tinham a intenção de formar um power trio, talvez devido a fama atingida pelo Cream, que tocava pesado e investia no blues rock e era essa a proposta que os músicos queriam para a nova banda. 

A propósito, Mick Reeves levara para a banda, que ainda não tinha sido formada, um novo instrumento da época, uma guitarra de dois braços, sendo que um dos braços era o baixo e o outro, a guitarra, então Reeves teria duas funções na nova banda, de baixista e guitarrista. E para formar o line up é convocado Phil Brittle, baterista, que também tinha tocado na Band of Joy e tinha absorvido todas as técnicas de bateria com o velho e eterno Bonham. Pronto, a banda estava formada!

Possessed

Começaram a ensaiar e compor algumas músicas para figurar no seu primeiro álbum. Mas era nos shows que a banda visava conquistar algum reconhecimento e reputação, eram nos shows que fluíam as ideias para as novas músicas. 

Em 1971 o álbum, que se chamaria “Exploration” estava prestes a ficar pronto e estava em negociações com o famoso selo Vertigo, para lançar o álbum, mas tiveram alguns problemas contratuais ou simplesmente não queriam lançar “Exploration”, não se sabe exatamente o motivo pelo qual o trabalho não ter sido lançado naquele ano, ficando na “geladeira”, engavetado.


Mas apesar dos reveses que impediram o lançamento de “Exploration” não ter sido lançado em 1971, a banda seguiu em frente, tentando driblar as dificuldades da falta de apoio da gravadora e continuou a fazer os seus shows, quando Brittle decidiu sair da banda, em 1972, sendo substituído por Chris Andrews. 

Junto a ele, entraram o baixista Stephen McLoughlin e o vocalista Terry Davies. Apesar das rotatividades de músicos a banda seguiu sua turnê quando o pior acontece, a maior das tragédias, em 1976. 

A banda estava voltando de um show quando a van onde estavam bateu violentamente de frente com um caminhão tanque cheio de gasolina, matando Vernon Pereira, de apenas 32 anos de idade e Mick Reeves de 27 anos, enquanto Andrews e McLoughlin ficaram gravemente feridos. 

Era o fim do Possessed de forma trágica e precoce. “Exploration” traz uma proposta sonora que vai do hard rock ao blues rock com passagens generosas de psych e rock progressivo. Eram as vertentes que estavam nascendo no início dos anos 1970 e que estavam começando a ficar em voga, um trabalho singular e eclético que vale a audiência e atenção de todos os audófilos de plantão. 

O álbum abre com “Darkness, Darkness” que começa com um riff pegajoso e marcante com solos mais simples e diretos, mas que traz um peso, uma música crua e direta com um bom trabalho vocal.

"Darkness, Darkness"

Segue com “The Love That You Gave” com uma levada mais funkeada, dançante, uma bateria marcada com um vocal mais gritado e de bom alcance e solos lisérgicos de guitarra. A faixa título, “Exploration” traz alguns riffs de guitarra mais radiofônicos, uma pegada mais comercial e simples, um pouco cadenciada e com ensaios a alternâncias rítmicas, mas é mais uma música direta e simples.

"The Love That You Gave"

“Climb The Wooden Hills” começa mais visceral e pesada com um riff de guitarra mais sujo e arrastado com um bom trabalho da “cozinha”, uma bateria pesada e um baixo mais pulsante, com um solo de guitarra lembrando um pouco o country. Uma faixa bem interessante!

"Climb the Wooden Hills"

“Dream” também começa pesadona, protagonizada pela guitarra suja e agressiva, um solo direto, curto e cru, bateria pesada e cheio de viradas de tirar o fôlego, essa é uma das melhoras faixas do álbum, sem sombra de dúvida. “All Night Long” é aquela música típica de um “rock de festa”, um hard rock dançante, malicioso, cadenciado e bem pesado graças a solos de guitarras mais solares e animados.

"Dream"

“Disheartened & Disillusioned” já começa com o destaque do baixo, mais marcado e pulsante com a bateria seguindo o ritmo e a guitarra dando o tom mais pesado. Essa faixa já traz um Possessed mais virtuoso, mas elaborado em suas harmonias e melodias, com uma tendência para o hard prog.

