Há quem diga que os
japoneses são demasiadamente “comportados” para gostarem de rock n’ roll. O
maldito caso do estereótipo dando conta de que para apreciar rock tem de ser
sujo, mal-encarado, de comportamento “beligerante” e drogado. Coisas de uma sociedade
politicamente correta e hipócrita, para variar.
Digo que os japoneses são
ávidos por rock, são consumidores natos do estilo! Tanto que podemos corroborar
com o tamanho do mercado e a sua importância para tal música, diante dos vários
registros ao vivo clássicos que são lançados em terras nipônicas, bem como
formatos de álbuns de estúdio que são exclusivamente lançados para o mercado
japonês, com bônus tracks, arte gráficas etc.
Muitas e muitas bandas,
independentemente do estilo, fazem questão de tocar por lá, sobretudo as bandas
de heavy metal e de rock progressivo, a demanda é grande porque a oferta é
imensa!
Então não confundamos a
coisa com uma questão cultural. É de profundo respeito de seu povo quando está,
diante de show, elétrico, intenso, em silêncio, sem se movimentar tanto. Mas
essa já não é uma máxima. O Japão é um país diverso, sob todos os aspectos e
também, claro, pelo fator comportamental.
Há a disciplina que
construiu a sua tradição, mas há também aqueles jovens cosmopolitas que gritam,
se esgoelam quando diante de seus ídolos. Esse é o atual Japão: rico pela sua
diversidade cultural, mas calcado na sua tradição, que, fielmente seguem,
geração após geração.
Mas se há um público ávido e
que consomem as bandas internacionais, também possui uma cena prolífica, forte,
viva e que atravessa os tempos, as gerações, as décadas entregando grandes e
seminais bandas, algumas fazendo sucesso e ultrapassando a barreira geográfica
e fazendo certo sucesso em outros países, mas há aquelas grandes bandas
obscuras, que fazem ou fizeram pouco sucesso, mas que esquentaram ou esquentam
a cena, tendo um público vivo que fazem da cena, clara, plena.
E já que falei da predileção
desse povo pelo rock progressivo é claro que há sim grandes bandas da vertente
por lá e que, lamentavelmente não gozaram do sucesso comercial, mas que
produziram grandes petardos sonoros dignos de audição, mas que, graças as redes
sociais e alguns veículos virtuais de comunicação e, claro, de abnegados
amantes do prog rock, ganharam o mundo.
E gostaria de falar de uma, em especial, que conheci, quase que ocasionalmente ou diria que em uma de minhas incursões aos garimpos pela grande rede, que de fato me causou um arrebatamento que há tempos não tinha. Falo da banda COSMOS FACTORY.
Não confundir com o clássico
álbum da banda norte americana Creedence Clearwater Revival, de 1969, de mesmo
nome, mas com uma grande e competente banda nipônica que merece uma audição,
merece uma atenção. E para firmar uma máxima de que mencionei mais acima, infelizmente
há poucas menções na grande rede, sobre a banda, a sua biografia, tratando-se
de músicos pouco conhecidos na cena progressiva mundial, mas tentaremos
textualizar cada detalhe de sua história, nada pode passar despercebido quando
se fala do Cosmos Factory e de sua curta, mais significativa história
discográfica.
A banda foi formada em 1968,
originalmente pelo seu tecladista, Tsutomu Izumi, na cidade de Nagoya, sob o
nome de “The Silencer”. A banda mudou o nome quando lançaram sem primeiro
álbum, em 1973, chamado “An Old Castle of Transylvania”. E esse será o álbum a
ser resenhado nesse texto.
Eles tiveram que se mudar
para a capital, Tóquio, para tentar realizar seu sonho de gravar um álbum e,
com alguma dificuldade, conseguiram chamar a atenção de um empresário que
também era um crítico de rock e começaram a trabalhar nas suas primeiras
composições que conceberia no “An Old Castle of Transylvania"
A formação da banda neste álbum contou com Tsutomu Izumi (teclados, sintetizador Moog, vocais), Hisashi Mizutani (guitarra, vocais), Toshkazu Taki (baixo, vocais), Kazuo Okamoto (bateria e percussão) e Misao no violino.
