quinta-feira, 6 de agosto de 2020

UFO - Live (1972)


A história do hard rock tem nome: UFO! É claro que foi escrita por outros autores, mas o UFO merece a glória da edificação desta música até os dias de hoje, diante da perpetuação da música, com os seus “filhos” nascendo e crescendo.

O UFO não recebeu à altura o crédito como as consagradas Black Sabbath, Led Zeppelin, Deep Purple, entre outras, coisas do mercado fonográfico, creio. Não somente a música pesada teve a assinatura, a pedra fundamental do UFO, mas o heavy metal, estilo que ganharia popularidade no início dos anos 1980, ampliando as raízes de sua música de vanguarda àqueles músicos jovens que construiriam as suas bandas e músicas. 

É incontestável a sua importância para o hard rock, para o heavy rock, para o heavy metal. Em todas as vertentes pesadas, a frondosa árvore sonora do UFO se fez e faz presente. O UFO, antes chamada de Hocus Pocus, teve seu nome modificado logo para UFO e tinha na formação Phil Moog no vocal, Mick Bolton na guitarra, Pete Way no baixo e Andy Parker, o subestimado e excelente baterista. 

UFO em 1971

Essa era a gênese da banda, a formação original que era a menos conhecida, aquela que não ganhou tanta projeção, quando da entrada de músicos do naipe de Michael Schenker, na guitarra, Paul Raymond na guitarra base e teclados, por exemplo. Todavia, não será esta a fase a ser colocada em destaque por aqui e sim a sua formação mais obscura e esquecida, a do início dos tempos, dos primórdios do UFO, entre 1969 e 1972.


O primeiro álbum da banda, chamado de “UFO I”, foi lançado em 1970 e mescla um rock psych, com hard rock e blues rock, sendo considerado, em minha humilde percepção, como um dos pilares da música pesada e que não conta com tanta publicidade em relação aos álbuns de bandas como Led Zeppeli, Grand Funk Railroad, Deep Purple, por exemplo.

UFO I (1970)

Mas a guinada veio com o segundo trabalho, de 1971, chamado de “Flying”. Um álbum que destoa de toda a característica discográfica que viria depois do UFO, mas que o torna essencial e importante para a história de um estilo que ainda estava em consolidação, era embrionário: o space rock

"Flying" (1971)

Essa música estava sendo praticada por bandas psicodélicas na Inglaterra e Estados Unidos como Pink Floyd, por exemplo, mas eram rascunhos de experimentalismo e sons sinistros caracterizados por ruídos ou coisa do tipo e com o “Flying” do UFO, juntamente, é claro com o segundo álbum do seminal Hawkwind, “In a Search of Space”, também lançado em 1971, elevaram o nível e encorpou o que se convencionou “space rock”. Era, mais uma vez, o UFO fazendo história e não sendo devidamente creditado por suas façanhas.

E foi com essa formação original que esses dois álbuns foram concebidos. E também foi com essa formação que a fama do UFO em fazer grandes performances nos palcos, ao vivo, começou a ser construída, sobretudo na Alemanha e Japão que receberam muito bem o "Flying", mas na Inglaterra e outros "centros" o trabalho foi muito criticado o chamando, inclusive, de "lixo". 

E com base nessas afirmações, não podemos negligenciar a sua história nos palcos, mas há um registro, uma gravação ao vivo que é obscura, pouco conhecida e que contempla uma fase da banda esquecida, que é a fase discográfica compreendida entre os anos de 1970 e 1972, que contempla os seus primeiros álbuns com a sua clássica formação.

Falo do “Live 1972”, gravado na cidade de Tóquio, no Japão, em 1972. Esta rara apresentação conta com seis performances excepcionais da banda e que conta com alguns covers e que foram gravados no seu primeiro álbum, como “C'mon Everybody”, de Eddie Cochran e “Who do you Love”, de Bo Diddley.

Foi graças ao "Flying" e a percepção positiva do público germânico e nipônico pelas longas suites e viagens psicodélicas e progressivas que o UFO recebeu o convite de tocar no Japão abrindo os shows da Three Dog Night. Chegando em terras japonesas o UFO é impactado por uma surpresa: o Three Dog Night cancelou seus shows. E para não deixar os produtores locais em problemas o UFO acabou sendo elevado a condição de banda principal.

O UFO fez vários shows pelo Japão com ingressos esgotados, casas cheias. As regalias de banda principal também tinha, mas tinha, sobretudo, apresentações avassaladoras, intensas, como deveria ser. O sucesso da excursão ao Japão foi tamanha que a banda teve que agendar um show extra no Hybia Park, em Tóquio, onde a banda se apresentou para mais 20.000 pessoas.

E como consequência desse feedback tão positivo a Beacon Records teve que, claro, lançar oficialmente uma apresentação da banda ao vivo e foi exatamente essa última apresentação e por lá chamada de "UFO Landed Japan" e relançado como "UFO Live" ou "UFO Live in Japan".


É um álbum que mostra a banda ainda buscando a sua identidade musical, a sua formação mais crua e direta, mostrando um hard rock competente e vigoroso, com alguns resquícios do rock psicodélico e um bom blues rock. 

O álbum começa com “C'mon Everybody” que já vem com uma sonora porrada com riffs de guitarra pesado de Bolton seguidos de solos mais crus e diretos mas que proporcionavam peso e agressividade a música.