"Disheartened & Disillusioned"

“Thunder & Lightning” começa extremamente pesada, guitarras distorcidas e agressivas que, entre riffs e solos, capitaneiam um senhor petardo de hard rock, com uma pegada mais heavy, um heavy metal de vanguarda sem dúvida.

"Thunder & Lightning"

“Love 'Em & Leave 'Em” tira o pé do acelerador e entrega uma balada melódica e introspectiva com uma sinergia viajante entre vocal e um violão tocado delicadamente ao fundo e a bateria pulsando discretamente. Uma música mais contemplativa e melancólica, diria. “Exploration Pt. II” parecia seguir a mesma proposta da faixa anterior, soft, tranquila, ao som, meio folk, do violão e assim permanece até seu fim.

"Love 'Em & Leave 'Em"

Mas “Reminiscing” traz de volta o peso do álbum com riffs de guitarra meio bluesy, mas tocada com peso, com agressividade, com destaque, mais uma vez, do trabalho vocal e dos back vocals também.

"Reminiscinhg"

E fecha com “I See The Light” que já começa densa, ao estilo Black Sabbath: sujo, agressivo, com viradas rítmicas. Um hardão tipicamente setentista.

"I See the Light"

Trinta anos depois de ser gravado, “Exploration”, em 2001, as fitas masters com as músicas gravadas estavam nas mãos de Lee Dorian, vocalista do Napalm Death e Cathedral, que apresentou ao antigo integrante do Possessed, Phil Brittle, mas ainda não fora gravado oficialmente. 

Somente em 25 de setembro de 2006 o álbum foi lançado, a partir de tais fitas, trazendo, finalmente a luz o álbum “Exploration” do Possessed. O vocal pode não ser um primor mas me remete a um som de "rock de garagem" que muito aprecio e traz aquela falta de pretensão e um desleixo típico do estilo.

Apesar de tantos reveses, tragédias e mortes que esse álbum e banda sofreram, graças a abnegados e apreciadores da grande música esse álbum ganha vida celebrando e homenageando aos que se foram, de forma tão triste e precoce. Um álbum póstumo que traz à vida Vernon Pereira e Mick Reeves que tanto trabalharam para que esse momento acontecesse. Uma pérola mais do que recomendada.





A banda:

Vernon Pereira no vocal e guitarra
Mick Reeves no baixo e guitarra
Phil Brittle na bateria


Faixas:

1 – Darkness, Darkness
2 - The Love That You Gave
3 - Exploration
4 - Climb the Wooden Hills
5 - Dream
6 - All Night Long
7 - Disheartened & Disillusioned
8 - Thunder & Lightning
9 - Love 'Em & Leave 'Em
10 - Exploration Pt. II
11 - Reminiscing
12 - I See the Light



Possessed - "Exploration" (1971 - 2006)



sábado, 27 de junho de 2020

Museo Rosenbach - Live 72 (1992)


Uma banda é o que é nos palcos. No palco a banda exerce a sua divindade, revela a sua essência, interagindo com o público e a comunicação é a música, atrelado a sentimentos de pura catarse que se torna difícil elencar, afinal são múltiplas as reações, mas que comungam da mesma intenção: a ode à música. 

Bandas como a italiana MUSEO ROSENBACH, nascida nos longínquos anos 1970, desenharam, de forma magistral, a sua história nos palcos. E tem sido de uma forma tão arrebatadora, tão visceral, que a sua concepção sonora vai além da frieza e da perfeição exacerbada dos estúdios. 

O Museo Rosenbach é uma das poucas bandas italianas que não se rendeu a zona de conforto do estereótipo, flertou com várias vertentes, tais como rock progressivo, hard rock e soube, como poucos, trilhar uma história de vanguarda na cena rock italiana que, no início dos anos 1970, se definia, se delineava, absorvendo influências que vinha da Inglaterra como, por exemplo, a nova música virtuosa e progressista, da juventude transviada, ávida por novidades e que os músicos, também jovens, compartilhavam daquele frescor dos novos tempos. 

E assim os jovens músicos do Museo Rosenbach se inspiraram para edificar a sua música. E a gênese da banda remonta no ano de 1971 e se chamava inicialmente "Inaugurazione Museo Rosenbach", a partir da fusão de duas bandas do final dos anos 1960 de Sanremo que se chamavam La Quinta Strada e Il Sistema, este última chegou a lançar um álbum pelo selo Mellow Records, entre os anos de 1991 e 1992 e o La Quinta Strada era apenas uma banda cover. 

