A década de ouro dos anos
1970. Sim, considero os anos 1970 o mais prolífico, o transborde de bandas
foi evidente, a olhos vistos para deleite dos ouvidos e da alma.
O seu início,
com estilos embrionários, ganharam substância com o passar dos anos, fazendo com
que a oferta de bandas regozijar de alegria os ávidos por uma sonoridade
nova, uma juventude transviada e marginal, sem perspectivas de uma vida boa e
rica, buscaram nesta revolução sonora que eclodiu nesses longínquos anos, a sua
alimentação, a sua fortaleza emocional, bem antes do punk rock, amigos.
Muitas
bandas atingiram êxito, trouxeram o conceito de rock de arena, shows
faraônicos, de estádios, ginásios, o rock se entrelaça ao show business. Mas há
as bandas relegadas, esquecidas, que caíram no obscurantismo do rock. Contudo
não se enganem, não entendam como incompetência, como bandas que falharam perante
o mundo sedutor do sucesso, do dinheiro e das turnês gigantescas.
São bandas que
exatamente sintetizou a inquietude da juventude naqueles tempos de outrora, que
entregaram a sua verdade sonora, a sua música na mais perfeita ingenuidade
criativa, genuína, mas que, por muitos motivos, que torna a discussão tão
complexa, não ganharam a luz e não chegou ao máximo de ouvidos e corações
possíveis.
Quando conhecemos uma banda, depois de tanto tempo em que fora
formada, a gente sempre se pergunta: Mas como eu não havia feito a audição
desta banda, deste álbum antes? Nos questionamos, inclusive, nos condenamos:
Será que gostamos mesmo de rock n’ roll?
Foi o que aconteceu comigo ao ouvir
tão recentemente, de uma forma tão nova a banda finlandesa ELONKORJUU que foi
formada há mais de cinquenta anos atrás. A banda nasceu para mim, diante dos
meus olhos, se instalou, se apossou nos meus ouvidos e me seduziu de forma
arrebatadora.
Como disse o Elonkorjuu foi formada em 1969, em Pori, na
Finlândia. No início, como toda banda, com poucos recursos e estrutura, começou
a ensaiar em uma adega, muito escuras, silenciosas e que irrompeu em
sonoridades cruas, jovens e envoltas em estímulos calcados na música.
Elonkorjuu
Nesse
mesmo ano o Elonkorjuu conquistou o segundo lugar em uma competição na Casa de
Cultura de Helsinque. Logo após essa conquista a banda ganhou um belo
reconhecimento local, fazendo uma turnê pela Finlândia e ficando ainda mais
conhecidos pelo país.
Um dos seus grandes momentos à época foi a participação
em um festival de rock de Turku, onde tocaram para centenas de pessoas.
Finalmente o seu debut foi lançado em 1972, alvo dessa resenha, chamado “Harvest
Time”, pelo selo underground Shadocks Music.
Esse álbum foi construído graças aos infindáveis shows
que fizeram na época de seu lançamento, moldando o som da banda, refletindo
neste excelente trabalho. Uma curiosidade é que, quando a banda se apresentou
na Europa Ocidental, eles adotaram o nome “Harvest” (equivalente ao finlandês “elonkorjuu”)
que fez com que as vendas aumentassem.
A banda, bem como o seu primeiro e
grande álbum, traz uma sonoridade edificada no hard rock, psych energéticos,
com pitadas generosas de rock progressivo, não permitindo, apesar dos tempos
iniciais de estilos que ainda estavam crescendo na época, se estereotipar,
flertando com todos eles assinando a sua identidade, seu DNA sonoro.
É
perceptível, sobretudo em “Harvest Time” influências de Cream, Black Sabbath e
bandas progressivas do início da década de 1970. A formação da banda em “Harvest
Time” tinha: Jukka Syrenius no vocal e guitarra, Veli-pekka Pessi no baixo, Heiki
Lajunen no vocal, Ecro Raniasila no rummui e lkka Poijarvi / no urui, guitarra
e flauta.
O álbum abre com “Unfeeling” sendo enérgica, animada, solar, com
riffs pegajosos e atraentes, com vocal cativante e altivo, uma música pesada e
direta.
"Unfeeling"
“Swords” tem uma linda introdução vocal e introspectiva que explode um
hard rock típico e poderoso com viradas espetaculares de bateria e riffs de
guitarra fortes, com alternâncias rítmicas fazendo dessa faixa um clássico hard
prog de tirar o fôlego.
