Eu amo o rock n’ roll alemão
dos anos 1970 porque é diverso, é rico em sonoridades, embora muitos coloquem
todas as bandas surgidas naquela década, no “saco” do krautrock, com o intuito
de vender o conceito tendo como premissa a cena ou por preguiça de perceber o
quão vastas são as bandas sob o aspecto sonoro.
E não é só isso, aprecio e
muito o rock germânico pelo simples fato de servir como conteúdo para este
simplório e humilde blog, porque me serve e muito de referência pela infinidade
de bandas obscuras e esquecidas pelo tempo, pelos fãs e pela indústria
fonográfica.
Eu como um regente deste blog
e apreciador de pérolas sombrias, vilipendiadas, jogadas nos escombros do rock,
preciso, claro, desbravar e isso é maravilhoso, pelo fato de conhecer novas bandas
e sons e para gerar conteúdo para este blog que você, distinto leitor, confere.
E a Alemanha é um celeiro de
grandes bandas obscuras, uma árvore que gera inúmeros frutos e que insistem em
cair em nossas mãos, ávidos, esfomeados por obscuridades! E a banda que falarei
hoje personifica essa condição e traz em seu nome o poder, a força do seu som,
mas que pereceu precocemente, tendo uma vida efêmera. Falo do EXCALIBUR.
Aos que apreciam história,
como eu, “Excalibur” é a lendária espada do Rei Arthur, nas histórias do Ciclo
Arturiano da Bretanha, à qual às vezes são atribuídos poderes mágicos ou está
associada à soberania legítima da Grã-Bretanha. Em galês, a espada é chamada
Caledfwlch; no dialeto da Cornualha, a espada é chamada Calesvol; em Bretão,
Kaledvoulc'h; e em latim, Caliburnus.
Eu não sei o que teria estimulado os integrantes do Excalibur a buscar esse nome, haja vista que o único álbum que a banda lançou, em 1971, chamado “The First Album”, não é conceitual, embora traga, em sua arte gráfica, a espada irrompendo das rochas. Talvez lida com questões medievais, na sua sonoridade, não nas letras, falando de temas bem banais, triviais, da vida em geral, temas dispersos, diversos que não denota, nem um pouco, com o nome da banda.
Poucas são as informações
contidas sobre a banda na web, por isso que ela está aqui no blog, mas talvez a
motivação da escolha seja buscando referência em algo fantástico ou tendo como
influência na força de sua sonoridade, a soberania de seu som, uma sonoridade
forte, intensa e poderosa. Peço perdão aos amigos leitores pela licença poética
em trazer as especulações, estou estimulando a minha capacidade de
interpretação.
Mas não vou “queimar” etapas,
logo falarei do primeiro e único álbum do Excalibur, mas antes, falemos um
pouco dos primórdios da banda que remontam no ano de 1969. Os três integrantes
do Excalibur vieram da área de Mönchengladbach. São eles: Werner Odenkirchen
(guitarra e vocais), Hartmut Schölgens (órgão, baixo e vocais) e Manfred “Charlie”
Terstappen (bateria).
Não demorou muito para a banda conseguir, graças as suas explosivas apresentações nas pequenas casas de shows, de conseguir um contrato com uma pequena gravadora, a Reprise Records, para finalmente gravar o seu primeiro álbum, “The First Album”, em 1971. Considero que pouco tempo levando em consideração que muitas bandas levam muito mais tempo para gravar seus debuts.
O Excalibur teve a supervisão, em estúdio bem como na produção do álbum, de Dicky Tarrach, que foi baterista do The Rattles, Propeller, Wonderland e Brave New World, tendo ainda a participação de músicos convidados, como: Gorilla, também conhecido como Achim Reichel (baixo), Lemmi ou Lemmi Lembrecht (Percussão) e Hans Lampe (percussão que, mais tarde, seria membro das bandas La Düsseldorf e Neu). “The First Album” foi concebido no Windrose Dumont Time Studio, em Hamburgo.
Um detalhe estranho é que a
banda é apresentada como um “power trio”, tanto que na contracapa do álbum
aparecem apenas três caras. Mas em relançamentos consta a informação de que a
banda é composta por seis integrantes. É no mínimo curiosa essa situação.
Possivelmente os três músicos não creditados em fotos podem ser músicos de sessão,
os esses caras que são músicos de estúdio contratados. O fato é que podem não
ter sido creditados em fotos, mas os nomes estão lá e podemos considerar uma
banda com seis integrantes.
“The First Album” traz predominantemente uma sonoridade calcada no hard rock, um peso atípico para o início dos anos 1970, cujas bandas que estavam surgindo naquela época na Alemanha flertavam com a psicodelia, o experimentalismo. Tons de blues rock também são percebidos na sonoridade deste belíssimo álbum, com pitadas, especialmente nas faixas mais lentas, sinfônicas e algo de prog rock também. Mas arrisco em dizer que essas últimas vertentes estejam, de forma maciça, no álbum.
Alguns dirão que traz influências
do rock britânico ou ainda algo do estadunidense Vanilla Fudge, mas diria que é
um álbum tipicamente alemão, com o peso e a agressividade daquele país, com o
tempero do hard rock setentista que nascia na Alemanha. Vou além: talvez seja
um dos primeiros álbuns do estilo produzido na Alemanha, apesar do tímido
sucesso, da pouca repercussão que teve naquelas terras.
