terça-feira, 21 de março de 2023

Nova - Blink (1975)

 

O ano era 1973, na Itália. Um dos grandes expoentes do hard prog italiano, Osanna, lançaria o seu grande álbum, “Palepoli”. Esse álbum personificaria o ápice da criatividade sonora do Osanna, mas esse momento épico da banda renderia a sua dissolução, devido as relações tempestuosas entre seus integrantes.

Então ainda na produção de seu vindouro álbum “Lanscape of Life”, em 1974, se tornou oficial o fim do Osanna. Danilo Rustici, o guitarrista exímio, juntamente com o excelente flautista e saxofonista Elio D’Anna, partiriam para a Inglaterra para formar a banda Uno que, ainda em 1974, gravaria seu único álbum chamado “Fonit”, enquanto Lino Vairetti e Massimo Guarino deram um sopro de vida a banda Città Frontale, dessa vez com novos integrantes lançando, em 1975, o álbum “El Tor”.

Uno - "Fonit" (1974)

Em 1975 Rustici e D’Anna não conseguiram engrenar o Uno e a banda não vingou, porém permaneceram na Inglaterra, na tentativa de dar vida a outro projeto mais audacioso e por lá construir uma carreira de sucesso comercial.

Danilo Rustici

Esse era uma tendência fonográfica dos anos 1970 na Itália, de exportar seus músicos para o exterior e os caras do Osanna levaram e muito isso tudo a sério, tanto que gravavam algumas faixas em inglês e inclusive o “Landscape of Life” fora o primeiro álbum da banda gravado integralmente em inglês.

Além da preferência mercadológica os ex-músicos do Osanna optaram por ficar na Inglaterra, pois na percepção desses o país oferecia um caldeirão cultural bem diversificado mesmo no rock contra uma espécie de provincianismo italiano e lá formaram a banda NOVA, alvo de minha resenha de hoje.

O Nova foi mais um supergrupo poderoso formado em meados dos anos 1970, que traziam músicos do Osanna, representados por Danilo Rustici e Elio D’Anna, além do baterista do Circus 2000, que estava aposentado à época, Dedè Lo Previte e o ex-Cervello Corrado Rustici, guitarrista e vocalista e também irmão de Danilo. Trazia também o baixista Luciano Milanese, baixista e que, no auge dos seus 25 anos de idade, já substituto do grande Vittorio Scalzi no Trolls.

Não precisa fazer longos e complexos comentários acerca da qualidade da banda, de músicos mais do que tarimbados e já experientes na indústria da música, oriundo de bandas extremamente inovadoras e arrojadas na cena italiana e que desejavam avidamente conquistar o mundo.

E o primeiro passo era compor, fazer aflorar a sua arte e gravar material oficial para divulgar a sua música. O primeiro passo foi um contrato obtido com a americana “Arista Records”. Então o Nova começou a trabalhar imediatamente nos estúdios “Eel Pie Studios”, muito conhecido por abrigar gente do naipe de Pete Townsend, lendário guitarrista do The Who, Thin Lizzy, Siouxsie and the Banshees entre outros.

E finalmente, ainda em 1975, ganha a luz o seu debut, o excelente “Blink” que falaremos daqui para frente. Com “Blink” debaixo do braço o primeiro passo foi distribuir o trabalho para que todos, o máximo possível possa ouvir o álbum e conhecer a banda. Este foi distribuído na Inglaterra, Holanda e na França. Na Itália ele também foi distribuído, pela “Ariston”, em 1976, mas de uma maneira pouco eficiente, pois a promoção foi efêmera, incipiente, que o tornou obscuro, indetectável para muitos aficionados pelos fãs do rock progressivo. Para se ter uma noção do quão raro “Blink” é, um exemplar do long play (LP), em janeiro de 2010, estava na faixa dos incríveis 150 euros!

