domingo, 25 de dezembro de 2022

Sudden Death (Alemanha) - All or Nothing (1987)

 

O rock n’ roll alemão não vive apenas do experimentalismo, do minimalismo e progressivo do krautrock no fim dos anos 1960 e 1970. Evidente que não podemos negligenciar o pioneirismo dessas bandas que, navegando em estilos ainda embrionários naquela época, estavam construindo um processo revolucionário na música alemã, na cultura alemã um tanto quanto despedaçada com o pós-guerra, com a autoestima um tanto quanto abalada no cerne cultural daquele país. Afinal o krautrock surgiu com o sentimento dessa urgência.

Mas veio o heavy metal dos anos 1980 que, penso, trouxe um novo momento para o rock alemão! Foi a redenção do rock germânico que produziu bandas seminais, independente de sucesso comercial ou não, que colocou este país no mapa do heavy rock planetário.

O que dizer do Accept, o que dizer das grandes bandas de thrash metal, as de hard rock que trafegaram na década de 1970 e 1980 como a unânime Scorpions? Tenho até receio de elencar as bandas alemãs de heavy metal, em todas as suas vertentes, e parecer injusto por esquecer algum nome peso pesado.

Mas não podemos esquecer também da atualidade, de bandas de stoner rock, como Kadavar, por exemplo, que vem trazendo um frescor para o rock alemão que, ao mesmo tempo, homenageia as grandes bandas do passado em todas as suas gerações.

Enfim, a cena germânica continua forte, intensa e vívida, o que é mais importante, afinal, não é apenas quantidade, mas qualidade com que estamos testemunhando diante de nossos olhos.

Mas voltando ao passado, mais precisamente a onda heavy metal que estava agitando os anos 1980, precisamos dar luz às bandas obscuras, pouco conhecidas, aquelas que, por algum motivo, não alçou voos maiores, tendo caído no ostracismo, mas que contribui e muito por construir a cena, a edificação da música.

E na Alemanha oitentista não foge à regra e em minhas incursões aos porões escuros e empoeirados do rock, em meus garimpos, descobri, quase que de uma forma totalmente despretensiosa (talvez não seria garimpo se fosse dessa forma) uma banda que definitivamente personificou a agressiva e imponente música pesada alemã.

Falo da banda SUDDEN DEATH com o seu único trabalho chamado “All or Nothing”, de 1987. 1987 é um período meio nebuloso do heavy metal no mundo. O estilo estava mais evidente, ganharam os dials das grandes rádios pelo mundo, canais de TV mostravam clipes das bandas mais badaladas da segunda metade dos anos 1980: era o glam metal.

Sudden Death

Conhecido pejorativamente por aqui no Brasil de “metal farofa” a cena tinha o apelo visual como o carro chefe da música, os personagens andrógenos, cabeludos superava a música, mas é inegável que, comercialmente, foi o grande momento do heavy metal. E o Sudden Death corria por fora, andando pelas sombras da cena, mas que hasteava a bandeira da pureza do estilo, priorizando o peso, a agressividade, que flertava com o peso mais cadenciado do hard rock setentista.

Digamos que o Sudden Death estava um pouco “atrasado” quando produziu um heavy metal em uma época em que o thrash metal ou o speed metal e ainda o hair metal estava em evidência nos anos 1980 e até mesmo aquele hard rock comercial norte americano capitaneado pelo Van Halen. Mas ao  mesmo tempo podemos considerar que a banda trouxe à tona ou pelo menos tentou trazer de volta os anos dourados do heavy metal no início dos anos 1980 e acredito que seu trabalho não tenha vingado não pelo questionamento da qualidade de sua sonoridade pelos executivos da música, da indústria fonográfica, mas um mero deslocamento do tempo. E diante desse quadro lamentavelmente não se têm, na grande rede, informações sobre o Sudden Death, tamanha é a sua obscuridade.

O Sudden Death foi formado em Berlin em meados dos anos 1980 e andou pelos caminhos undergrounds e se há poucos materiais da banda, inclusive o seu álbum, deve-se a colecionadores e abnegados que representam alguns selos alternativos que conseguiram lançar, em algumas edições mais do que especiais, o álbum, fazendo com esse magnífico trabalho ao maior número de apreciadores do heavy metal espalhados pelo mundo.

“All or Nothing” foi lançado em 1987 e produzido por Harris Johns entre 1986 e 1987 e teria sido lançado pela “Noise Records”. Digo teria sido lançado, pois reza a lenda de que o álbum teria sido lançado de forma “artesanal”, quase caseira, sem nenhum tipo de apoio por uma gravadora.

“All or Nothing” traz, em sua essência, o mais puro e genuíno heavy metal, com nuances de hard rock setentista em alguns momentos do álbum. Nele se explica verdadeiramente o motivo pelo qual trafegou pelo ostracismo do underground, sobretudo pelo momento mais piegas do glam metal na segunda metade dos anos 1980 no mundo. É um álbum pesado, agressivo, indulgente, perigoso e totalmente despretensioso.

“All or Nothing” foi concebido com a seguinte formação: Frank Barz na guitarra, Arno Schamberg nos vocais e baixo, Michael Köster     na bateria e Detlef Gottmannshausen   na guitarra e vocais e essa formação foi a original e a que deu o ponto final nesta banda em uma carreira curta, mas nada como destrinchar o álbum para corroborar o quão significativo foi para o heavy rock alemão.