"Swords"
“Captain” traz um pouco de psicodelia, com uma camada
interessante de teclado e que vai aumentando o tom graças a bateria pesada
acompanhada de riffs gulosos de guitarra até se revelar um hard psych de
excelência, tendo, em momentos de calmaria a flauta como protagonista.
"Captain"
“Praise
to Our Basement” se mostra como uma linda balada com um solo simples, mas
envolvente de guitarra. “Future” começa com um baixo pulsante, entregando para uma
guitarra frenética e assim seguem em uma espécie de salutar duelo em prol da
música, com inclinações jazzística da bateria, é de arrepiar!
"Praise to our Basement"
"Future"
“Hey Hunter”
segue com um hard mais acessível, comercial, mas que não compromete a qualidade
do álbum, pelo contrário.
"Hey Hunter"
“The Ocean Song” tem uma vertente inteiramente
calcada no psicodelismo, um beat dançante, com guitarras lisérgicas e teclado
arrebatador.
"The Ocean Song" em uma TV finlandesa no (1971)
“Old Man's Dream” começa
agitada, com o protagonismo da guitarra com riffs pesados e diretos. A cozinha também se mostra muito afiada, com a bateria marcada e pesada, com um baixo pulsante, seguindo o ritmo frenético da música.
"Old Man's Dream"
“Me and My
Friend” é mais animada, solar, diria algo pagão, com destaques para o vocal,
guitarra e bateria em uma sinergia incrível.
"Me and my Friend"
Fecha com “A Little Rocket Song”
sintetizando o que foi o álbum: pesado, com riffs viscerais de guitarra, vocal
de grande alcance e rasgados.
"A Little Rocket Song"
A edição original em vinil de “Harvest Time” foi
lançada apenas na Finlândia e hoje é uma raridade para colecionadores de todo o
mundo. Foi relançado em CD, no ano de 2011, pela German, democratizando um
pouco mais esse som fantástico.
Em 1978 o Elonkorjuu lançou seu segundo álbum, “Flying
High, Running Fast”, com o nome “Harvest”, com o intuito de atingir o mercado
internacional, mas logo se separou. O guitarrista Jukka Syrenius se mudou para
a Noruega e lançou vários álbuns com seu novo grupo Jukka Syrenius Band.
A
banda foi reformulada em 2003, lançando seu terceiro álbum “Scumbag”, em 2004
e, mais tarde, em 2015, lançado seu quarto trabalho, “Footprints”. Uma grande
banda, um grande álbum!
A banda:
Jukka "Jusu"
Syrenius na guitarra
Veli-Pekka
"Hiippi" Pessi no baixo
Eero Rantasila na bateria
Ilkka "Ike"
Poijavi na guitarra, órgão e flauta
Heikki "Lossi"
Lajunen no vocal, na guitarra, baixo e piano
Será que uma banda
obscura, pouco conhecida, merece o título de pioneira? Merece ser agraciada
pelo protagonismo de ser uma banda desbravadora de um estilo, de um conceito
sonoro ou estético? É um assunto que talvez não seja digno de atenção, haja
vista que a questão do pioneirismo em um estilo, sobretudo no rock n’ roll,
seja muito relativo, afinal seu universo é vasto e inexplorado.
Há muito a se explorar, muitos
registros que se perderam nos baús empoeirados do rock obscuro estão ganhando a
luz graças a gravadoras undergrounds que os relançam, bem como abnegados
anônimos, fãs como eu e você, que disseminam, em todas as ferramentas de
comunicação virtual, álbuns, vídeos etc.
Mas ao ouvir algumas bandas, obscuras,
nos perguntamos imediatamente: como não conseguiu atingir êxito em sua carreira
discografia, como não teve longevidade? Ou aquelas exclamações fortes e
decididas como: Essa banda deve reivindicar seu protagonismo na história do
estilo! Tento não entrar tão a fundo nessas discussões, coadjuvando a música, mas quando ouvi o SUDDEN DEATH e o seu
único álbum lançado, “Suddenly”, fora como se eu tivesse sido arrebatado por sentimento
de liberdade, de prazer, diante de uma música tão forte, visceral e
revolucionária como de seus contemporâneos mais famosos, como Black Sabbath,
Led Zeppelin, entre outros.
E falando em contemporâneos e Black Sabbath, essa banda, composta à época, por jovens, garotos, foram selecionados como finalistas em uma pesquisa nacional de artistas chamadas de "American's Answer to Black Sabbath", o que realmente é lamentável, mas era a febre do sucesso do Black Sabbath e a ganância dos empresários da indústria fonográfica em buscar "novos" Black Sabbath, com uma música "rebelde" para ganhar um dinheirão.