Il Sistema - "Il Viaggio Senza Andata" (1969-1971)

A propósito, essa nova banda tocava covers de Cream, Jimi Hendrix, The Animals, Steppenwolf, entre outras bandas pesadas que estavam em voga na transição das décadas, moldando o que, em um futuro bem próximo, seria o Museo Rosenbach e que entregaria aos rockers italianos um esboço do que seria conhecido, anos depois, como metal progressivo. 

A primeira formação da banda contava com o futuro integrante da obscura banda italiana Celeste, Leonardo Lagorio no saxofone e flauta e o cantor Walter Franco. Mas foi com a formação que tinha Enzo Merogno na guitarra, Alberto Moreno no baixo, Giancarlo Golzi na bateria, Pit Corradi no melotron, órgão de hammond e piano, Stefano "Lupo" Galifi no vocal e Leonardo Lagorio no sax e flauta que seria responsável pelo primeiro registro discográfico do já Museo Rosenbach, com o nome alterado, de 1972, um show gravado no Park Hotel em Bordighera no verão daquele ano e que é a cidade natal da banda, uma cidade que fica no oeste da Ligúria. Falo do "Live 72".

Museo Rosenbach

Porém este material, obscuro e raro, só ganhou a luz, só foi lançado, vinte anos depois, no ano de 1992, quando a gravadora Mellow Records desengavetou essa pérola sonora que mostra uma banda poderosa, virtuosa, intensa, de personalidade, mostrando toda a sua força nos palcos, mostrando o quão era competente ao vivo, embora as condições em que fora captado esse show não tenha sido as melhores.

Foi sim concebido em condições precárias, mas ainda assim o Museo Rosenbach mostrou a que veio naquele imemorial ano de 1972, antes de ter lançado seu clássico absoluto, em 1973, o emblemático "Zarathustra", mas que neste registro ao vivo algumas músicas que figurariam no primeiro de estúdio da banda seriam executadas, provavelmente pela primeira vez para um seleto e agraciado público. 

O álbum abre, com a faixa, que apareceria em “Zarathustra” chamada “Intro / Dell’eterno Ritorno” que já entrega as credenciais do grande Museo: peso, virtuosismo e uma entrega instrumental impressionante de seus músicos, com passagens rítmicas inacreditáveis, com destaque para o vocal de grande alcance de Galifi, além da “cozinha” bem afiada, mostrando uma incrível sintonia entre o baixo de Moreno e a bateria de Golzi, com o teclado de Corradi trazendo uma camada progressiva a faixa. Um típico proto metal italiano!

“Dopo” é mais cadenciada, que alterna, com maestria, os teclados e a guitarra em um salutar duelo entre os instrumentos, com solos de tirar o fôlego, além de um baixo pulsante e uma bateria marcada com queda para o jazz rock.

Na sequência vem “Season Of The Witch / It’s A Man’s Man’s Man’s World” uma exuberante suíte de quase quinze minutos que inicia com um solo de guitarra viajante e inebriante com uma levada meio bluesy, ao som doce e mesmerizante do piano contrastando com o vocal rasgado de Galifi, poderoso, sendo seguido pelo “esquadrão bélico instrumental”, mas que logo voltava para a suavidade capitaneada pelo piano e alternando com uma pegada mais dançante, diria algo até meio latinizado. E nessas alternâncias rítmicas e ousadas a música tem a sua sequência com o destaque do piano, vocal, riffs sujos de guitarra, o baixo seguindo o ritmo e a bateria investindo em vertentes que vai do blues ao hard rock. 

A apresentação fecha com outra música que apareceria no álbum “Zarathustra”, de 1973, “Della Natura” que traz a indefectível introdução de teclado “rivalizando” com solos pesados e diretos de guitarra que se silenciam para o vocal limpo e dramático assumir o protagonismo da música, mas que logo se junta ao trovão sonoro gerado pelos instrumentistas de mão cheia. Nela se percebe, ou melhor, se ouve, um hard progressivo muito vigoroso e bem executado.