O álbum é inaugurado com “Bloody Conclusion” que tem uma introdução mais ao estilo thrash, bem agressivo, com riffs pesados e pegajosos e um vocal rouco e despretensioso, bateria marcada e baixo presente e muito pulsante, mas alterna com algo mais clássico do heavy metal, principalmente no solo de guitarra que, embora curto e direto, traz o que há de mais piegas no heavy rock. Que bom!

"Bloody Conclusion"

A sequência tem a mortal, com o perdão da analogia, “Killer” que já vem com o pé na porta com riff rápido e rasteiro de guitarra e que segue assim em todo o contexto instrumental entregando algo parecido com o speed metal mais muito pesado e agressivo com o vocal sobrepondo, regendo a tudo isso. Há algo de sombrio e perigoso nessa faixa também, que me remete ao occult rock, por incrível que possa parecer. E mais uma vez o solo de guitarra é matador e um pouco mais elaborado que a faixa anterior que me traz à memória o hard rock setentista. Grande faixa!

"Killer"

E eis que chega “Dust in the Wind” que não imprime a agressividade das músicas anteriores, mas o peso, sim, permanece. Essa faixa traz um pouco algumas inspirações das bandas dos anos 1970 como o Motorhead dos primórdios. O Sudden Death aqui mostra mais competência, uma sonoridade mais arrojada, com melodias mais bem trabalhadas e não menos orgânica e poderosa.

"Dust in the Wind"

“Loaded Brain” retoma o caminho poderoso e agressivo do álbum, guitarras distorcidas, bateria marcada e pesada, vocal arrastado e por vezes gutural e pesado. “Loaded Brain” poderia figurar como um dos primórdios da cena black metal.

"Loaded Brain" (Live)

“Backstage Queen” vem ao estilo pé na porta também. A bateria rege o peso e a velocidade da música e com o baixo pulsante e riffs rápidos e intensos de guitarra expõe à máxima potência a capacidade incrível do instrumental da banda e me remete também ao power metal, algo que o rainbow, na fase Dio, fazia nos primórdios da banda. Intensa e poderosa faixa!

"Backstage Queen"

E chega a faixa título “All or Nothing” com mais cadência trazendo as inspirações do hard rock dos anos 1970, com um baixo “cavalgado” e pesado com a bateria seguindo o ritmo, a “cozinha” nesta faixa é avassaladora. Riffs de guitarra dão o tempero, o vocal, mais altivo e limpo, traz a textura que personifica o andamento da música.

"All or Nothing"

“Nightrider” traz aquela mistura do hard mais comercial com o heavy metal, algo como o Accept em seus momentos mais radiofônicos, mas que não traz nenhum tipo de demérito. Vocais bem cantados, guitarras mais “limpas”, faz dessa faixa a mais “acessível” do álbum.

"Nightrider"

E fecha com “I Want It” que retorna ao peso habitual do álbum, mais com uma textura mais complexa, bem trabalhada, diria até um tanto quanto dançante, ao estilo Motorhead com faixas como “Louie, Louie”, por exemplo. Guitarras pesadas, bateria marcada e frenética são os destaques dessa música.

"I Want It"

Em 2020 “All or Nothing” ganhou “vida” novamente com o relançamento da “Golden Core Records”, com um trabalho de acabamento melhor, com uma bela remasterização em LP e CD, com um livreto de cerca de 20 páginas falando sobre a banda e com raras fotos da banda em ação.

Inclusive há uma faixa muito rara de uma apresentação em 1986 Bunderrockfestival, entre outras faixas bônus bem raras e significativas da curta, mas significativa para o heavy metal alemão.

Assim foi o Sudden Death com o seu “All or Nothing’: poderoso, intenso, agressivo, moderno para a época, pois mesmo com audições feitas atualmente nota-se um frescor, um caráter de novidade e de uma sonoridade incrivelmente pesada que faz com que o ouvinte apreciador do estilo se mostre atônito. É uma sonoridade reveladora a cada audição, é a confirmação, a perpetuação de um estilo que, com o passar dos tempos e das gerações, mostra-se vivo e eterno.


 

A banda:

Frank Barz na guitarra

Arno Schamberg nos vocais e baixo

Michael Köster na bateria

Detlef Gottmannshausen  na guitarra e vocais

 

Faixas:

1 - Bloody Conclusion

2 - Killer

3 - Dust in the Wind

4 - Loaded Brain

5 - Backstage Queen

6 - All or Nothing

7 - Nightrider

8 - I Want It

 

Sudden Death - "All or Nothing" (1987)
























 





 


sexta-feira, 16 de dezembro de 2022

Zarathustra - Zarathustra (1972)

 

Eu costumo dizer, diria bradar aos quatro cantos, que rock n’ roll e cultura andam de mãos dadas. Claro que há bandas para todos os tipos de “demandas”: bandas que falam de sexo, hedonistas, de festas e drogas, contestadoras, anarquistas e aquelas politizadas, antenadas com o cenário sócio-político e econômico de um país.

