quinta-feira, 27 de abril de 2023

Witch - Salem's Rise (1985)

 

O ápice da “New Wave of British Heavy Metal” aconteceu em meados dos anos 1980. As bandas, outrora marginalizadas e temidas pelas suas indumentárias e letras ultrajantes calcadas nas mazelas comportamentais da sociedade ou temas obscuros, se tornaram “mainstream”, se tornaram populares.

Algumas cenas, algumas “células” do heavy metal como o glam metal, por exemplo, ganhou notoriedade, atingindo as rádios, a MTV, com clipes caros, atingindo status de superprodução cinematográfica, com androginia que excitam as menininhas que, revoltadas sem motivo, tentavam, a todo custo alarmar seus pais.

O heavy metal estava na moda. No Brasil rádios como Fluminense, a famosa “Maldita”, catapultava o “rock de bermuda” e, cada vez mais o público “consumia” cada vez mais as bandas estrangeiras que estavam no pedestal do sucesso, culminando no até então maior festival de música do país, o “Rock in Rio”.

Ozzy Osbourne, hedonista, se drogava, ostentava dinheiro, Iron Maiden se apresentava em palcos suntuosos, Def Leppard fazia as menininhas suspirarem, o glam metal era um tapa na cara da sociedade politicamente correta com suas roupas espalhafatosas e homens meticulosamente “femininos”.

Mas como tudo na indústria fonográfica, há também o lado “obscuro”, o lado esquecido, “empoeirado”, que, vilipendiado, formou um nicho marginalizado, longe dos olhares e ouvidos dos ardorosos fãs que trafegavam na “zona de conforto” das bandas medalhonas e é essa cena que soube, com maestria, construir uma cena intocável e genuína.

E claro, a cena não foi “setorizada”, restrita a países, mas globalizada e consequentemente algumas bandas, espalhadas pelo mundo, ostentaram o seu ostracismo. E, a partir daí, vem a pergunta: Por que algumas bandas foram relegadas a esta condição? Muitos são os fatores, logo difíceis de mensurar exatamente: maior sorte, incompetência, sonoridade “pouco digerível” etc.

O fato é que por aqui neste reles e humilde blog, essas bandas, fracassadas sob o aspecto comercial da coisa, ganha luz, ganha vez. E uma em especial é digna de contar a história, embora pouco, muito pouco mesmo se saiba a respeito dela, por isso, óbvio, é uma banda extremamente rara e obscura, falo da banda norte americana WITCH.

Witch

A banda foi formada em Dayton, Ohio, mas não se sabe exatamente em que ano os caras se juntaram. O pouco que há a respeito do Witch é de que a banda teve uma vida curta e gravou apenas um álbum de estúdio chamado “Salem’s Rise”, em 1985.

Reza a lenda que a banda gravou o álbum apenas para eles, os músicos e para alguns amigos mais próximos, enfim, trata-se de um trabalho predominantemente “artesanal” vide, inclusive, a arte gráfica do álbum, muito simples, diria inocente de tão “rudimentar”, em suma, é realmente um trabalho artesanal.

Sabe-se que o álbum teve lançamento inaugural da série OH Wax Gotta Groove Records e originalmente lançado pela gravadora “Eargasm Productions”. O produtor executivo da Eargasm Productions, Tim Grogean foi apresentado ao guitarrista do Witch, Ted George, em 1984, quando este foi ao estúdio em Dayton, Ohio, de Gorgean.

Ted Goerge

Ted foi ao estúdio de Tim Grogean para pedir para produzir um single de sua banda para ele. Ted George era conhecido por ser um avassalador guitarrista da cena de Ohio, conhecido também pela sua apresentação animalesca nos palcos. Ted ansiava em escrever um álbum e Tim estava procurando por um projeto para apresentar às grandes gravadoras em Los Angeles, onde estava borbulhando a famigerada cena glam metal, e também na cidade de Nova Iorque.

As composições e os ensaios começaram em Versailles, Ohio. Além de Ted George na guitarra e composição, a banda era formada por Dave Chappie, no baixo, Tony Chappie, na bateria e Ace Matthews no vocais. Muitas e muitas noites os caras do Witch tocaram no porão da casa dos irmãos Tony e Dave para dar existência ao seu álbum de nome “Salem’s Rise”.

A pré-produção foi feita nos estúdios do Eargasm. A gravação de “Salem’s Rise” aconteceu na “Audio Productions”, em New Carlisle, em Ohio e teve a engenharia de Tim e Mike Niklas. Tim Grogean, além de produtor executivo do álbum, ajudou também na composição das músicas e na guitarra. Foi masterizado na QCA em Cincinnati, Ohio, onde também foi originariamente fabricado os LPs. Tonny Chappie e Tim Grogean escreveram os solos de bateria e o pianista Larry “LD” Hampshire ficou ao lado de Ted para a composição dos teclados.

“Salem’s Rise” é o típico heavy metal oitentista, solos galopantes de baixo, guitarras estridentes, com riffs pegajosos, pesados e vocais melódicos e com algum alcance, mas traz algo diferente, algo inocente, algo orgânico que não se faz nos dias de hoje, onde a avidez é para atender a demandas de um público distante e que não se apega aos instrumentos.

Não é um álbum matador, um petardo sonoro, mas personifica a cena heavy dos anos 1980, trazendo todos os ingredientes para se ter um álbum de heavy rock, pois ainda traz nuances do hard rock setentista perdido e esquecido pelo tempo.