No mesmo ano deste show de 1972, as faixas de “Zarathustra” já estavam prontas e o selo Ricordi ofereceu  um contrato de gravação para o Museo Rosenbach, ganhando então a luz do dia o clássico do hard prog italiano e mundial, em abril de 1973. 

"Zarathustra" (1973)

Mas após o lançamento do álbum a banda desaparece do cenário musical, talvez pelo fato de seus posicionamentos políticos e ideológicos, o que era comum na época, na década de 1970, entre as bandas de rock italianas, era uma época de belicismo político. 

O Museo Rosenbach fora acusado de ter inclinações de direita pela imagem do ditador Benito Mussolini na capa de seu debut e pelas letras inspiradas em Nietzsche, certamente isso fortaleceu para o seu precoce fim.

Mas a banda ressurge nos anos 2000 com dois dos seus músicos históricos, Alberto Moreno e Giancarlo Golzi, lançando o álbum “Exit”, em 2000 e logo depois, em 2012, o "Zarathustra Live in Studio", contando com o ilustre vocal de Galifi. 

"Exit" (2000)

Então finalmente vem ao mundo o terceiro álbum de estúdio do Museo Rosenbach, o excelente “Barbarica”, de 2013. O selo Mellow Records ainda agrupou uma série de raridades da banda nos seus primórdios chamada “Rare and Unreleased”. 

"Barbarica" (2013)

A banda está forte na ativa e brinda o seu público o seu calibre poderoso nos palcos e o “Live 72” foi o pontapé inicial da corroboração de seus feitos ao vivo. E que tenha vida longa!




A banda:

Enzo Merogno na guitarra
Alberto Moreno no baixo
Giancarlo Golzi na bateria
Pit Corradi no melotron, órgão de Hammond e piano
Stefano "Lupo" Galifi no vocal
Leonardo Lagorio no sax e flauta

Faixas:

1 - Intro / Dell’eterno Ritorno
2 - Dopo
3 - Season of the Witch / It’s A Man’s Man’s Man’s World
4 - Della Natura




Museo Rosenbach - "Live" (1972)



terça-feira, 23 de junho de 2020

LummeN - Ao Vivo no Rio Jazz Club (1999)


O rock progressivo brasileiro é de uma vasta riqueza. E estamos identificando, observando e constatando com um trabalho de extrema dedicação, interesse e um intenso garimpo com um grande aliado: a internet e disseminação de tais conteúdos sonoros e suas bandas, por verdadeiros guerreiros amantes do rock progressivo, verdadeiros abnegados que não esmorecem e compartilham o que há de bom na música brasileira de qualidade que está escondido nos porões escuros do prog rock. Eu não conhecia essa banda e fiquei curioso pela sua música, sobretudo após as descrições destas em leituras de resenhas e matérias. Uma banda que sempre militou em nossos domínios territoriais, mas que por desconhecimento ou quaisquer outros motivos que não saberia narrar, não conhecia e que, após um breve hiato de um ano, retorna aos palcos para um momento de comemorações e celebrações de sua história. Falo da banda LummeN.

LummeN em 1999

O significado do nome “Lummen” foi retirado da fábula “O Senhor dos Anéis”, de J.R.R. Tolkien, que na língua dos Altos Elfos significa luminoso, brilhante, estelar. Lummen surgiu da criação e idealização do multi-instrumentista, compositor e ator Marco Aurêh e fez a sua estreia no dia 15 de setembro de 1995 na Concha Acústica do Museu Imperial na cidade de Petrópolis, no Rio de Janeiro com o show “Na Corte do Rei”.

