Quando eu comecei a me
aventurar no universo vasto e diversificado do rock progressivo eu achava que
nos Estados Unidos, talvez por desconhecimento da minha parte, ainda
desvirginando nessa vertente do rock n’ roll, ou por pensar que na terra do Tio
Sam o público era avesso ao estilo, não tinha uma cena proeminente e prolífica.
Mas a sorte é que sou um eterno curioso, um homem empírico que busca e lê, modéstia à parte, fazendo com que uma cena recheada de grandes
bandas e grandes álbuns descortinasse diante de meus olhos.
Mas muitas dessas bandas não gozam de popularidade e de uma
longa carreira discográfica, mesmo com álbuns excepcionais e de grande
relevância para a concepção mais genuína do que convencionamos de rock
progressivo.
Claro que, movido pelo estímulo da curiosidade, a cada banda que
descubro, traz a "beleza" de seus fracassos, capazes de nos propiciar com pitorescas e singulares histórias. E uma
banda que conheci norte americana ajudou e muito a edificar a minha predileção com o rock progressivo dos Estados Unidos, em especial, sendo uma das primeiras que
ouvi,essa banda se chama ATLANTIS PHILHARMONIC.
O Atlantis Philharmonic é
mais uma daquelas bandas progressivas regionais dos Estados Unidos que foi
formada em Cleveland, Ohio, em meados dos anos 1970 em um país que tinha o hard
rock como a vertente mais popular e famosa, fazendo um genuíno e ousado rock
progressivo que mesclava um progressivo sinfônico vigoroso e pleno, que nos
remete ao Yes, Van Der Graaf Generator, King Crimson e Camel, mas com uma dose
bem temperada de hard rock, com bons riffs de guitarra que fez seu único álbum,
lançado em 1974, um trabalho robusto e majestoso e seminal para o prog rock
norte americano.
E a novidade da banda não fica apenas nas suas pretensões
sonoras, mas também na sua estrutura, na sua formação. Trata-se de um duo
(dupla), sim, dois caras dividiam os instrumentos, mostrando uma competência
além do comum.
Então vamos aos artistas do espetáculo progressivo do Atlantis Philharmonic:
Joe DiFazio que era responsável pelo órgão, piano e teclados, além do cravo,
mellotron, sintetizador moog, guitarra, baixo, pedais-de-pé de graves, vocais
principais e de apoio e Royce Gibson que era o baterista, também responsável pelo
gongo, caixa de concerto e backing vocals. Uau! Inacreditável os caras tinham
uma grande responsabilidade mesmo e parece que não reclamaram de sobrecarga,
porque entregaram ao mundo um excelente álbum de rock progressivo!
Atlantis Philharmonic
Joe DiFazio começou a ter
aulas de música clássica ainda no ginásio, muito jovem. Depois de concluído foi
aceito em uma faculdade de Ohio no curso de música. Mas ficou somente dois
semestres, porque descobriu nada menos que o rock n’ roll.
Desistiu do curso e
foi tocar em uma banda canadense que fazia cover dos Beatles. Em 1971 se juntou
a Royce Gibson na tentativa de fundir o pouco que aprendeu, quando jovem, a
música clássica, com a sua nova paixão, o rock, mais precisamente o hard rock,
que, nessa época estava em voga no país, graças à profusão de bandas do estilo.
Deu o nome de “Atlantis” a banda, mas logo inseriram o “Philharmonic” em
virtude a sua proposta de música clássica, uma espécie de menção ao estilo.
Joe DiFazio
Com nome reformulado e a
banda, ou melhor, a dupla formada começaram a escrever e gravar novo material,
sendo que, DiFazio, antes de se reunir a Royce, já tinha algumas composições
prontas e alguns “rabiscos”, sendo auxiliado, é claro, pelo seu novo colega de
banda.
Apesar das dificuldades iniciais de negociar a sua arte com gravadoras,
conseguiu, em 1974, gravar seu único trabalho, homônimo, pelo selo “Dharma”, de
Chicago, recrutando o produtor Perry Johnson no estúdio Castle Studios, em Lake
Geneva.
Após o lançamento do álbum, o Atlantis Philharmonic viajou em turnê, de
forma extensiva e intensa pelo Meio-Oeste americano abrindo shows de bandas do
naipe de King Crimson, Wishbone Ash, Stix, Tim Buckley, entre outros nomes
fortes do rock n’ roll, ganhando alguma notoriedade e experiência, é claro.
Bem, sem mais delongas,
vamos ao álbum. Constituído por seis faixas, engloba, como disse anteriormente,
um progressivo sinfônico poderoso e vivaz, com influências pesadas do hard
rock, com doses cavalares de teclados, moogs e sintetizadores, exuberantes e
frenéticos que oscilam com a suavidade do piano com riffs desconcertantes de
guitarra que dá o tom pesado ao álbum, sendo eclético, versátil e muito
interessante de se ouvir, diria ser um álbum atemporal, jovem e com um frescor
mesmo com os seus 45 anos de idade.
