segunda-feira, 19 de fevereiro de 2024

Plus (Argentina) - No Pisar El Infinito (1976)

 

Amigos leitores hoje finalmente irei reparar um erro, que considero deveras grave, deste blog: esquecer das bandas argentinas! E não se enganem não foi reflexo de rivalidades futebolísticas ou coisa que o valha, mas talvez a falta da devida oportunidade, até pelo fato de ser ainda um blog jovem e que tem muito a progredir.

É sabido que a cena rock argentina é extremamente diversa, no que tange às vertentes sonoras, sobretudo nos anos 1970: prog rock, hard rock são os estilos mais difundidos pelas bandas e com essa prolífica qualidade, as cenas corroboram, com um público ávido em consumir esse produto desde sempre.

E a banda de hoje representou com extrema fidelidade e competência a cena pesada do rock n’ roll argentino e felizmente e finalmente escreverei algumas linhas acerca dessa seminal e pouco difundida banda. Falo do PLUS.

Plus

O nome é mais do que sugestivo para essa banda que soube honrar, com a sua curta, porém efusiva discografia, a cena hard rock sul americana, com particularidades bem visíveis, bem sentidas em sua sonoridade, a tal da latinidade é peculiar.

Mas como aqui cabe um pouco de história, falemos dos primórdios do Plus. O embrião da banda surgiu, como sempre costuma ser, da dissolução de outra banda, a “Escarcha. Três de seus integrantes, Julio Sáez, guitarrista, Hugo Racca, baixista e Cacho D’Aria, baterista, juntaram-se a Saúl Blanch, vocalista, para formar o Plus, isso em 1975.

O Plus surgiu em um momento convulsivo na política argentina, pouco antes do golpe de Estado, onde o país cairia nas mãos da ditadura militar, tirando Isabel Perón do poder, em 24 de março de 1976 chefiada pelo Tenente General Jorge Rafael Videla, Almirante Emilio Massera e o Brigadeiro General Orlando Ramón Agosti.

Um período de repressão se instauraria na Argentina e, claro, algumas expressões ou manifestações contraculturais seriam alvos de ataques e censuras e o Plus, bem como toda a cena rock, sofreria com esses reveses, tendo poucas ofertas de shows e incentivo por parte de gravadoras que, com medo, evitaria contratar e/ou financiar os “famosos subversivos” ou “hippies” que poderiam colocar à prova a harmonia do governo opressor.

E foi exatamente no turbulento ano de 1976 que o Plus lançaria seu debut intitulado “No Pisar el Infinito”, alvo de minha resenha de hoje. A Plus representaria, além dos entraves de falta de oferta de shows, o rock alternativo, cuja cena abundava em bandas progressivas, de jazz rock, fusion etc, sendo uma das principais bandas de seu estilo, juntamente com bandas do naipe de El Reloj e Vox Dei.

Essa era efetivamente a intenção quando da transição do Escarcha para o Plus. Era criar um projeto que privilegiasse a pegada de clássicas e medalhonas bandas do estilo espalhadas pelo mundo, tais como: Deep Purple e Led Zeppelin. Não sou um entusiasta das comparações, mas é inegável que o Plus traz essas inspirações em seu álbum de estreia.

“No Pisar el Infinito” foi gravado no Film Records Studios entre 20 de julho e 4 de outubro de 1976 e lançado pela “TK Discos” de uma forma quase que “artesanal”, sem um grande orçamento e também não teve o devido apoio quando a banda seguiu em turnê.

Porém mesmo com as baixas ofertas para se apresentar devido ao opressor cenário político com a censura militar, a banda conseguiu realizar alguns shows e se mostrou bastante enérgica em palco, afinal, a sua música ajuda e muito para essa condição.

O público curtiu muito “No Pisar el Infinito”, a banda, a cada show, pelo menos os poucos que teve, ganhava experiência, uma consistência e uma sinergia incrível. O álbum é primordialmente calcado no típico, porém indefectível, hard rock setentista, cru, com levadas latinas bem peculiares, sendo agressivo, pesado, mas cadenciado e radiofônico em algumas faixas. A formação do Plus para este álbum tinha: Julio Saéz na guitarra e vocal, Saúl Blanch no vocal, Hugo Racca no baixo e vocal e Horácio D'Arias na bateria.

O álbum é inaugurado com a faixa monstruosa de “Noches de Rock and Roll” que já introduz como um soco na jugular com riffs pesados de guitarra, baixo pulsante e bateria em uma batida agressiva e pesada. É um “exemplar” não apenas de hard rock, mas é perceptível o peso mais voltado para o heavy metal. A seção rítmica traz o groove, a guitarra o peso e vocal engloba tudo sendo alto e gritado. Abre o álbum dizendo a que veio e representando a sua proposta devidamente.

"Noches de Rock and Roll"

“Tomame como Soy” é mais cadenciada, suja, traz à lembrança “Master of Reality”, do Black Sabbath, diria sem medo, apesar de não ser tão taxativo, afinal essas percepções são muito particulares. O vocal soa mais melódico, mais bem trabalhado juntamente com os backing vocals. Os riffs de guitarra continuam sendo destaque juntamente com os seus solos, apesar de simples, mas diretos.