Marco Aurêh

Pelo título que ostenta neste show, torna-se perceptível ou pelo menos nos dá uma pista de sua proposta sonora que, entre outros aspectos, nos revela elementos do período medieval e renascentista em uma fusão erudita e contemporânea. A banda, por ter um ator como frontman também exploram elementos teatrais com um interessante trabalho estético, com os seus integrantes trajados com indumentárias da época a qual propuseram a sua sonoridade, como bobos da corte, nobres, etc. Os arranjos e os instrumentos usados para produzir a sua música seguem, é claro, tal proposta, mostrando grande multiplicidade, uma rica variedade e improvável aos ouvidos mais incrédulos que vai dos óbvios instrumentos de sopro como flauta a outros mais eruditos como violino, bandolim, viola de 10, a instrumentos de viés progressivos como teclado, violão e instrumentos mais viscerais do rock n’ roll como guitarra. Essa mescla garante muita inspiração, liberdade criativa, cênica e visual. É o conceito entre o clássico e o moderno, o antigo e a tecnologia. Uma resposta a esse conceito são os telões projetando imagens medievais, mostrando a tecnologia a serviço do medieval, do passado. As influências da banda me parecem evidente ao ouvir a sua música e vai de Renaissance, principalmente pelo cerne de sua proposta, ao Jethro Tull pelo som do LummeN. A banda após várias apresentações na capital e interior do Rio realizou em fevereiro de 1997, três shows no Rio Jazz Club, conhecida casa situada no Rio e que não existe mais. Tais shows resultaram no primeiro lançamento do Lummen, em 1999, chamado “Ao Vivo no Rio Jazz Club”, pelo selo Som Interior, minha dica da banda, tendo repercussão na cena nacional e internacional. 


A banda, na época do lançamento do álbum, tinha a seguinte formação: Marco Aurêh no vocal, flauta, violão e teclado, André Henriques no violino, bandolim, violão e backing vocal, Celso Schopen na guitarra, Fred Mendonça no baixo e backing vocal e Marcelo Ksesky na bateria. O álbum abre com a faixa “Mansão” que já mostra todo o cenário sonoro medieval com o uso de flautas e violinos.

LummeN - "Mansão" ao vivo em Petrópolis (2013)

Segue com “Vulcão”, uma linda música, uma balada meio folk, com um belo violão acústico e uma harmonia linda, irretocável. “Destino Imaginário” é uma das melhores faixas do álbum e te proporciona uma viagem agradável tendo o destaque do violino e acordes simples, mas necessários de guitarra com solos bem executados também, me remete alguns momentos de experimentalismo e viagem lisérgica também. 

LummeN - "Destino Imaginário" ao vivo em Petrópolis (2013)

“Tempo Imóvel” começa com uma bateria meio tribal, percussiva e soa em seguida os primeiros acordes de flauta, uma viagem sonora, com tons psicodélicos com desconcertantes solos de guitarra.

LummeN - "Tempo Imóvel" ao vivo no Neblina Rock em 2019

“O bobo da corte” traz aquele clima medieval de novo, uma música bem teatralizada, afinal você consegue visualizar a cena, de acordo com o andamento da faixa. E fecha com a espetacular “Relembrando” com destaque, mais uma vez para o violino e acordes excepcionais de guitarra que lembra muito King Crimson em seu primórdio. Um som progressivo de tirar o fôlego.

LummeN - "Relembrando", ao vivo na Concha Acústica do Museu Imperial

A banda teve muitas formações ao longo da década de 90 até encerrar as atividades em 2001 e remontada em 2013, sendo realizados vários shows até 2015. Em 2017 a banda retornou com o show “Medieval Contemporâneo” que contou com todos os ingredientes que fez do Lummen conhecido entre os fãs puristas de prog rock e que teve a participação  de uma cantora soprano e uma edição de pinturas do pintor e músico do Quaterna Réquiem e Vitral, Cláudio Dantas, e o surrealista belga Renné Magritte. A banda está na ativa até hoje com Marco Aurêh na sua concepção visual e conceitual. Álbum essencial de uma banda genuinamente brasileira.


A banda:

Marco Aurêh no vocal, flauta, violão e teclado
André Henriques no violino, bandolim, violão e backing vocal
Celso Schopen na guitarra
Fred Mendonça no baixo e backing vocal
Marcelo Ksesky na bateria

Faixas:

1 - Mansão
2 - Vulcão
3 - Destino Imaginário
4 - Tempo imóvel
5 - O bobo da corte
6 - Relembrando





sábado, 20 de junho de 2020

Maxophone - Maxophone (1975)


É inquestionável que a cena progressiva italiana é rica e brilhante. Não se tem a questão quantitativa apenas, mas a qualitativa também e que se equivale nos brindando com diversidade cultural que impacta positivamente a sua música, fazendo dela o nome que a define: progressiva, progressista, porque é de vanguarda, arrojada, sofisticada sim, mas por muitas vezes marginal e urgente, pois encarnam os conceitos primordiais do rock n’ roll: contestador, transgressor por natureza. 

