domingo, 20 de setembro de 2020

November - En Ny Tid Är Här... (1970)

 

Os meus primeiros contatos com o rock escandinavo, sobretudo do rock n’ roll sueco se deu graças as bandas mais novas, da nova geração daquele país que, apesar de não ser incluída no rol dos grandes centros que “produzem” grandes bandas tem sim, um celeiro de bandas excelentes nos mais diversos estilos, nas mais diversas vertentes. 

E como sou um apreciador compulsivo de bandas oriundas da década de 1970, as bandas mais antigas, pensei: se há bandas excelentes suecas surgindo nesses últimos vinte anos, vou voltar um pouco no tempo e pesquisar bandas mais antigas desse país, quem sabe encontro algo que me interesse e faça entender o motivo pelo qual tais bandas atuais, apesar de ter propostas sonoras bem contemporâneas, não escondem influências claras de occult rock, rock progressivo, hard rock e blues rock. 

E comecei a garimpar e não foi muito difícil encontrar algumas “pepitas” que reluziam brilhantes nos meus olhos ávidos por coisas empoeiradas e mofadas do rock n’ roll. E vi uma banda com um nome curioso e atípico chamado NOVEMBER.

Bem, me pus a ouvir antes e, caso gostasse, me colocaria a pesquisar sobre. E o som é arrebatador, é lindo! Uma poderosa mescla de hard rock, com vertentes progressivas e psicodélicas, com guitarras lisérgicas, uma “cozinha” bem aplicada e cantando em sueco, na sua língua nativa e para quem acha que no rock o inglês impera e é mais adequado para o velho rock n’ roll precisa ouvir o November. É surpreendente e avassalador. Mas, sem mais delongas, vamos embarcar na história que, como sempre as obscuras trazem algumas peculiaridades. 

November

O November é de fato uma banda que conhecemos como “underground”, afinal são poucas as informações disponíveis sobre a mesma na grande rede, mas o pouco que há dá conta de sua história interessante e que conta a história do rock sueco na sua gênese. 

A história da banda começa no remoto ano de 1968 em um clube no subúrbio da capital sueca, Estocolmo, a partir de uma banda chamada The Imps, formada por Christer Ståhlbrandt, vocalista e baixista e Björn Inge, baterista que duraram poucos meses, pois no início daquele ano Christer decide debandar e montar outra banda chamada Train que contava inicialmente com Teo Salsberg na bateria e o inglês Snowy White que, em num futuro próximo tocara no Thin Lizzy, na guitarra. 

Ainda em 1968 Teo decide sair e Christer convida o ex-companheiro da sua antiga banda, The Imps, Björn Inge para ocupar seu lugar. Nessa época eles tocavam algumas faixas em inglês e sueco até que em 1969 White retorna para a Inglaterra e em seu lugar entra o guitarrista Richard Rolf. 

Então a banda decide cantar somente em sueco, já que tinha apenas integrantes suecos e também decide mudar de nome. Como a sua estreia aconteceu em primeiro de novembro de 1969, ao abrir um show do Fleetwood Mac em Gotemburgo, escolheram o nome “November”. 

O November logo conseguiu algum sucesso na Suécia graças as suas apresentações ao vivo sendo conhecida por tocar o mais rápido que podiam e de fato para a época a banda abusava de forma avassaladora dos riffs e solos de guitarra e embora seja considerada uma banda influenciada pelo rock psicodélico, em voga na época, era muito pesada e seguia a proposta de bandas como Cream, Jimi Hendrix, Blue Cheer entre outras que tocavam de forma agressiva na época. 

Não é á toa que o November se tornara um “power trio”, como o já mencionado Cream que fazia muito sucesso, tocando pesado e eram três grandes músicos, definitivamente. No início dos anos 1970 a maioria das bandas de rock da Suécia passou a ser rotuladas, sobretudo pelos formadores de opinião, como rock progressivo, surgindo, por lá, um termo chamado “Progg”. 

O November tinha tendências progressivas, mas tinha a sua raiz fincada no hard rock. Mas essa não era a questão, não apenas uma tendência sonora, mas política também. Era uma época em que muitas bandas se posicionavam contra a Guerra do Vietnã. 

O movimento contra cultural tinha suas raízes fincadas na cena psicodélica dos Estados Unidos e de vários países no mundo que repudiavam a guerra. Na Suécia não foi diferente e a classe trabalhadora decidiu se organizar partindo de princípios marxistas e revolucionários. Vários partidos comunistas participaram de eleições gerais entre 1968 e 1973 e esses partidos tinham a intenção de catalisar a juventude sueca. 

E foi declarado que todas as bandas e músicas progressivas eram de cunho político e comunista, exceto bandas comerciais como o ABBA, por exemplo. Isso ajudou e muito a estereotipar o som das bandas na Suécia e nem todas eram progressivas, principalmente o November. 