Não há como não se encantar com o som multifacetado da banda neste seu primeiro trabalho. Trafegam claro, no rock progressivo, com um forte viés no rock psicodélico mais lisérgico, mais pesado, inclusive, trazendo à lembrança bandas como Vanilla Fudgie, explorando e muito os teclados com muita intensidade como bandas do naipe do Uriah Heep.
Não sou muito adepto às comparações, mas, como se trata de uma banda pouco conhecida, talvez as temíveis comparações possam trazer um norte a quem não conhece o Cosmos Factory.
Esse rock n’ roll
diversificado, que traz o peso do hard rock, a complexidade do prog rock e a
lisergia do rock psicodélico definitivamente traz ao álbum e a banda algo
especial e pouco ortodoxo, fazendo desta uma referência para a cena rock japonesa.
O álbum é inaugurado com a faixa “Soundtrack 1984” com uma introdução linda da “cozinha”, do baixo e da bateria, trazendo a textura caudalosa do mellotron, mostrando uma forte interação instrumental da banda, que completa com os riffs e solos curtos da guitarra.
“Maybe” vem em seguida,
pesada, intensa, com o órgão enérgico, forte, vibrante com vocais de excelente
qualidade contrastando com o peso dos instrumentais, com seções mais calmas e,
logo em seguida, vem a guitarra abrangendo, com sua presença em riffs e solos,
todo o conjunto da música. Belíssima faixa!
“Soft Focus” vem para
“quebrar” a sequência de peso e vibe elétrica e enérgica do álbum até o
momento: Uma balada protagonizada por harpas e teclados contemplativos e vocais
melosos e pausados, corroborando o clima da música.
“Fantastic Mirror” traz o
protagonismo nos sons do teclado que faz lembrar um pouco do rock progressivo
italiano com uma vibe muito grande do progressivo sinfônico, com aquele tom de
dramaticidade.
"Poltergeist" é
animada, solar com teclados pulsantes e com bateria marcada e há a presença do
violino que rivaliza, de forma salutar, com o órgão trazendo certa complexidade
à faixa.
O álbum é finalizado
magistralmente com a faixa título, uma verdadeira saga sonora, uma epopeia
digna de viajar sem destino, se deixar levar, abrir a mente e voar, voar e
voar. “An Old Castle of Transylvania” tem longos 20 minutos de duração e traz
uma mistura louca, alucinante de psicodelia e progressivo com grandes
construções em sua estrutura melódica e harmônica, com grandes passagens
rítmicas, tendo uma textura enérgica e contemplativas, ao mesmo tempo. A
interação entre a guitarra e órgão é incrível, onde o primeiro é cortante,
pesada e o segundo é suntuoso.
O Cosmos Factory lançou seu
segundo trabalho em 1975, depois de alguns singles e lançamentos promocionais,
chamado “A Journey with the Cosmos Factory”, mais voltado para o rock
progressivo mostrando que, ao longo do tempo, embora curto, desenvolveu sua
sonoridade, explorando, buscando novas alternativas sonoras, buscando fugir dos
estereótipos.
O primeiro álbum foi
relançado em CD pela Coca/Nippon Columbia em 1991 e também relançado em CD pelo
selo “Black Rose” na Alemanha. A banda finalizou as suas atividades em 1977 com
o lançamento de seu último trabalho chamado “Metal Reflection” já sem a
inspiração e criatividade de seus três primeiros álbuns de estúdio.
Definitivamente o Cosmos
Factory foi uma das grandes bandas do rock progressivo japonês e que tem em “And Old Castle of Transylvania” como uma obra-prima incontestável, com notável
originalidade na cena rock nipônica, mostrando que há potenciais sonoros em
toda a parte do mundo, pois não há barreiras para o boa música e o Japão está,
sempre esteve na rota das grandes e seminais bandas de rock n’ roll. Altamente
recomendado!
A banda:
Tsutomu Izumi nos teclados,
mellotron, sintetizadores e vocais
Hirashi Mizutani na guitarra
e vocais
Toshikazu Taki no baixo e
vocais
Kazuo Okamoto na bateria e
percussão
Com:
Misao no violino
Faixas:
1 - Soundtrack 1984
2 - Maybe
3 - Soft Focus
4 - Fantastic Mirror
5 - Poltergeist
6 - An Old Castle of Transylvania