Bandas como o MAXOPHONE sintetizam, com extrema fidelidade, tais quesitos mencionados. A banda foi resultado, na sua gênese, dessa miscelânea cultural, enfatizada fortemente na sua música. Resultado este inovador, revolucionário e que até hoje serve de referência para a história contemporânea do rock progressivo italiano que, a plenos pulmões e com muita força, segue florescendo com o frescor da novidade, relevante.


A sua atemporalidade personifica a cena e, mesmo que obscura e com uma pequena carreira discográfica, marcou época. O vilipêndio da indústria fonográfica e das agitações político-ideológica na Itália nos longínquos anos 1970 quase pôs tudo a perder, colocando o Maxophone em uma condição total de ostracismo, mas a força de abnegados, como os apreciadores da música e profissionais incansáveis que representam pequenas e undergrounds gravadoras disseminaram, lançaram e multiplicaram para o mundo a música seminal desta banda.

Graças também ao advento de tecnologias da informação, das redes sociais o trabalho dessas grandes bandas e, claro, a persistência dessas, a qual o Maxophone faz parte, a obra assume uma espécie de legado.

O Maxophone foi formado na cidade de Milão, na região da Lombardia, no final do ano de 1972 por jovens músicos que tinham estilos diversificados e peculiares sendo que metade foi formada em conservatórios italianos e a outra metade pertencia a uma base mais pesada, mais entusiasta da música como o “classic rock” e o jazz rock, por exemplo. 

E esses jovens eram: Roberto Giuliani (vocal, piano e guitarra), Alberto Ravasini (vocal, baixo, violão e flauta) e Sandro Lorenzetti (bateria), conhecido no meio jazzístico da Lombardia. A eles se uniram Sergio Lattuada (Hammond e teclados), Maurizio Bianchini (trompa, vibrafone, percussão e voz) e Leonardo Schiavone (clarineta, flauta e saxofone).


Essa mistura, essa “salada sonora”, proporcionou à música da banda algo novo, gratas novidades, pouco corriqueiras até então na cena progressiva à época como trompa, trompete, clarineta e vibrafone, além dos habituais instrumentos do cotidiano progressivo incluindo um maravilhoso sax e um hammond de presença marcante. 

Pronto! O caráter sonoro do Maxophone estava delineado! Uma banda diversificada, eclética, versátil, muito particular e extremamente interessante, que ia do progressivo sinfônico, música clássica, jazz rock, rock, folk etc. E é nessa estrutura que o debut do Maxophone foi edificado e lançado em 1975, homônimo, que será alvo de meu texto hoje.

Maxophone ao vivo

Com algumas relevantes apresentações ao vivo, o Maxophone passou a atrair a atenção do público. Tanto que a banda conseguiu lançar o seu primeiro 45 rotações: "C'è un paese al mondo/Al mancato compleanno di una farfalla". 

A banda se apresentou em vários festivais, excursionando inclusive em uma turnê de razoável porte com a banda Area, em 1976. Neste mesmo ano a banda se apresentou no importante e icônico Festival de Montreaux, na Suíça, e logo depois gravou uma participação na emissora de televisão italiana, RAI, sendo lançado em 2018 comercialmente, com muitos materiais raros e valiosos. 

Mas antes, em 1975, a banda lançou o seu emblemático álbum, “Maxophone”, pelo selo "Produttori Associati", tanto na versão original, cantado em italiano, como na versão inglesa.


Em meados da década de 1970 algumas bandas aderiram ao formato inglês para alçar mercado norte-americano e também todo o mundo, resultado do sucesso internacional de bandas como Premiata Forneria Marconi e Le Orme. 

A banda que gravou este álbum, era formada por Sergio Lattuada no piano, órgão, piano elétrico, vocal, Roberto Giuliani na guitarra, piano, vocal, Leonardo Schiavone no clarinete, sax, flauta, Maurizio Bianchini na corneta, trompete, vibrafone, percussão, vocal, Alberto Ravasini no vocal, baixo, violão e Sandro Lorenzetti na bateria com Paolo Rizzi no baixo acústico, Eleonora de Rossi no violino, Susanna Pedrazzini no violino, Giovanna Correnti no cello e Tiziana Botticini na harpa. 