O November retorna a Estocolmo e são convidados a gravar algumas músicas ao vivo em um estúdio de uma rádio local que são transmitidas pelo país inteiro e o seu sucesso aumenta. Com isso retornam ao estúdio e gravam dez músicas que culminaria no seu álbum de estreia chamado "En Ny Tid Är Här...", em 1970, alvo de minha resenha e que significa, em tradução livre: “Uma nova era chegou”. 

E era um pontapé inicial a uma nova música na Suécia: pesada, obscura e agressiva, mas que também mesclava passagens acústicas e suaves, com vertentes blueseiras, de hard rock e pitadas progressivas e psicodélicas. É lançado também nesta época uns singles chamados "Mount Everest" e "Cinderella", esta última não editada no disco e inédita em formato digital até os dias de hoje.

Então comecemos com “Mount Everest” que já entrega o peso dos riffs de guitarra, bateria poderosa e marcada. Baixo pulsante, com alternâncias rítmicas que vai do peso e da agressividade conferido pela guitarra com solos diretos e a suavidade com uma bateria meio bluesy. Excelente!

"Mount Everest"

“En Annan Värld” traz uma introdução psicodélica com uma guitarra ao estilo acid rock com uma batida meio pop e dançante, lembrando um beat, mas que logo se dissipa irrompendo em um hardão setentista com riffs de guitarra sujos e pegajosos.

"En Annan Varld"

“Lek Att Du är Barn igen” já entrega um solo limpo e bonito de guitarra com a flauta “rivalizando” nos momentos mais “soft” da música, um bom e bem feito hard com pitadas generosas de rock progressivo.

 "Lek Att Du ar Barn Igen"

“Sekunder (Förvandlas till år)” é mais obscura, uma atmosfera mais densa e edificada com riffs de guitarra e vocais limpos e de bom alcance, seguida pela mesma proposta a “En Enkel Sång om Dej” que, com riffs de guitarra, divide o destaque com pegada mais dançante, uma batida mais comercial, diria radiofônica.

"Sekunder (Forvandlas Till Ar)

Mas com “Varje gång jag ser dig känns det lika skönt” a situação muda de figura, o peso e a agressividade retorna e em uma camada mais blueseira com um riff que me remete ao heavy metal, um bom exemplo de proto metal esta nessa faixa, diria algo, muito discretamente, de doom metal ou um “protótipo” do que viria a se convencionar de doom metal, termo utilizado pela vertente surgida nos anos 1980. 

“Gröna Blad” mantém a pegada, a guitarra, mais uma vez, tem o protagonismo sem negligenciar a “cozinha” bem aplicada e igualmente pesada, a fama que a banda adquiriu de “tocar rápido” se confirma nessa música: pesada e veloz.

"Varje Gang Jag Ser Dig Kanns Det Lika Skont"

“Åttonde” vem com a proposta mais dançante, mas abusa dos solos de guitarra com destaque para a bateria bem swingada e poderosa, em dado momento. “Ta ett steg i sagans land”, mais uma vez a dobradinha entre guitarra e bateria tem destaque. Pesada, avassaladora e agressiva é sinônimo para essa música. 

E finalmente fecha com “Balett blues”, um fechar de cortinas, com o vocalista falando em sueco e um piano ao fundo, mas que se revela um blues rock que se tivesse maior duração seria ainda mais interessante. Mas fecha com a dignidade que esse álbum e banda merecem.

 "Ballet Blues"

O November, em 1971, lançaria o segundo álbum, o “2:a November” e parte para uma turnê bem sucedida pela Europa, tocando ao lado de músicos e bandas que faziam sucesso na época em países como a Inglaterra, por exemplo. Em 1972 a banda lança seu terceiro trabalho de estúdio "6:e November", um álbum mais bem elaborado, complexo, mas a banda decide encerrar as atividades em clube de Estocolmo na noite de ano novo de 1973. 

"2:a November" (1971)

"6:e November" (1972)

Richard Rolf, que se mudaria para a Noruega forma, naquele país, uma banda chamada “Nature”, e anos depois partiria para carreira solo. Björn monta em 1974 o “Energy”, que deixa alguns trabalhos gravados, e encerra atividades na década de 1980. Christer se junta a outros músicos recrutados em Estocolmo e grava também em 1974 o único autointitulado álbum do “Saga”. 

Richard Rolf e Energy

Saga

Em 1993 é lançado o “November Live”, em formato LP, que tem apresentações da banda entre 1970 e 1971, motivando em uma reunião da formação original da banda em um clube em Estocolmo, onde começaram há mais de cinquenta anos atrás. Mas isso já é outra história.



A banda:

Björn Inge na bateria e vocal

Christer Stålbrandt no baixo e vocal

Richard Rolf na guitarra


Faixas:

1 - Mount Everest

2 - En Annan Värld

3 - Lek Att Du är Barn Igen

4 - Sekunder (Förvandlas Till år)

5 - En Enkel Sång Om Dej

6 - Varje Gång Jag Ser Dig Känns Det Lika Skönt

7 - Gröna Blad

8 - Åttonde

9 - Ta Ett Steg i Sagans Land

10 - Balett Blues



November - "November" (1970)