Comecemos com a faixa “Atlantis” que já
entrega a proposta do todo o álbum, riffs de guitarra poderoso, bateria rufando
forte, teclados em profusão, me remetendo a bandas como ELP e Atomic Rooster
com um vocal soturno, mas muito bem executado, diria também um pouco de rock
psych. A sinergia entre os teclados e a bateria é excepcional, avassaladora.
"Atlantis"
Segue com “Woodsman” cuja
introdução traz a suavidade e uma atmosfera contemplativa do piano clássico,
entregando a proposta mais clássica da banda. O vocal entra, seguindo o padrão
soft, discreto e introspectivo da música. Uma balada que me lembrou, em alguns
momentos, a fase mais experimental e inicial do King Crimson, como em “Islands”,
por exemplo. Mas, se encaminhando para o fim, a música vai ganhando mais “corpo”,
o mellotron traz um momento mais viajante e pleno, a música ganha mais vida.
Arrepiante música!
"Woodsman"
Eis que surge “Death Man”
que abre com uma levada mais jazzística, dançante, envolvente, mas que logo
ganha peso e agressividade, com riffs pegajosos e fortes de guitarra, com
vocais de maior alcance, aqui me lembrei de bandas como Deep Purple, Uriah Heep
e também Atomic Rooster, a faixa mais pesadona do álbum, e uma das melhores,
sem dúvida. Sem contar com os solos de guitarra crus e direto, uma faixa
apoteótica para os aficionados por hardão.
"Death Man"
“Fly-The-Night” segue a
proposta com a predominância dos teclados, lembrando, mais uma vez, o ELP. Uma
faixa mais comercial, simples, me soa radiofônica e pop, com um pouco de
paganismo celta, diria. Uma faixa interessante, mas, em minha opinião, a menos
atrativa do álbum.
"Fly-the-Night"
“My Friend” é mais uma balada
que, também começa com o piano clássico dando a atmosfera suave e delicada à
música que logo ganha o tempero dos teclados e uma bateria igualmente leve e
marcada e aquele clima viajante típico dos álbuns inaugurais do King Crimson. O
destaque fica para o solo simples, mas competente, de guitarra que dá o tom
mais pesado, porém breve, da faixa.
"My Friend"
E fecha com a música “Atlas”,
a faixa mais longa do álbum, que já começa com um verdadeiro petardo com um
turbilhão de riffs de guitarra, instrumentos de percussão poderosos e bélicos,
com efeitos e ruídos garantidos pelo sintetizador que faz desta música
arrebatadora e eclética, com vocais mais altos e limpos. Uma faixa
deliciosamente caótica e frenética.
"Atlas"
Quando o Atlantis
Philharmonic gravou seu álbum, o que era um duo, uma dupla, logo se transforma
em trio. É convocado para assumir a guitarra Roger Lewis, talvez pelo fato de
que com dois músicos apenas, com a quantidade de instrumentos para tocar ao
vivo, pudesse ser um entrave nas apresentações, dividindo um pouco as
responsabilidades e a banda ganhar um pouco de “liberdade” visando um melhor
desempenho nos palcos.
O Atlantis Philharmonic
continuou fazendo seus shows, se apresentando setorialmente, no Meio-Oeste
americano, sem conseguir ser destacar nacionalmente, em outras partes dos
Estados Unidos e sem o apoio da gravadora, que, convenhamos, também não
dispunha de recursos, fazendo com que a banda infelizmente encerrasse as
atividades.
Pouco se sabe sobre o caminho que os músicos seguiram após o fim da
banda. A informação é de que Joe DiFazio retornou, nos anos 1980, à faculdade
fazendo um curso ligado a tecnologia da computação ligada à música, se formando
em seguida, tornando-se um bacharel sendo atualmente professor de novas mídias e
tecnologia da computação na Indiana State University.
Já os demais músicos,
Royce Gibson e o terceiro integrante, Roger Lewis, nada se sabe. Em 2008, no
site do Atlantis Philharmonic, foi anunciado o lançamento de um álbum chamado “Atlantis
Philharmonic II – Grand Master” e, segundo informações não confirmadas e muito
desencontradas, seriam novas composições da banda. Já outra fonte é de que são
músicas gravadas na década de 1970, mas que não teriam sido oficialmente
lançadas e, neste trabalho, a banda estava no formato trio, já com o
guitarrista Roger Lewis.
"Atlantis Philharmonic II - Grand Master" (2008)
O fato verídico é que este
primeiro trabalho do Atlantis Philharmonic é um deleite aos ouvidos e um elixir
à alma. Um álbum versátil e muito bom que lamentavelmente não ganhou o mundo caindo nos porões obscuros do rock progressivo. O álbum teve alguns
relançamentos em 1990 (The Laser's Edge) e 2016 (Belle Antique). Uma pérola
sonora.
A banda:
Joe DiFazio o órgão, piano,
piano eletrônico, cravo, Mellotron, sintetizador Moog, guitarra, baixo, pedais-de-pé
de graves, vocais principais e de apoio.
Royce Gibson na bateria,
tímpano, bumbo, gongo, caixa de concerto e backing vocals.
Faixas:
1 - Atlantis
2 - Woodsman
3 - Death man
4 - Fly-the-light
5 - My friend
6 - Atlas
"Atlantis Philharmonic" (1974)
Álbum com faixas ao vivo