O Sudden Death foi formado em 1970 em Pasadena, Califórnia,
nos Estados Unidos, por dois amigos de escola: John Binkley, baixista e Tim Lavrouhin,
baterista. A banda, como tantas outras no seu começo de trajetória, tocava
covers de Blue Cheer, The Doors, Cream, Hendrix etc.
John Binkley
Os caras eram de Los Angeles, ficavam em sua redoma, sem ter contato com a música pesada que florescia, principalmente na Inglaterra. Jimmy Page? Não conheciam! Jon Lord? Menos ainda. Mesmo com esse papo lamentável de concurso do "novo Black Sabbath".
Logo se juntou a banda o
guitarrista Joey Dunlop. Eles deram o nome a banda de Sudden Death. Agora precisavam
de um vocalista, mas a escolha foi difícil, não aparecia nenhum que pudesse “harmonizar”
com a proposta da banda. Até que convidaram um cantor britânico chamado Dave Marci
X que teve uma curta passagem pelo Sudden Death, pois o som era muito pesado e
ele tinha inclinações blueseiras.
Joey Dunlop
Então finalmente surgiu o vocalista Greg
Magie que foi o elo, a junção necessária e perfeita com o poderio sonoro de que
a banda já dispunha. Quando tudo parecia que ia dar certo, quando tudo estava
correndo bem, o baterista Tim Lavrouhin deixou a banda. O preenchimento dessa
lacuna não foi fácil, afinal, era complicado encontrar alguém que pudesse se
encaixar ao som do Sudden Death. A propósito a banda apresentava um hard rock
vigorante, com pitadas generosas de psicodelia e agressividade, um heavy metal
de vanguarda. Depois desse período de construção do Sudden Death e da fase de tocar covers, os caras da banda tiveram a mais legítima necessidade de compor material novo. E esse sentimento surgiu logo após a formação da banda em 1971. Joey tomou a iniciativa e praticamente escreveu todas as canções, tendo como inspiração as bandas que faziam covers, como Uriah Heep, Hendrix, Sabbath, Purple, entre outras de sua época. Os ensaios eram verdadeiras jams sections, o que serviu de sustentáculo para as músicas gravadas em "Suddenly".
Após uma apresentação, um empresário ficou extasiado com o que viu e ouviu e decidiu gerenciá-los! O Sudden Death, após isso, fez vários shows, inclusive participou daquele famigerado festival nacional em resposta ao Black Sabbath e ganharam, mas até que os ajudou a promover a banda e a sua música.
Mas quando tudo parecia que
ia bem, mais uma baixa. O baterista original caiu fora do Sudden Death. Mas um
processo de garimpo e busca de um novo músico aconteceu. Porém dessa vez não
foi tão complicado, porque na ajuda da escolha do novo músico teve a
participação da produtora da banda à época, Cathy Dunlop, que foi casada com o
guitarrista Joey Dunlop.
Charlie Brow foi recrutado!
O cara gozava até de alguma experiência na música tendo tocado em outras bandas
locais. Finalmente com a banda já devidamente formada passa a fazer alguns
shows locais, como The Ice House em Glendale, a boate de Gazzari na Sunset
Strip em Hollywood, a Beach House em Venice Beach. O Resultado dessas
performances variou, os donos desses locais preferiam colocar músicas mais
“acessíveis” e o Sudden Death era uma banda muita pesada, causando inclusive
algum temor por parte do público que também se dividia quanto a sua sonoridade.
E a sorte dos moleques do Sudden Death começou a mudar quando o produtor, cantor e compositor Kim Fowley entrou em cena. Na realidade a banda pediu aquele apoio a eles que junto com Michael Sunday, produtor associado à Epic Records que ouviram e viram a banda, em uma sessão de ensaios e ficaram impressionados.
Marcaram com o Sudden Death uma gravação na CBS Records em Hollywood em março de 1972. Gravaram cerca de 6 horas material suficiente para um álbum. Parecia que a banda dera um passo enorme para um contrato.
No entanto, os diretores da CBS decidiram não contratar a banda por motivos óbvios, é claro, a música da Sudden Death era pouco palatável e comercial. A decepção foi grande causando a dissolução do Sudden Death na virada de 1972 para 1973 e o álbum foi engavetado. a formação da band que gravou esse material tinha: John Binkley no baixo, Charlie Brow na bateria, Joey Dunlop na guitarra e Greg Magie nos vocais.