"Tomame como Soy"

“Ya Tenés por quién Luchar” muda o “humor”, o ambiente do álbum, com uma linda balada, com um lindo vocal, bem mais melódico do que faixa anterior, algo meio dramático, emocional, com um violão ao fundo, mas logo entra a seção rítmica que deixa a música mais agitada, mas que não foge à sua proposta.

"Ya Tenés por Quién Luchar"

A sequência traz “La Chance Sutil” retorna ao hard rock com a rápida introdução de bateria que abre para riffs de guitarra pegajosos e baixo mais pesado, além de pulsante. O vocal, melódico, implementa um alcance maior. Um hard rock mais ao estilo Purple e Rainbow.

"La Chance Sutil"

“Hablan de Tiempos Mejores”, com seus vinte segundos, abre com um trabalho vocal que abre para a sequência com a faixa “El Mago del Tiempo” que traz o habitual peso do álbum, com uma pegada latina e meio psicodélica que traz à memória Carlos Santana, mas mais eletrificado, com os riffs de guitarra pesados e dançantes. O mais legal é ouvir os bongôs com os solos de guitarra. Convergem maravilhosamente, apesar de atípicos.

“Lo Único que Es” é melancólico, é sombria. O violão dedilhado na introdução que traz essa nítida percepção da música, logo irrompe em uma explosão hard rock e o vocal logo se transforma, sendo gritado, esgoelado. A seção rítmica, a “cozinha” ganha, mais uma vez, destaque, entregando groove, vida à faixa.

"Lo Único que Es"

“Occúltame Hermano” traz de volta aquela sensação de uma música arrastada, algo relacionado ao doom, ao Sabbath dos primórdios. É uma faixa com a guitarra suja, que me remete ao occult rock do início dos anos 1970, a bateria marcada, bem executada. Definitivamente uma das melhores e mais versáteis do álbum.

"Occúltame Hermano"

E fecha com a faixa “Zapada Final” e não poderia fechar melhor. O retorno do hard rock típico extremamente pesado. A bateria é indulgente, arrogante, pesada e os riffs de guitarra muito agressivos. A música segue em uma velocidade incrível e lembra um heavy rock de vanguarda que entraria em qualquer álbum de uma banda de heavy metal oitentista. Exemplar perfeito do hard rock!

"Zapada Final"

As apresentações ao vivo, o impacto midiático de “No Pisar el Infinito” e o antigo, mas eficaz, trabalho de boca a boca dos novos fãs, rendeu um contrato com o RCA e o Plus para lançamento do seu segundo álbum, em 1978, simplesmente chamado de “Plus”. Ele foi renomeado pelos fãs com o nome de "Melancholic Girl", por causa de uma música que contém mais de onze minutos de duração. Neste trabalho participaram Celeste Carballo nos corais e o violinista Fernando Suárez Paz, do Quinteto Astor Piazolla.

Mas essa segunda tentativa não foi tão eficaz e o sucesso que a banda adquiriu, a duras penas, diminuiu drasticamente. Chegaram a fazer uma turnê razoavelmente grande pela América do Sul, com destaque na Colômbia, e quando já tinham um contrato novo com a gravadora “Tonodisc” para gravar o terceiro álbum intitulado “Escuela de Rock n’ Roll”, já em 1981, as diferenças internas, as brigas tornaram a vida do Plus insustentável, inclusive o guitarrista Julio Saéz tinha saído antes da gravação deste álbum, entrando em seu lugar León Vanella. A separação definitiva do Plus aconteceria um ano após o lançamento do terceiro álbum, em 1982.

"Escuela de Rock and Roll (1981)

Saéz, o baixista Hugo Racca e o baterista Cacho D’Arias posteriormente se juntaria a uma banda de nome “Dr. Silva”, do tenista Guillermo Vilas, que admirava a sonoridade do Plus. De todos os integrantes do Plus o único que conseguiu algum êxito comercial foi o vocalista Saul Blanch que se tornou com quem o Rata Blanca gravou seu primeiro álbum autointitulado, em 1988.

Hugo Racca morreu em 1988 e Julio Saéz se tornou, após a separação de Patrício Rey y Sus Redonditos da Ricota, empresário e guitarrista de Indio Solari. Em 2016 morreria o baterista Cacho D’Arias. Em 2011 o álbum “No Pisar El Infinito” foi relançado e remasterizado com duas faixas adicionais: “A Thousand Options” e “Hoy Te Wonderas”.

Um álbum monstruoso e obrigatório para qualquer fã das obscuridades do hard rock progressivo dos anos 1970. Este vai surpreender até mesmo aqueles que não são tão afeitos à música pesada. Altamente recomendado!




A banda:

Julio Sáez na guitarra e vocal

Horacio Darías na bateria

Saúl Blanch no vocal

Hugo Racca no baixo e vocal

 

Faixas:

1 - Noches de Rock and Roll

2 - Tomame Como Soy

3 - Ya Tenés por Quien Luchar

4 - La Chance Sutil

5 - Hablan de Tiempos Mejores

6 - El Mago del Tiempo

7 - Lo Unico Que Es

8 - Ocúltame Hermano

9 - Zapada Final


"No Pisar El Infinito" (1976)