E quando falei, caros e estimados leitores, que a banda queria, com esse projeto do Nova, “globalizar” a sonoridade da banda, isso se torna evidente em cada faixa quando se faz uma audição. “Blink” está orientada predominantemente para as sonoridades do jazz, um fusion com a potência do rock n’ roll e nuances do rock progressivo. Ou seja, uma sonoridade do rock que se fazia na Inglaterra por músicos italianos. “Blink” não teria, em tese, sob o aspecto sonoro da coisa, uma ligação com a Itália progressiva, mas, a meu ver, sim, traz a vivacidade do prog daquele país

Tinha o centro das atenções calcadas no saxofone, mas sem descuidar de uma ótima execução do baixo, de forma pungente e pulsante, bateria bem executada, com poucas músicas, claro, em inglês e um par de guitarras com riffs acalentadores, pegajosos que dão ritmo ao resto, com solos curtos e simples sim, porém soberbamente bem executados.

O Nova com “Blink” deixou, com isso, muito claro as suas intenções sonoras, um verdadeiro rolo compressor de jazz fusion, divididos com jazz rock e a vital participação de todos os instrumentos, sem protagonismos de poucos, com uma performance exemplar de todos os músicos.

Então a formação do Nova em “Blink” trazia Danilo Rustici na guitarra, Corrado Rustici nos vocais e guitarra, Elio D’Anna no saxofone e flauta, Luciano Milanese no baixo e Franco Lo Provite na bateria, além de Morris Perto na percussão.

O álbum é inaugurado com a faixa “Tailor Made” que apresentam dedilhadas bem dançantes de guitarra e rapidamente com um som completo, cheio, suntuoso, incluindo saxofone, bateria swingada e depois vocais. E vem com uma explosão da guitarra em solos diretos, mas incríveis, bem solares.

"Tailor Made"

"Something Inside Keeps You Down" traz um saxofone triste, melancólico, viajante, em alguns momentos, algo como um jazz prog mais experimental, quando entra o vocal, limpo, agudo, quase falado, com um violão acústico e uma flauta trazendo uma textura contemplativa, quando irrompe a bateria e o baixo e o saxofone mais enérgico dessa vez. Um som intenso, emocional e poderoso!

"Something Inside Keeps You Down"

A faixa título, “Nova”, dá sequência a uma sonoridade extremamente dançante com riffs de guitarra ao estilo soul music, música negra mesmo, quando se juntam a ela a bateria marcada e swingada e o saxofone enérgico e frenético em uma sonoridade complexa e cheia de vivacidade. A guitarra retorna em um solo mais pesado, com uma “veia” mais hard rock! Outra faixa cheia de recursos e viradas rítmicas.

“Used to Be Easy” começa leve, suave com a doçura de uma flauta doce, com o sax, no mesmo tom, ao fundo, com vocais discretos que, quando entra a bateria, se agita um pouco com baixo mais pulsante e um saxofone mais intenso e ocasionais solos de guitarra. O destaque fica para a bateria e o baixo, a “cozinha” se destaca em um grande “acabamento” sonoro.

"Used to be Easy"

Segue com “Toy” que aqui explode com os arranjos instrumentais em um número meio funkeado e dançante e um saxofone arrebentando em intensidade e energia. A guitarra a substitui com maestria, potente, com solos mais pesados, igualmente cheio de energia. Uma excelente faixa instrumental.

"Toy"

E se encerra com “Stroll On” e o destaque fica para a bateria que é simplesmente matadora, com vocais estrondosos e uma guitarra incrível com riffs e solos avassaladores. A guitarra vai e volta em solos enérgicos e descontraídos, com o saxofone envolvendo tudo isso em uma textura frenética.

"Stroll On"

Após o lançamento de “Blink” alguns integrantes saem da banda, deixando apenas Corrado Rustici, D’Anna e Renato Rosset com a missão de reformulá-la. E no mesmo ano, em 1976, o segundo trabalho de estúdio é lançado, se chamando “Vímana”. A proposta basicamente é a mesma do álbum de estreia, com o jazz rock imperando, mas perde um pouco do peso e da energia.

"Vimana" (1976)

Após o lançamento de “Vimana” o Nova se estabeleceu na Inglaterra para lançar o seu terceiro álbum, em 1977 chamado “Wings of Love”. A essa altura Barry Johnson, no baixo, e Ric Parnell, na bateria, já haviam se juntado à banda.