O álbum é inaugurado com a faixa “Poison”, uma faixa típica de heavy metal com riffs pesados e pegajosos, com bateria marcada, cadenciada, baixo pulsante e vocal indulgente e sombrio. “Poison” entrega algo de hard rock também, algo dos primórdios da New Wave Of British Heavy Metal em meados dos anos 1970, quando eram mais cruas e que sofriam influência das bandas setentistas.

"Poison"

“Beckon” começa cadenciada, riffs discretos de guitarra traz uma textura mais sombria, algo como occult rock, mas que logo irrompe em uma explosão heavy com um vocal mais alto, por vezes mais gritado. Música direta e poderosa!

"Beckon"

“Eyes on You” tem uma abordagem mais pop, mais comercial e radiofônica, mas não se perde do contexto do álbum com os indefectíveis riffs pegajosos de guitarra dando o ritmo. Essa música me remete a fase oitentista de Alice Cooper. Bandas como Ghost, que é notória fazendo esse tipo de música atualmente, o Witch já o fez mais de trinta anos antes.

"Eyes On You"

“Lady Medusa” vem botando o pé na porta  e traz uma miscelânea interessante entre heavy metal e hard rock, com um vocal límpido e quase falado em alguns momentos com uma “cozinha” bem entrosada, dando uma textura intensa e densa ao contexto sonoro, com um solo lindo e direto de guitarra sendo a cereja do bolo.

"Lady Medusa"

Segue com “Will I See You Again” que traz a evidência dos teclados, dando uma nostalgia sombria dos primórdios do occult rock, como o Coven, por exemplo, com um vocal de grande alcance. Uma atmosfera sombria e melancólica se arquiteta nessa música e fecha de forma excelente com um solo de bateria.

"Will I See You Again"

“Teen of Darkness” segue basicamente a mesma atmosfera da faixa anterior, uma pega mais occult rock, porém com uma diferença: peso. O peso protagonizado pela guitarra, pelos seus riffs e a intensidade da bateria que também dita o ritmo da faixa e toda a sua indulgência.

"Teen of Darkness"

“Hear the Thunder” faz jus ao nome da faixa. Traz de volta o heavy rock do álbum com a excelente dobradinha entre a bateria e a guitarra, sendo tocadas de forma intensa e agressiva. O baixo vai ganhando força e encorpando a música, dando-lhe certo groove. Uma das melhores músicas de “Salem’s Rise”.

"Hear the Thunder"

E agora segue com a faixa título, “Salem’s Rise”, que é arrastada, com algumas evidentes “pitadas” de doom metal. Traz algo de sujo e ameaçador em sua melodia. Cada nota tocada me trouxe a impressão de que a banda flertava com o despretensioso e orgânico, mas com algumas variâncias rítmicas que denota complexidade. Intrigante e fantástica faixa.

"Salem's Rise"

“Loki” é uma ode ao heavy metal, mas que, ao mesmo tempo, entrega algo complexo também, ousaria dizer que remete a bandas como Mercyful Fate, com o seu metal progressivo e todas as suas mudanças de andamento, mudanças de ritmo. Os vocais e os riffs de guitarra são os destaques da música.

"Loki"

E fecha com “Something Evil” não poderia encerrar da melhor maneira, bateria pesada, riffs pesados e agressivos, baixo pulsante e vocal alto e gritado, rasgadão mesmo. Tem uma sonoridade direta, curta e grossa, sem rodeios, mas é, por outro lado, robusta, encorpada, intensa, energética, solar.

"Something Evil"

“Salem’s Rise” teve uma festa de lançamento que foi realizada na “Hara Arena”, em Dayton, Ohio. As cópias do álbum esgotaram quase que imediatamente, foram poucas cópias produzidas. Mas nem tudo foi festa, porque diante de um mercado perverso e que ansiava pela new wave e a “big hair metal”, o famoso “metal farofa” e também com o glam metal, “Salem’s Rise” se viu deslocado de tudo que o mercado fonográfico queria e a banda não conseguiu nenhum contrato de gravação, ninguém quis assinar com o Witch.

A maioria dos músicos envolvidos com o Witch continuam tocando e gravando até os dias de hoje. Ted passou a liderar várias bandas e a trabalhar com outros artistas, incluindo Rick Derringer. Ele é conhecido hoje como “Fast Eddie” devido a sua velocidade ao tocar guitarra.

Os irmãos Chappie acabaram se tornando empresários e pouco ou nada se sabe sobre o futuro do vocalista Ace Mathews. O tecladista “LD” continuou a tocar em bandas com Tim Grogean e gravaram muito nos estúdios da área de Dayton, em Ohio. Tim passou a trabalhar com bandas como Rush, Sponge, Days of The New e Sun e até hoje grava e faz turnês com sua atual banda chamada Amplified. O álbum foi relançado, em outubro de 2018, pelo selo “Gotta Groove Records”.


A banda:

Dave Chappie - baixo       

Tony Chappie - bateria     

Ted George - Guitarras     

Ace Matthews – Vocais

Com

Larry “LD” Hampshire – Teclados

Tim Grogean – Produção, composição das músicas

 

Faixas:

1 - Poison

2 - Beckon

3 - Eyes on You

4 - Lady Medusa

5 - Will I See You Again

6 - Teen of Darkness

7 - Hear the Thunder

8 - Salem's Rise

9 - Loki

10 - Something Evil


Witch - "Salem's Rise" (1985)


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