“Maxophone” é um álbum técnico, mas emocional e orgânico, com uma dramaticidade em sua sonoridade, bem peculiar em se tratando do progressivo italiano.

É pesado, progressivo, clássico com jazz rock, sinfônico e passagens agradáveis de folk. A faixa inaugural é “C'È Un Paese Al Mondo” que abre com um linda linha de piano agradável que irrompe em um peso protagonizado por guitarra e bateria, cadenciando com passagens suaves, mostrando o casamento perfeito entre o clássico e o rock.

"C'É Un Paese Al Mondo", live at RAI 1976

“Fase” começa com o peso da guitarra, dando o tom mais pesado da música, um legítimo hardão setentista, um protagonismo dos instrumentos, com passagens interessantes de jazz.

"Fase", live at RAi 1976

“Al Mancato Compleanno Di Una Farfalla” tem a introdução de uma guitarra clássica em uma atmosfera contemplativa e onírica, mostrando um pouco de folk, música celta, a música tradicional e regional italiana se faz presente, mas da suavidade a música fica mais enérgica, mostrando ótimas passagens de ritmo com linhas de hammond excelentes.

 "Al Mancato Compleanno Di Una Farfalla", live at RAI 1976

“Elzeviro” tem a introdução excepcional do vocal, poderoso e dramático, pois a letra enaltece em seu teor questões políticas e sociais, como em todo o álbum, muito comum entre as bandas progressivas italianas da época. Destaque nesta música fica para o riffs de guitarra, vocal nos momentos mais “calmos” e para órgão dando a camada sonora necessária para a sequência da música.

"Elzeviro", live at Tokyo 2014

“Mercanti Di Pazzie” traz a introdução da harpa tirada da obra “Sonata per arpa” gravada originalmente por Paul Hindemith em 1939. É uma música viajante, uma sensação de paz e tranquilidade, de transcendência da alma.

"Mercanti Di Pazzie", live at Tokyo, 2014

O álbum fecha com “Antiche Conclusioni Negre”, a mais longa faixa do álbum, e começa enérgica, animada, uma faixa solar, sinfônica, tendo instrumentos de sopro como destaque, alternando momentos mais serenos. Não podemos negligenciar a bela participação de linhas de baixo e teclado também, uma música de banda, todos participando intensamente e com destaque nesta faixa.

"Antiche Conclusioni Negre", live at RAI 1976

Em 1977 o Maxophone produziu material para um segundo álbum, mas a gravadora faliu e o projeto foi engavetado vendo a luz somente em 2006 em uma caixa com CD e DVD de nome “From Cocoon To Butterfly”, incluindo algumas gravações inéditas em um período que compreende entre os anos de 1973 e 1975, além de alguns vídeos raros do show que fizeram no estúdio da RAI em Turim. 

"From Cocoon to Butterfly" (2006)

Porém anos antes, nos anos 1990, graças ao ressurgimento do rock progressivo italiano com novas bandas, em 1993, o álbum de estreia, “Maxophone” foi reeditado pelo selo Mellow e em 1997, também foi relançado a versão italiana pela mesma gravadora. 

Em 2001 o selo Akarma republicou o álbum em vinil com a adição de algumas músicas que saíram somente nos 45 rotações. Um álbum essencial, um tesouro que a terra progressiva nos brindou, que o Maxophone nos entregou para deleite eterno. 





A banda:

Sergio Lattuada no piano, órgão, piano elétrico, vocal.
Roberto Giuliani na guitarra, piano, vocal.
Leonardo Schiavone no clarinete, sax, flauta.
Maurizio Bianchini na corneta, trompete, vibrafone, percussão, vocal.
Alberto Ravasini no vocal, baixo, violão.
Sandro Lorenzetti na bateria


Com:

Paolo Rizzi no baixo acústico.
Eleonora De Rossi no violino.
Susanna Pedrazzini no violino.
Giovanna Correnti no cello.
Tiziana Botticini na harpa.


Faixas:

1 - C'e Un Paese Al Mondo
2 - Fase
3 - Al Mancato Compleanno Di Una Farfalla
4 - Elzeviro
5 - Mercanti Di Pazzie
6 - Antiche Conclusioni Negre



"Maxophone" - Versão em italiano


"Maxophone" - Versão em inglês