sexta-feira, 27 de outubro de 2023

Missus Beastly - Missus Beastly (1970)

 

Costumo defender, como um ávido “consumidor” de rock alemão, que esse país não pode ser rotulado com a versão experimental e psicodélica que se convencionou, graças a uma piada da imprensa britânica, “krautrock”. Foi um movimento contra cultural que atingiu proporções musicais com algumas comunidades hippies alemãs que decidiram expandir, por intermédio da música, os seus conceitos de vidas alternativas e que se expressavam com músicas experimentais, lisérgicas e minimalistas.

Mas paralelo a esse movimento, a essa cena que florescia nas ruas alemãs, de forma marginal e underground, existia outra muito forte com bandas que exploravam grandes seções de improvisações, baseados no jazz rock e no peso do embrionário hard rock, onde podemos citar como as principais: Kraan, Thirsty Moon, Passport, Release Music Orchestra, Out of Focus, Missing Link, Embryo e Brainstorm, Guru Guru, apenas as mais proeminentes.

A Alemanha sempre entregou, com muita qualidade, bandas de várias vertentes do rock. Então considero um equívoco colocar todas as bandas alemãs dentro do mesmo “saco” do krautrock, limitando, injustamente, o rock n’ roll alemão, a referida cena, não que esta seja ruim, pelo contrário.

Equívoco este plantado por formadores de opinião e alguns sites tido como referência na informação do rock progressivo e afins. Mas no final da década de 1960, mais precisamente em 1968, surgia uma banda que, em comparação com as mencionadas que abrilhantaram a cena jazz rock na Alemanha, é mais obscura, mais desconhecida, porém deu a sua grande contribuição para a música progressiva e o hard rock germânico conhecida por MISSUS BEASTLY.

Missus Beastly

A banda, como disse, foi formada em 1968 com o nome de “Psychotic Reaction”, evoluindo em duas eras diferentes. A banda mudou o seu nome para “Missus Beastly” (da boneca negra “Mistress Beastly”) sendo talvez uma das primeiras bandas que lançou, de forma oficial, um álbum com vertente jazz rock com verdadeiras jam sections lisérgicas e psicodélicas com doses cavalares de hard rock e blues com um progressivo ainda engatinhando.

O nome do primeiro álbum, “Missus Beastly”, de 1970, alvo de minha resenha de hoje, foi gravado no CPM Studio, ainda em meados do ano de 1969, com uma pequena tiragem de 1.000 cópias. Uma verdadeira pérola, uma verdadeira preciosidade do fusion alemão que caiu no ostracismo empoeirado do rock.

A banda contou com a ajuda de ilustres músicos para conseguir gravar o seu debut, foram eles: o flautista do Xhol Caravan, Hansi Fischer, bem como membros do Amon Duul II, que estavam em estúdio à época. Eles acabaram participando do álbum também tocando seus instrumentos.

O Missus Beastly, na época da gravação e lançamento do álbum, homônimo contava com a seguinte formação: Lutz Oldemeier na bateria e percussão, Atzen Wehmeyer na guitarra e vocal, Wolfgang Nickel no órgão, piano e vocal e Pedja Hofmann no baixo e vocal, com as participações mais do que especiais de: Hansi Fischer, na flauta, da banda Xhol Caravan e mais o grande Embryo, Dieter Serfas na percussão que era do Amon Duul II, além de Chris Karrer no violão também do Amon Duul II, além de ter participação da primeira encarnação do Amon Duul e no Embryo e John Weinzierl no violão.

O álbum começa com a faixa curta e grossa chamada “XOX”, uma guitarra distorcida, estridente, com uma voz falada em alemão, algo desconexo, mostrando o que viria a seguir: peso e muita jam section ácidas e perigosas.

"XOX"

“Uncle Sam” já chega esmurrando a porta e arrebentando os pobres ouvidos com um hardão excitante, em uma hecatombe de solos de guitarra de tirar o fôlego com a bateria cheia de viradas e marcações tocada de forma agressiva e esporrenta, ao mesmo tempo. Uma ode ao peso, a visceralidade e a agressividade, tendo a camada do teclado dando amém a todo o frenesi sonoro que se sucede.

"Uncle Sam"

“Shame On You” começa ao estilo meio folk, ao estilo Jethro Tull, com a predominância de uma doce e delicada flauta, em contraponto ao que se ouvira na faixa anterior. Mas depois vem as improvisações, o jazz rock se faz presente com destaque para os teclados e a bateria, agora extremamente virtuosa e técnica, bem jazzy dando lugar aos dedilhados competentes de guitarra. Música bem versátil!