E foi com base neste último preceito que este reles e humilde blog que você, caro e brilhante leitor, abrilhanta com a leitura, veio a existir. Sempre aliei a música que amo a cultura de contestação, de mostrar, de trazer à tona as mazelas dessa sociedade putrefata que lamentavelmente fazemos parte. Sem contar também que as histórias das bandas e como foram concebidas, bem como as suas obras de arte, os seus álbuns, também é um espetáculo à parte.

Porque por intermédio dessas histórias, muito delas com um sinônimo de perseverança e de amor à música que acreditam, são fantásticas e que estão, muitas delas, intimamente ligadas a história da música local e também diretamente às manifestações culturais que se formam nesses aglomerados humanos.

Por que digo isso tudo? Vou contar, prometo ser breve, uma história de como cheguei a essa banda que será resenhada hoje e que, de uma forma totalmente despretensiosa, pois não procurava por bandas e suas músicas, eu descobri uma banda que, a meu ver, era excelente.

Estava eu procurando um livro do grande e marginal filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900), o famoso “Assim falou Zaratustra”, pois já tinha lido outros livros desse autor e estava ávido para ler outros, sendo este, recomendado a mim.

O livro conta a história de um pensador que desce das montanhas para ensinar aos homens o que descobriu em seu isolamento. A frase célebre do filósofo que causou certo rebuliço, “Deus morreu”, mostrava a sua crítica ferrenha contra o pensamento cristão, porque, segundo Nietzche, desprezava o “corpo”. O livro denuncia a renúncia da vontade e diz “sim à vida”, em toda a sua plenitude.

Friedrich Nietzsche

Mas quando estava procurando o valor mais atraente para a compra do livro surgiu para mim a imagem de uma capa de LP, de um álbum de uma banda, com um rosto em um fundo branco, muito simples, mas bonito e, curioso, decidi vasculhar um pouco mais para saber de onde veio. A banda se chamava ZARATHUSTRA e era da Alemanha! Ah não hesitei em buscar, ainda mais informações, afinal a banda alemã com um nome que faz referência ao livro do também germânico Nietzche, a combinação poderia ser perfeita e docemente beligerante, apesar de ter, por questões legais, algumas mudanças na grafia do nome da banda.

Quando finalizei a audição do único álbum da banda, lançado em 1972, pelo selo “Metronome”, eu me senti em uma espécie de arrebatamento. Pesado, intenso, solar, versátil, pois trazia hard rock, heavy rock e momentos de progressivo dando uma cadenciada na sonoridade. Mas quando levantei material de pesquisa para construir esse texto li algumas críticas negativas bem pesadas acerca da banda Zarathustra e de seu álbum, dizendo se tratar de uma banda aquém da música que apresentou, dizendo ser cópia barata de bandas como Deep Purple, Uriah Heep, entre outras.

Por favor! Não desejando advogar pela causa da banda, mas precisamos entender que, de uma vez por todas, essas bandas estavam experimentando estilos, flertando com instrumentos e as semelhanças, podemos dizer dessa forma, é mais do que natural, principalmente levando-se em conta o fator cronológico, pois o álbum do Zarathustra é de 1972, onde as coisas eram, digamos, embrionárias. Enfim, no mais temos que, mesmo diante das argumentações e divergências, respeitar as opiniões.

O Zarathustra foi formado em 1969 na cidade de Hamburgo. O álbum, homônimo, vinha na contramão do que se fazia, pelo menos de forma predominante, na Alemanha Kraut. Não tinha absolutamente nada de experimental ou minimalista, típico das bandas precursoras do estilo na segunda metade dos anos 1960. Era hard rock, apesar do uso demasiado dos teclados, daí a semelhança com o Heep e o Purple, talvez, com tendências progressivas e, nessa salada mista, a banda era singular.

O Zarathustra assinou o contrato com o selo, com o selo “Metronome”, em 1971, um selo underground que incentivava as bandas igualmente underground que surgia aos montes na Alemanha. “Zarathustra” traz um som poderoso, agressivo, ao estilo alemão de ser, mas ao mesmo tempo, percebem-se sutilezas sonoras diferenciadas e difícil de definir. Talvez essas indefinições possam trazer dúvidas, mas por outro lado não nos prende a rótulos, passando a nos focar na beleza da música e nas suas qualidades e peculiaridades.

Mesmo que eu tenha, em minha primeira audição, caído no inevitável invólucro do rótulo, peço-lhes desculpas, caros leitores, mas a referida contradição pode se tornar aceitável dada a vastidão das influências do Zaratustra, formando uma massa sonora pesada e sútil, ao mesmo tempo. Podemos considerar “Zarathustra” um clássico obscuro, uma fusão do heavy rock com o rock progressivo.

A formação da banda que gravou “Zarathustra” tinha: Ernst Herzner nos vocais, Wolfgang Reimer na guitarra, vocais e percussão, Michael Just no baixo e vocais, Klaus Werner nos teclados e Wolfgang Behrmann na bateria e percussão.

O álbum abre já com uma excelente música chamada “Eternal Light” com um vocal excelente, melódico, com riffs pegajosos e um órgão meio obscuro. Começa quase a capela com um órgão cavernoso ao fundo.

"Eternal Light"

“Mr. Joker” se mostra também muito pesada, um verdadeiro rock básico, curto e grosso, com riffs de guitarra, com bons solos esculpidos e um hardão poderoso e envolvente, além daquele vocal poderoso e de grande alcance.