"C'mon Everybody"

“Who do you Love” dá sequência ao show, com uma introdução bluesy na guitarra que logo se descamba para uma levada mais funkeada, dançante e que logo irrompe em uma hecatombe pesada e bem cadenciada. “Loving Cup”, outro cover de Paul Butterfield, é mais classic rock, uma levada mais rock, genuíno, tendo a “cozinha instrumental” em uma ótima sinergia e afiada entre Parker e Pete Way, com Bolton fazendo a guitarra “chorar” com solos longos, encorpados e pesados.

"Who do you Love", Live in Japan (1972)

E eis que surge “Prince Kajuku / The Coming Of Prince Kajuku”, faixa do segundo álbum “Flying”, de 1971. Aqui ela ganha vida nova, mais peso, agressiva, direta, crua, irreverente, com velocidade, diria se tratar de um heavy metal de vanguarda tamanho é o seu peso e temos que creditar reverências a sessão rítmica. Todos os instrumentos em uma convergência sonora impressionante.


"Prince Kajuku / The Coming of Prince Kajuku", Live in Japan (1972)

“Boogie For George”, do primeiro álbum, “UFO I”, traz o hardão setentista típico de volta e com o anúncio do solo denso e poderoso de Bolton a música vai dizendo a que veio, com peso e agressividade. É de dilacerar os ouvidos! Fora que ganhou uma linda extensão de improvisação que só garantiu mais atrativos a faixa. 

"Boogie For George" 

“Follow You Home” fecha o show com maestria, com Phil Moog conclamando o público e fazendo o que sempre fez na sua história como frontman, cativando o público, os tendo em sua mão, com muita empatia e carinho. Há de se fazer um parêntese de Moog neste show, vocal perfeito, limpo, altivo, como até hoje, convenhamos.

Após o sucesso da turnê no Japão o UFO tentava conquistar seu espaço no seu país natal, a Inglaterra, mas não conseguia de jeito nenhum, sendo intensamente criticados pela imprensa local. Então Mogg decide investir no glam rock, o que assustou o tímido e discreto Mick Bolton, sendo despedido da banda em 1971. Uma perda que parecia irreparável. 

A busca por um novo guitarrista acontece e chegam ao experiente Larry Wallis que havia tocado em bandas como o Lancaster e Blodwyn Pig. A nova formação faz uma série de shows pela Europa, mas não durou muito tempo, por causa de uma briga pesada entre Wallis e Mogg que culminou com a saída do guitarrista. Dessa formação há uns "bootlegs" espalhados pelo mercado obscuro. Wallis tocou no Pink Fairies e participou da primeira formação do Motorhead quando Lemmy Kimilster foi expulso do Hawkwind.

Larry Wallis

No final de 1972 um jovem guitarrista chamado Bernie Marsden, que hava tocado no Skinny Cat, entrou para a banda, depois de algumas boas audições. Partem então por mais uma turnê fugindo da Inglaterra, resolvendo excursionar na segunda terra onde eram venerados, a Alemanha. Porém, alguns problemas mudariam a história do UFO para o resto do tempo. 

Com problemas particulares, Bernie teve que ficar em Londres para resolvê-los antes de partir para a Alemanha. Assim, Way, Mogg e Parker foram de balsa, e esperariam Bernie, que iria de avião, já na Alemanha. Só que o guitarrista acabou esquecendo o passaporte na hora do embarque, e teve que ficar na Inglaterra.

UFO com Bernie Marsden

Com as datas já marcadas, mais um incidente ocorre poucas horas antes da apresentação. A bombástica notícia era que todo o material da banda, trazendo o PA e alguns instrumentos, havia sido roubado. 

A solução encontrada foi alugar o PA e os instrumentos da banda de abertura, uma iniciante chamada Scorpions, além de pedir emprestado também o guitarrista, o jovem e talentoso Michael Schenker, enquanto que Bernie acabaria surgindo posteriormente na mais famosa encarnação do Whitesnake.

Michael Schenker

Sem falar uma palavra em inglês, Michael acabou aceitando graças a insistência de seu irmão, Rudolph, e então, em apenas 20 minutos, Way passava todo o repertório do show para o garoto. Foi o suficiente para o mundo do UFO ser transformado. Naquela noite, o mundo ganhava um dos mais talentosos criadores de riffs da história do rock, e o UFO finalmente arrancava as cordas que o prendia e conseguia voar não somente na Inglaterra, mas conquistando todo o planeta.

Infelizmente Bolton não teve um bom prosseguimento de sua carreira como guitarrista, mas conta-se que em 1980 ele voltou a trabalhar com a banda como técnico de guitarra na turnê de ‘No Place to Run’, lançado naquele mesmo ano. O “Live 72” foi relançado em 2008, na coletânea “Flying, The Early Years” junto com todos os outros trabalhos pré-Schenker da banda. Excelente álbum que dignifica a história do UFO.




A banda:

Phil Moog no vocal
Andy Parker na bateria
Mick Bolton na guitarra
Pete Way no baixo


Faixas:

1 - C'mon Everybody
2 - Who do you Love?
3 - Loving Cup
4 - Prince Kajuku / The Coming Of Prince Kajuku
5 - Boogie for George
6 - Follow you Home 



UFO - "Live" (1972)