"Shame on You"

“Decision” retoma o álbum ao hard rock. Mais direta, com riffs pegajosos de guitarra e teclados tocados ao máximo, mostra uma faixa mais direta e crua deste excelente álbum.“Chinese Love Song” é o momento mais “louco” do álbum com vozes e gemidos, algo também meio desconexo, típico do krautrock também.“Mean Woman (Woody Mouse)” é o ponto alto do álbum. Um blues de encher os olhos e deixar os ouvidos e a alma no mais puro e genuíno êxtase. Bateria ritmada, marcada, bem excetuada, baixo pulsante e vigoroso, com algum groove, guitarra sendo delicadamente dedilhada e um vocal alto, altivo e limpo. Um blues rock de cair os queixos!


"Mean Woman (Woody Mouse)"

E para fechar com chave de ouro tem a “Aphrodisiakum” realçada pela base instrumental, em especial a “cozinha” que, mais uma vez dá o seu recado, com muito groove, dando um caráter mais “dançante” a música com os teclados tocados de forma frenética e muito competente.

"Aphrodisiakum"

Uma curiosidade sobre esse álbum e banda é que um grupo usurpador, liderados por um alemão chamado Henry Fromm, que se dizia empresário do Missus Beastly, além de flautista e baterista, pirateou suas músicas, assim como outros álbuns e singles sob o nome de “Missus Beastly” sem a permissão da banda.

O primeiro foi "Nara Asst Incense", com uma reedição ilegal da estreia da banda, de 1970, em LP e cassete e CD do selo bootleg “Germanofon”. A segunda foi “Volksmusik - ao vivo em Amsterdam”, em versão LP. A terceira foi "Im garten des Schweigens" mais tarde reeditado como "Super Rock Made in Germany", na versão LP. A quarta foi "Fuck you Free/Fire Bird". A quinta foi "A better Life/Henry's Dead Woman Blues". E o sexto lançamento pirata foi "Jawa Masa/Love Train Rock".






Estranha a essa excessiva ação de roubos e pirataria ao redor da banda, o que deduz que não estavam preocupados com as questões financeiras o que logo, certamente, levou ao fim precoce da banda ou ainda não tinham a mínima capacidade de gerir os negócios do Missus Beastly.

E falando em tantas mudanças, o Missus Beastly original, após o lançamento do seu primeiro álbum, sofreu com alguns rodízios de músicos. Paul Vincent na guitarra e Michael Scholz nos teclados se juntou à banda e o que era antes um quarteto, passou a ser um sexteto.

No verão de 1970, porém, Vincent foi substituído por Roman Bunka, bem como o saxofonista e flautista Jergen Benz também se juntou ao Missus Beastly. No final daquele ano Wehmeyer e Nickel sairiam da banda. Tudo isso em poucos meses!

Tendo problemas para encontrar shows e até mesmo tendo que vender a sua van e PA, por conta dos problemas financeiros, a banda se desfez em 1971. Hofman foi para a Índia, enquanto a maioria dos outros se juntou a bandas de maior sucesso como Bunka, Embryo, Benz, Erna Schmidt, Oldemeier e Checkpoint Charlie.

Até que alguns ex-membros juntamente com o ex-tecladista da banda Missing Link, Dieter Miekautsch, teve a árdua missão de reformular a banda, mantendo o estilo que construíra a estrutura sonora do álbum anterior, lançando três álbuns, um em 1974 chamado "Mi“sus Beastly”, outro em 1976 de nome “Dr. Aftershave And The Mixed-Pickles” e o terceiro em 1978 chamado “Space Guerrilha. Em 1982 a banda se separou.




A banda:

Lutz Oldemeier na bateria

Atzen Wehmeyer na guitarra e vocal

Petja Hofman no baixo e vocal

Wolfgang Nickel nos teclados

 

Com:

Hansi Fischer na flauta

Chris Karrer na guitarra

John Weinzierl na guitarra

Dieter Serfas na bateria


Faixas:

1 - XOX

2 - Uncle Sam

3 - Shame on You

4 - Decision

5 - Chinese love Song

6 - Mean Woman (Woody Mouse)

7 - Aphrodisiakum




Missus Beasty - "Missus Beastly" (1970)


Link download album: aqui