"Mr. Joker"

“Past Time” é épica e é um exemplo excelente de hard progressivo que poucas bandas praticavam em 1972, com uma cozinha avassaladora, destaque para a bateria, uma verdadeira catarse sonora.

"Past Time"

“Nightmare” segue a mesma linha hard prog com passagens variando entre peso e o suave com muita presença e qualidade. Alterna doçura enganosa e momentos energéticos com órgão vertiginoso.

"Nightmare"

Sad Woman” é tiro curto de hard rock com pitadas de classic rock. Revela um registo do rhythm 'n' blues com uma ponte celestial e arrebatadora.

"Sad Woman"

E para fechar temos “Ormuzd” que tem a introdução de ruídos sonoros experimentais provocados pelo teclado que mantém em destaque durante toda a faixa com solos simples e diretos de guitarra, mostrando um belo e ousado flerte entre progressivo e hard rock com passagens de tirar o fôlego.

"Ormuzd"

O Zarathustra não resistiu à falta de promoção e a consequente baixa procura por compra de seu material, se desfazendo ainda no ano de 1972. Uma pena que a banda não prosseguiu.

Mais uma raridade oriunda da rica e diversificada cena alemã, mais uma banda obscura oriunda de um dos mais importantes países que abrigou e abriga a música experimental, revolucionária e progressiva do mundo.

Álbum obrigatório! Uma pérola que precisa ser difundida e que certamente, mesmo que pouco conhecida, após a audição deste álbum, chegaremos a conclusão de que é e foi uma referência para o surgimento das bandas de heavy prog ou hard prog em meados da década de 1970.

A banda:

Ernst Herzner nos vocais principais

Wolfgang Reimer na guitarra, vocais e percussão

Michael Just no baixo e vocal

Klaus Werner nos teclados

Wolfgang Behrmann na bateria e percussão

Faixas:

1 - Eternal Light

2 - Mr. Joker

3 - Past Time

4 - Nightmare

5 - Sad Woman

6 - Ormuzd


Zarathustra - Zarathustra (1972)

 


 




 


 






 










terça-feira, 29 de novembro de 2022

I Cocai - Piccolo Grande Vecchio Fiume (1977)

 

A cena progressiva italiana sempre foi muito forte, criativamente falando. Os anos 1970 na Itália foram difíceis em seu cenário político, com climas extremamente polarizados e intensos, beirando a violência. E muitas bandas assumiram seus lados, gerando nos shows embates tensos e intensos. Por conta desse caos político-partidário, algumas bandas sucumbiram, sendo impedidas de tocar, muitas delas sumindo do mapa, por questões ligadas também ao escasso apoio por parte da indústria fonográfica.

Mas sempre foi prolífica. Grandes álbuns foram lançados! Grandes trabalhos, mesmo que localmente, ganharam peso, relevância e influenciaram. Apesar desse clima polarizado, de violência que a Itália vivia nos anos 1970, as bandas eram amigas, se falavam, tocavam juntas. A cena era forte e rica, apesar de ter tido bandas que conseguiram seguir com certa longevidade discográfica.

E assim, com o passar do tempo, o rock progressivo italiano só ganhou força, sobretudo nos anos 1990 com uma nova e contundente safra, de bandas novas, trazendo um novo frescor, mas nunca deixando de lado o trabalho desbravador das pioneiras dos anos de 1970. Esse período ganhou força a cada banda que surgia, o interesse do público aumentou cada vez mais.

Algumas bandas antigas, sentindo o frenesi e a relevância dos novos tempos, ressurgiam, mas não trazendo apenas a nostalgia de seu tempo, mas gravando novos materiais, fazendo da cena noventista e posteriores um caldo de gerações que se harmonizavam maravilhosamente.

E dessa forma a Itália, mesmo que localmente, revela, a meu ver, uma forte consistência em sua cena que, a cada dia, se fortalece, com um público que se renova em todos os aspectos, na faixa etária também. E ainda assim há uma horda de bandas, seja no passado ou presente, que sucumbiram e não tiveram as suas obras em evidência.

Porém graças a abnegados fãs armados das redes sociais e seus canais de comunicação que ganham o mundo em uma fração de segundos, as bandas ganham luz, luz ao rock obscuro para essas bandas! E há uma que descobri dessa forma, garimpando, buscando nas entranhas, nos porões do rock n’ roll, parte dele esquecido, vilipendiado ou que tiveram suas expectativas dilaceradas pela má sorte do ostracismo.

E a banda em questão vem da região italiana do Vêneto, terra de ótimos vinhos solares e frutados, e se chamava I COCAI. A banda foi formada em 1970 e tinha, inicialmente, em sua formação Amedeo Biasutti (Theo), Pierluigi Pandiani (Gigi Pandy) e Luigi Turin (Tury). Em seguida, juntaram-se: Steny (Stefano) e Paul (Paolo), irmãos de Amedeo Biasutti, enquanto Gigi e Tury são primos. 

Sim, os integrantes usavam pseudônimos, apelidos, pois, à época, não tinham o interesse de aparecer, de revelar suas identidades. A ideia era que, como nenhuma banda veneziana havia sido bem-sucedida, pensaram que, com “nomes estrangeiros”, pudessem “internacionalizar” a sua música, rompendo o casulo do Vêneto, mas, nesse quesito, estavam errados.