O álbum abre com “Come Away With Me”, uma balada introspectiva, sombria, melancólica, que fugiria à regra de todo álbum, com viés mais pesado, mas muito linda e divinamente psicodélica e lisérgica. Mas “Road Back Home” já entrega ao ouvinte as credenciais do Sudden Death, começa pesado com riffs avassaladores, solos desconcertantes de guitarra e vocais melódicos e rasgados, ao mesmo tempo.
"Road Back Home"
“It's Lonely Here” traz uma
atmosfera viajante e psicodélica, com guitarras lembrando acid rock, em algum
momento. “The Zoo” começa silenciosa, ameaçadora, mas irrompe em uma explosão
poderosa de hard rock com riffs dando “cobertura” ao vocal, mais uma vez
rasgado e melódico de Greg Magie.
"It's Lonely Here"
“My Time Is Over” sem dúvida é
uma das melhores faixas do álbum, sendo pesada, agressiva, densa e que faria,
sem dúvida, de muitas bandas vindouras, o seu bê-á-bá musical. É perceptível o
quanto essa música traz um quê de avant garde, de vanguardismo, guitarras
sujas, pesadas e cadenciadas lembrando um stoner rock muito em voga em bandas
de temáticas "retrô" de hoje.
"My Time Is Over"
“Leather Woman” segue a proposta
da faixa anterior, com muito peso e agressividade, mostrando uma banda coesa,
mas também bem despretensiosa. A “cozinha” bem afinada não pode ser
negligenciada nessa música, baixo e bateria deu o “tempero” para um prato
nutritivo de música pesada. “Country Livin'” tem o destaque logo na introdução,
riff de guitarra poderoso, vocal berrado, um senhor petardo sonoro, um heavy
rock de pura qualidade.
"Country Livin"
E fecha com “Crazy Lady” com
muito peso, um hard mais cadenciado e até mais dançante. “Suddenly” não tem uma boa qualidade no som, afinal é oriundo das fitas demo que não foram trabalhadas pela CBS Records na época, mas ainda assim mostra uma banda vigorosa, poderosa, com um som honesto, genuíno, que preferiu seguir na contramão do óbvio sonoro que sempre, infelizmente, povoou a indústria fonográfica.
Depois da recusa da CBS em gravar o álbum do Sudden Death alguns músicos decidiram seguir seus próprios caminhos e desbravar novos projetos. A banda chegou a um ponto em que Binkley, Charlie e Greg saíram em 1973 para formar uma banda com uma abordagem mais comercial para se posicionarem em clubes que haviam rejeitado o Sudden Death por conta de sua sonoridade suja e pesada. O projeto se chamava "Sky Fire".
Eles encontraram Keith Winnovich na guitarra e Dave Morgan nos teclados, mas tentaram evitar as músicas que todas as bandas estavam tocando à época e até que conseguiram descolar alguns shows nesses clubes que não aceitaram o Sudden Death. Tocaram por um ano, mas também não deu certo. Binkley foi para uma banda local chamada Hammerhead.
Joey formou uma banda chamada Polaris, uma espécie de banda teatral que lembrava Bowie. Tinha um ótimo som, tocaram em Hollywood, mas não teve nenhum contrato assinado com uma gravadora, apesar de alguns interessados terem surgido.
Binkley e Joey mantiveram contato e em 1978, cerca de três anos após a separação do Hammerhead, formaram o Temper com Davee Dickerson na bateria. Mas sofreram com a intensa rotatividade dos músicos que não se encaixavam de maneira nenhuma com a sonoridade da banda. A banda fez, mesmo assim, alguns shows, mas não funcionou e se separaram depois de pouco mais de um ano.
Em 1995 a gravadora Rockadelic Records trouxe de volta o sonho da banda em lançar esta obra obscura e esquecida, dando luz ao rock obscuro do Sudden Death. O nome do álbum escolhido foi "Overtime", inclusive era o nome escrito na embalagem das fitas demo que foram encontradas para ser finalmente gravados oficialmente, mas decidiram renomeá-lo como "Suddenly".
Muita das bandas velozes, pesadas e agressivas com toques melódicos que surgiriam em profusão nos anos seguintes, sobretudo nos anos 1980, certamente lembraria o Sudden Death e quem sabe atribuiriam a mesma o protagonismo dessa proeminente cena musical.