O álbum é inaugurado pela faixa “Light In The Dark” e já mete o pé na porta. Riffs pegajosos e pesados de guitarra, bateria marcada batendo forte, pesada, os vocais ásperos. Ela é cadenciada, lembra um proto stoner, cheia de peso e agressividade. As teclas são nervosas, enérgicas e isso se corrobora com o solo de teclados na metade da música, muito solar e dançante, que logo emenda com solos de guitarra igualmente agressivos. Começa a todo vapor!
“Get Me, If You Want” inicia
atípica, com riffs de guitarra que me remete ao punk, seco e simples, mas é
rápido. A faixa descamba para um hard cadenciado e com uma proposta mais
comercial, diria radiofônica. Dançante e animada. “Zamuno” é uma faixa
instrumental e tem o destaque nos teclados e traz uma pegada mais experimental
e progressiva, mas que vai encorpando graças aos riffs de guitarra e logo volta
a calmaria capitaneada pelo órgão. São as variações de ritmo típico do prog
rock.
“Run Through The Past” entrega
finalmente o esperado blues rock pesado e intenso, com vocais mais gritados. A
“cozinha” dá o tom, o ritmo, dando o groove, a pegada dançante e solar, solos
de guitarra traz uma textura mais “americanizada” com algo mais sulista. O lado
A termina com a faixa “Sure You Win” que introduz com uma salutar e brilhante
“batalha” entre riffs de guitarra e solos de teclados. A sequência da música
entrega algo cadenciado e dançante, com bateria marcada e solos de guitarra limpo,
direto e bem executado.
“Hollywood Dreams” traz o hard
rock genuíno de volta: peso na guitarra, baixo pulsante, bateria pesada, mas
ainda com aquela vibe mais cadenciada, com apelo mais comercial, mas muito bem
executada. Os vocais nessa faixa são mais limpos. Segue com “Questions” que traz
de volta os teclados em uma pegada mais contemplativa e diria até psicodélico,
contrastando com riffs de guitarra mais pesado e a “cozinha” dando o tom
novamente, com muito brilho. Solos de guitarra colorem tudo crescendo, dando
textura mais arrojada ao contexto sonoro.
“Don't Look Backwards” começa
sombria, estranha, ruídos, teclados e bateria corroboram esse momento, sendo
tocados aleatoriamente, lembrando, por um instante, o krautrock genuíno, mas
logo muda o “humor” da música com o já habitual peso com o também já
interessante duelo entre a guitarra e o teclado, um desafiando o outro e o hard
rock vence. E fecha o álbum com “Feelin's” que segue basicamente no hard rock e
na potência dos riffs de guitarra que é o tempero do peso da faixa, além da
bateria que é marcada, técnica e igualmente pesada. Mas logo ameniza, fica leve
o riff pesado da guitarra dá lugar a solos viajantes e bem executados. E assim
segue até quase o final. Um trabalho instrumental exuberante.
“The First Album” não atinge
sucesso comercial, apesar da sua belíssima produção e das músicas excepcionais.
Em 1974 mais três músicas do Excalibur foram incluídas no obscuro sampler
"Hells Angels In Rock", lançado pelo selo Jaguar, em 1974:
"Danger Zone", "Join The Club" e "Love Circle".
Deu a entender que, com o lançamento dessas músicas, a banda estaria preparando
um novo álbum, pelo selo Reprise Records, o que não aconteceria, sendo esse o
último ato da banda, finalizando precocemente as suas atividades.
Certamente era essa a intenção
do Excalibur, de lançar um novo álbum, até mesmo pelo nome do primeiro
trabalho, sugerindo uma sequência. Talvez haja músicas para lançar, porém saberemos
quando lançarem quem sabe em um futuro próximo, caso de fato, material inédito
exista além do que já foi lançado. O baterista Manfred Terstappen mais tarde tocaria
com o Marius Muller-Westernhagen. Em 1995 “The First Album" foi lançado,
em CD, pelo selo Germanophon. E em 2007 também lançado em CD pelo selo Retro
Disc International.
Mais uma banda que caiu nos
escombros escuros e empoeirados do rock. Mas estamos aqui, abnegados que somos
e dispostos a desbravar a escuridão do rock e trazê-los à luz para que todos
vejam e ouçam essas músicas desprovidas do glamour do mainstream e capitaneados pela criatividade e arrojo de seus
músicos. Mesmo com uma curta história deixou uma indelével marca para a
história do hard rock alemão no início dos anos 1970. Raridade totalmente
recomendada!
A banda:
Werner Odenkirchen no vocal e
guitarra
Hartmut Schölgens no órgão e
vocal
Manfred Terstappen na bateria
Com:
Gorilla (Achim Reichel) no
baixo
Lemmy (Lemmi Lembrecht) na
percussão
Hans Lampe na percussão
Faixas:
1 - Light In The Dark
2 - Get Me If You Want
3 - Zamuno
4 - Run Through The Past
5 - Sure You Win
6 - Hollywood Dreams
7 - Questions
8 - Don’t Look Backwards
9 - Feelin’s