Como toda banda sem apoio e no seu início tocou em vários clubes, pequenos, horríveis na sua estrutura, salões de dança, típico na época de transição das décadas de 1960 e 1970, que tocavam os beats italianos que estavam na crista da moda, festivais e concursos e a cada evento, cada um com sua peculiaridade, a banda mudava de nome, então o I Cocai se revelou, na sua gênese, com vários nomes, tais como: Draps, New Draps, Baronetti e finalmente Cocai que, em dialeto veneziano, significa “gaivotas”.

O nome Baronetti foi instituído em 1975, participando inclusive de alguns festivais e shows no Vêneto, ganhando alguma discreta repercussão e o nome I Cocai foi definido pouco antes do lançamento de seu único álbum, lançado em 1977, chamado “Piccolo Grande Vecchio Fiume”, seu único álbum, inclusive.

A cena musical nos anos 1960 era dominada pela música popular italiana, com um pouco do beat italiano, com levadas psicodélicas, em moda em centros como os Estados Unidos, por exemplo e o progressivo, ainda muito embrionário, já no início dos anos 1970, vivia em uma espécie de gueto, muito limitado em meio estudantis e intelectuais que ansiava por novidades. 

E assim o I Cocai foi construindo a sua música e que acabou reverberando no seu único álbum: música comercial e radiofônica da Itália, com algumas distorções de guitarra que o prog rock absorveu, com instrumentos de sopro, como flauta e hammond engatilhado e frenético.

A sociedade, nos anos 1970, a italiana, estava mudando, a política partidária polarizada e intensa influenciava na música e nas suas letras, grandes movimentos de pensamento afloraram e a música progressiva ganhou corpo e o I Cocai sentiu o turbilhão dessas mudanças, embora a concretização de sua arte tenha surgido, se materializado em seu álbum, tardiamente, apenas em 1977, sete anos depois de seu nascimento para o mundo da música italiana.

A banda, ao longo desse tempo, apesar dos entraves, fez alguns shows e participaram de alguns eventos como o "Musica Jeans", em 1974, "Rosa d'oro", em 1975, "Cantaveneto 76", em 1976 com resultados pouco afáveis, digamos, sem aquele feedback por parte do público, afinal a suas apresentações eram, para variar, pouco ortodoxas.

Quanto aos shows a banda fez a sua primeira apresentação no Teatro Arsenale, em Veneza, tocando na Praça de São Marcos dias depois do show da banda de Paul MacCartney, o Wings e mais para frente, em 1975, no teatro Rondanini (Villa Del Conte) tiveram melhor receptividade, talvez pelo fato de ser um evento “solo” e com interessados mais bem definidos. Esses shows se tornaram corriqueiros após o lançamento de seu álbum e até, por alguns momentos, as rádios FM tocavam as suas músicas talvez levadas por um momento de visibilidade do estilo.

A gravação de “Piccolo Grande Vecchio Fiume”sucederam-se com dias quentes da revolta estudantil, com climas políticos de muita tensão, sobretudo na região da Bolonha, onde partiram para gravar seu álbum. A cidade estava vigiada pela polícia e com confrontos em todos os cantos da cidade. Chegaram ao estúdio “Fonit Cetra” e contaram com a grande colaboração do técnico de som Maurizio Biancani, que mais tarde se tornaria um dos melhores da Itália e isso se reflete na qualidade do som da banda e do disco, em si.

E se depararam com um problema, pelo menos o I Cocai considerou isso como um entrave a ser superado. A banda teve que se isolar para gravar as suas partes (Studer 32) e eles, acostumados com a proximidade, com os shows e o calor humano das bandas amigas e o público, tiveram que superar isso e não deixar que o mesmo impactar no resultado final do álbum. Reza a lenda que precisaram de beber aguardente de mel para encontrar a concentração, o calor e a ênfase necessária para imprimir tal sentimento em estúdio. Sempre difícil superar o palco!

No entanto, parece que se saíram bem, afinal o resultado foi satisfatório, pois registraram as suas músicas em 48 horas o que levaria meses, tendo em conta a complexidade de suas músicas, porém levou um dia para mixar o que não permitiu cuidar com mais afinco e detalhes dos timbres e ainda assim os custos foram altos, pesados.

O Cocai tinha um empresário à época do lançamento de seu álbum, talvez um pouco antes, mas era muito antiquado para a música que a banda fazia e atrofiado, culturalmente falando e depois disso a banda decidiu se desfazer dele e seguiu se autoproduzindo. Os obstáculos não residiram apenas no quesito empresarial, mas artístico também, com relação ao vocal principal. A voz foi considerada “impópria” para o rock, pois era melódica demais, até porque o Theo Byty, o vocalista principal tocava à noite, para complementar a renda, covers de Deep Purple, Rolling Stones, Beatles, King Crimson, Clapton etc, mas, “por sorte”, dominava também o instrumento, pois tocava guitarra e teclados.

As letras foram escritas por Flávio Zanin (Flanin), que era professor de história da arte e dono do Estúdio Prisma (Studio Prisma) que supervisionou o trabalho da arte gráfica do álbum, uma aquarela com “grãos de café e, para variar, foi um trabalho conceitual, cujo tema contava a juventude de uma criança (o próprio Flanin) que havia vivenciado a tragédia de Vajont. Deste "pequeno rio velho" (o Piave) que, numa hora maldita, varreu aldeias inteiras e matou 1750 pessoas. Assim, o impacto emocional em definir um tema tão trágico para a música foi considerável.

“Piccolo Grande Vecchio Fiume”, quando concebido tinha a seguinte formação: Theo Byty (Amedeo Biasutti) nos vocais principais, guitarra e Moog, Stheny (Stefano Biasutti) nos teclados, Paul Blaise (Paolo Biasutti) no baixo, congas e vocais, Gigi Pandy (Pierluigi Pandiani) na segunda guitarra, flauta e vocais e Tury (Luigi Turin) na bateria e percussão. A faixa “La Mie Storie” teve a participação de outro baterista, de nome Massimo Iannantuono, que foi, nos anos 1980, o baterista da banda Blues Society de Guido Toffoletti.

O álbum é inaugurado por ”Milioni d'ani fa” que abre com ruídos, destruições, um momento certamente de tensão em virtude do trágico tema e logo aparece uma textura sombria e densa de teclados, me remetendo ao krautrock germânico, depois vem a bateria que cautelosamente vai encorpando a música, mas com as teclas em segundo plano, mas bem evidentes, com o vocal, baixo, discreto, quase sussurrante. Sem dúvida a faixa sintetiza a teor trágico do tema. E assim segue, sem maiores novidades até trazer algo mais radiofônico, as variâncias rítmicas se torna mais vivo nesse momento.

"Milioni d'ani fa"

“La Mie Storie” chega basicamente da mesma forma com o protagonismo dos teclados em uma atmosfera densa e até, por vezes, contemplativa, com a bateria, ao fundo, trazendo vivacidade ao som, com a flauta remetendo a um distante folk rock. A música carrega o underground do prog rock com pitadas psicodélicas lembrando o Floyd com guitarras mais distorcidas.

“Dirò No!” começa mais solar, algo mais radiofônico, comercial, trazendo aquela música popular italiana, meio “macarrônica” dos anos 1960, mas melancólica, com um vibe um tanto quanto dramática.

“Piccolo Grande Vecchio Fiume" é solar, solos de guitarra altos, bem dedilhados, simples, mas altivos, com bateria seguindo o ritmo, ditando a dinâmica da faixa e o que ela entrega: energia e um viés comercial, evocando um pouco, mais uma vez, da música popular italiana dos anos 1960. Em alguns momentos traz um pouco da viajante “floydiana” com guitarras mais contemplativas e bem trabalhadas.

Segue com “Ti Amo Davvero” com a proposta mais voltada para o rock progressivo com uma introdução um tanto quanto introspectiva, os teclados corroborando essa textura, com um vocal límpido, intenso, com um nível alto de dramaticidade, típico da cultura musical da Itália.

“Le Mele Mature” continua na seara progressiva enaltecendo um pouco do prog sinfônico remetendo um pouco ao space rock, com uma pegada viajante e contemplativa. Sem sombra de dúvida uma das melhores faixas do álbum.

"La Mele Mature"

E o nome da última faixa já denuncia o seu belíssimo desfecho com “Conclusione” trazendo também aquela aura sinfônica e toda a sua altivez com os teclados entregando uma textura arrojada e complexa com as guitarras, em solos mais trabalhos, confirma essa atmosfera intensa e poderosa.

"Conclusione"

A dissolução do I Cocai foi determinada por vários motivos e em primeiro lugar deve-se colocar a história musical dos seus integrantes. Tury e Gigi Pandy são frutos de uma formação rock projetada, calcada em experimentação e pesquisa contínua enquanto os irmãos Biasutti vieram de experiências melódicas e sendo donos de empresas, decidiram se dedicar aos seus negócios, ao comércio, administrando lojas, hotéis e restaurantes. E depois pela incompreensão da sua música pela conservadora indústria fonográfica.

Tury e Gigi decidiram seguir na empreitada musical, Tury com muitas formações de músico de estúdio e até hoje ele está no mercado fonográfico, no mundo da música. Em 1979 Gigi gravou um álbum chamado “Irone”, onde todas as faixas foram escritas inteiramente por ele, bem como arranjadas e cantadas, assistidas por músicos importantes, incluindo o próprio Tury. Atualmente Gigi Pandy é cozinheiro em Veneza. “Piccolo Grande Vecchio Fiume” foi lançado, em 1977, em sua versão original em LP pelo selo “Style” e relançado, em formato CD, em 1994, pelo emblemático selo “Mellow” com a mesma arte gráfica.



A banda:

Theo Byty (Amedeo Biasutti) nos vocais, guitarra e moog

Gigi Pandy (Pierluigi Pandiani) na guitarra, flauta e vocais

Stheny (Stefano Biasutti) nos teclados

Paul Blaise (Paolo Biasutti) no baixo, percussão e vocais

Tury (Luigi Turin) na bateria

Com:

Massimo Iannantuono na bateria na faixa “La Mie Storie”

 

Faixas:

1 - Milioni d'ani fa

2 - La mie storie

3 - Diro no!

4 - Piccolo grande vecchio fiume

5 - Ti amo davvero

6 - Le Mele Mature

7 - Conclusione



I Cocai - Piccolo Grande Vecchio Fiume (1977)


 

 

 

 

 

 

 




























 



quarta-feira, 16 de novembro de 2022

Dragon - Dragon (1976)

 

Nada como fugir um pouco do óbvio, sair um pouco dos grandes centros do rock n’ roll, tais como Estados Unidos, Inglaterra, Alemanha etc. Há sim vida pulsante sonora em outros cantos do mundo e não se enganem, estimados leitores, há grandes pérolas obscuras nos mais improváveis recantos esquecidos do planeta.

Há países, no entanto, que há uma cena pulsando, uma boa quantidade de bandas, com muita qualidade, mas vilipendiada pelo grande público e pela indústria fonográfica que só visualiza diante dos seus olhos o lucro que os países mais conhecidos e badalados podem proporcionar.

E graças a esse blog que, a cada dia, vem me estimulando a garimpar mais e mais o que há de melhor espalhado por esse mundo e me mostrando o que, confesso, há alguns anos atrás eu não percebia: que existem bandas fora do eixo Inglaterra-EUA e grandes bandas!

A viagem tem sido intensa e proveitosa. Os textos explodem em história, as sonoridades surpreendem pela sonoridade arrojada, complexa, orgânica e que não fica em nada atrás dos grandes clássicos, a única diferença é a falta de oportunidade para que essas bandas catapultem a sua arte.

A banda de hoje vem da Bélgica! Sim, a Bélgica! As improbabilidades existem e excitam por ser tão plenas e vivas. A pungência dessa banda surpreende e nos faz chegar a óbvia confirmação de que as fronteiras não deveriam existir para a música, os muros da desconfiança e do preconceito, a cada audição, estão ruindo. E essa banda traz essa grata sensação!

O nome dela é DRAGON! Não se enganem, não se trata de uma HQ, um personagem de desenho animado ou coisa que o valha, mas a síntese do que há de mais genuíno do rock progressivo bem tocado, bem elaborado, complexo, mas orgânico, porque é vivo e sincero a sua música. E a descoberta se deu de uma forma totalmente ocasional, mas sempre planejada, pois quando nos permitimos a garimpar a intenção é sempre achar algo.

Originalmente chamado de Burning Light, esta banda da região de Ath foi formada em 1970 pelos irmãos Georges e Jea Vanaise, tendo dois vocalistas, além do multi-instrumentista Jean-Pierre Houx.

Inicialmente o Dragon teve muitas aparições em festivais, fazendo alguns shows locais e com isso foi ganhando alguma repercussão. Eles costumavam, no seu início, a tocar usando máscaras, maquiagens e máquinas de fumaça nos palcos, elevando a qualidade visual e teatral nas suas apresentações.

Em 1976 o Dragon se juntou ao tecladista e saxofonista Christian Duponcheel, que havia tocado no Lagger Blues Machine e finalmente gravaram seu primeiro álbum, auto-intitulado nos estúdios Acorn, alvo desta resenha de hoje. A banda também contou, na guitarra, com Bernard Callaert.

São poucas as informações sobre a gravação de “Dragon”, em 1976. Reza a lenda que ele foi gravado no Reino Unido, mas, como muitos casos, fora engavetado, esquecido pela indústria, até que, em 1989, o selo Muséa Records o tirou dos escombros do esquecimento e o lançou em um formato CD.

Por outro lado, há informações de que a banda teria lançado, de uma forma totalmente alternativa, pelo selo Gamma Records, uma quantidade baixíssima de cópias, cerca de 1.500, uma prensa privada distribuída principalmente pela banda e pelo referido selo. Mais alternativa do que isso não há!

A arte gráfica denuncia esse trabalho quase que artesanal e manufatureiro do Dragon com o seu primeiro trabalho, embora bonito, parece ter sido desenhado a mão, tornando-o obscuro, pouco conhecido. O Dragon era o tipo de banda para quem a palavra “obscura” foi definitivamente inventada.

“Dragon” revela um som “descolado” do seu tempo, afinal eles entraram em estúdio em 1976, pois combina uma dinâmica arrojada, com mellotron em profusão em uma levada extremamente jazzística e em algum momento entrega estranhos e intrigante sonoridade solar e repletos de humor surreal, com alguma impetuosidade, algum peso e ambições que levam o álbum a uma complexidade que nos remetem aos primórdios do rock progressivo, por isso enalteci a questão de estar “descolado” no tempo, afinal 1976, apesar do prog rock ainda estivesse em alguma evidência, já não gozava de tanta popularidade, como a realidade, convenhamos, nunca esteve.

Você percebe, neste debut do Dragon, um som complexo e arrojado, mas por outro lado, é genuíno por ser deveras orgânico, intenso e vivo. A sua sonoridade definitivamente é, diria, ingênua! Como? Explico: é encantador, é envolvente, pois não se preocuparam com tendências, não se entregando a elas, envolvendo-se com a sua verdade musical, independente das urgências do tempo em que o álbum fora concebido.

Isso torna “Dragon” original, charmoso corroborando a sua atemporalidade, atribuindo-lhes uma originalidade, uma veracidade de sua arte. A ingenuidade a qual me refiro traz a sua verdade, sem amarras, por isso que a banda sucumbiu sob o aspecto comercial, sendo sequer apoiada pela oportunista indústria fonográfica.

Resumidamente “Dragon” evoca o progressivo sinfônico britânico com algum tempero psicodélico e muita vivacidade, atingindo tal plenitude com um pouco de peso, sintetizado em belos riffs de guitarra e bateria marcada. A formação da banda, quando gravou “Dragon”, tinha: Bernard Callaert na guitarra e backing vocals, Christian Duponcheel nos teclados, sintetizadores e mellotron, Jean-Pierre Houx no baixo, sintetizadores, trombone, paino e backing vocals, Georges Venaise na bateria e flauta e Jean Venaise nos vocais e guitarra.

O álbum é inaugurado com a faixa “Introduction” (Insects) com um órgão meio espacial, menos circense, mais introspectivo, algo místico, diria, que me remete a linhas de Pink Floyd e Novalis com um hammond provendo um ritmo de textura simples, mas eficiente com uma melodia sinuosa de guitarra que tece seu caminho dando fomento a esse redemoinho cósmico, de space rock. E um adorável piano ao fim.

"Introduction (Insects)"

“Lucifer” é um verdadeiro passeio selvagem, frenético e poderoso, uma verdadeira força da natureza. Com uma introdução descontraída e contemplativa de pássaros e oceanos, uma guitarra limpa ao estilo blueseiro se faz aparecer com baixo pulsante e pesado com vocais estridentes, despretensiosos quase humorísticos, com solos de guitarra trazendo o contexto, em uma camada hard. Mas as variâncias rítmicas, claro, se fazem presente e, diante dessa parte mais pesada e animada, surge um trecho instrumental calcado no space rock com espessa nuvem de sintetizadores e flautas.

"Lucifer"

“Leave Me With Tears” tem letras sombrias, mas emocionantes, com um adorável Mellotron choroso e um expressivo solo de guitarra apoiado por um piano de cauda no final. É uma música emocional, com um nível alto de dramaticidade.

"Leave Me With Tears"

“Gone In The Wind” traz uma faixa bem rock com trabalho matador de guitarra e uma melodia extremamente cativante, mas com uma levada pop, diria comercial e radiofônica com rajadas absurdas de mellotron no refrão da música. Trata-se de uma música cheia de vida e cheia de vida!

"Gone In The Wind"

“In The Blue” começa com alguns efeitos eletrônicos que remetem, em algum momento, com a cena minimalista germânica krautorck, com uma atmosfera sombria com algumas experimentações, trazendo interessantes e intrigantes solos de guitarras viajantes e teclados cintilantes e agradáveis que te faz voar ao ouvir, com inclusive as trompas, o bom trompete azeitando todas as instrumentações. Uma faixa muito bem construída com prolongados solos de guitarras e teclados que evoca o psicodelismo dos anos 1960.

"In The Blue"

E fecha com “Crystal Ball” basicamente traz a mesma proposta da faixa anterior, quase, diria, uma continuação dela com um vocal mais lento, discreto, introspectivo, algo caótico, atormentado, com golpes pesados e intensos do órgão e guitarra e os sintetizadores se revelando espaciais, uma levada space rock. As paredes sonoras do mellotron e riffs de guitarra termina a música de forma sombria.

"Crystal Ball"

O Dragon viria gravar, em 1977, o seu segundo trabalho chamado “Kalahen” nas mesmas condições que seu debut, "Dragon”, sem apoio e sem gravadora. Em 1992 o selo Mellow Records o trouxe a luz em um formato CD. “Dragon” também ganhou um novo lançamento, em 2012, em formato LP com belo e arrojado encarte, pelo selo Golden Pavillion.

"Kalahen (1977)"

Por mais que o Dragon tenha se descolado do tempo em que concebeu os seus álbuns, suas composições, dando-lhe o caráter de banda ingênua e até mesmo amadora, traz ideias sonoras inventivas e interessantes, algo extremamente instigante que realmente impressionam. E o que chama a atenção é o contraste de momentos sombrios e soturnos com momentos alegres, edificantes e solares. O que fascina e enaltece a cena progressiva, são essas nuances rítmicas que faz do som complexo e fascinante, ao mesmo tempo.

O Dragon mostrou potencial, mostrando ter sido uma grande banda de rock progressivo, digna e excitante, em alguns momentos. Uma pena não terem produzido mais, ter tido uma longevidade discográfica e terem saído de cena. Bem pelo menos é o que parece ser, pois pouco se tem de informação sobre o paradeiro de seus integrantes e que destino teriam rumado dentro da música. O fato é que, como um cometa, deixou alguma marca pela sua verdade sonora registrado em seus álbuns simples, mas significativos. Recomendado!


A banda:

Bernard Callaert na guitarra e backing vocals

Christian Duponcheel nos teclados, sintetizadores, mellotron

Jean-Pierre Houx no baixo, piano, sintetizadores, trombone e backing vocals

Georges Venaise na bateria e flauta

Jean Venaise nos vocais e guitarra

 

Faixas:

1 - Introduction (Insects)

2 - Lucifer

3 - Leave Me with Tears

4 - Gone In the Wind

5 - In the Blue

6 - Crystal Ball

 

 

Dragon - Dragon (1976)