"Wings of Love" (1977)

Com esta formação, em 1978, a banda vai para os Estados Unidos em definitivo e grava o seu último álbum de estúdio chamado “Sun City” em uma vibe mais pesada com Corrado Rustici se firmando cada vez mais na guitarra e vocal, assumindo protagonismo na banda. Mas esse seria o derradeiro trabalho da banda que se desfez, certamente por conta do baixo retorno das vendas dos álbuns e do infortúnio comercial. Os integrantes originais que restaram, Elio D’Anna voltaria para a Itália para seguir sua carreira por lá e Corrado Rustici permaneceria nos Estados Unidos.

"Sun City" (1978)

Mas nada seria melhor que o registro inaugural dessa banda. “Blink” deixaria uma marca indelével na história do jazz rock com sua sonoridade enérgica, plena, poderosa, dançante e viva. Um elixir para a alma, para os ouvidos e para o coração de qualquer humilde apreciador do estilo e de todas as vertentes do híbrido rock n’ roll.


A banda:

Corrado Rustici nos vocais e guitarra

Danilo Rustici na guitarra

Elio D'Anna no saxofone e flauta

Luciano Milanese no baixo

Franco Lo Previte na bateria

Com:

Morris Pert na percussão

 

Faixas:

1- Tailor Made

2- Something Inside Keeps You Down

3- Nova

4- Used to Be Easy

5- Toy

6- Stroll On


Nova - "Blink" (1975)

 






 





















 




sábado, 11 de março de 2023

Witchcraft - Witchcraft (2004)

 

Não há dúvidas, pelo menos para mim, de que a cena stoner/doom que eclodiu no início dos anos 2000 é o que de melhor aconteceu no rock n’ roll desde os anos 1990 com o grunge na cidade de Seattle nos Estados Unidos. Lembrando que esta última teve grande visibilidade com o lançamento do álbum do Nirvana, “Nevermind”, em 1991 culminando com o seu fim comercial quando seu vocalista, Kurt Cobain, foi encontrado morto em 1994.

Já a cena stoner rock e doom metal, bem como também o psych rock, vem crescendo e se saturando de tanta banda que vem surgindo, ganhando vida, desde 2000 e que, mesmo sem tanta popularidade e entrada nas rádios e televisões de massa, vem divulgando, graças as redes sociais e o talento e fazendo turnês pelo mundo.

E a pelo menos 20 anos eu venho acompanhando, de perto, e com afinco e verdadeiro entusiasmo, a caminhada das bandas que vem ganhando notoriedade e credibilidade, bem como aquelas que ainda, de forma obstinada e persistente, segue seu caminho para buscar um lugar ao sol.

E entre essas bandas que vem ganhando algum sucesso, reconhecimento pela sua arte, pela sua discografia, não podemos negligenciar a alemã Kadavar, Radio Moscow, Wucan e tantas outras que levariam horas e dias, ou melhor, páginas e páginas dessa humilde resenha caso decidisse escrevê-las aqui. Algumas delas acompanhei shows, outras cada material novo lançado, mas nunca as perdi de vista.

Mas tem uma banda, em especial, que foi a grande responsável ou um das grandes responsáveis por ter me apresentado ou pelo menos me estimulado a conhecer esse mundo, esse universo vastíssimo e ainda, pasmem, inexplorado das bandas de stoner e doom metal que povoa o mundo de um rock n’ roll que homenageia o passado, mas que traz uma dose cavalar de contemporaneidade sonora extremamente arrojada e que vem, não poderia deixar de ser, da Suécia e se chama WITCHCRAFT.

Witchcraft

Ela me fez abrir os olhos para um mundo, para um universo que não se limitava, ouso dizer, às grandes e imaculadas bandas setentistas, pois era a nova e consistente safra do rock que corroborou o que sempre acreditei apesar de alguns equivocados críticos dizerem que o estilo morrera. Não! Não morreu, pode ter agonizado em alguns momentos, sofrido umas tocaias, mas sempre se mostrou inoxidável e essa cena foi e tem sido responsável por essa capacidade do rock se reinventar.

Hoje o Witchcraft goza de alguma popularidade, goza de alguma fama principalmente na Europa, participando de vários festivais, dos mais undergrounds aos mais mainstream mostrando que a banda, a cada álbum que lançou, reviu seus conceitos sonoros, flertou com algumas vertentes, mas sempre se mostrando relevantes e fortes a cada trabalho.

Mas hoje eu falarei dos primórdios, do passado do Witchcraft, quando a banda era apenas um projeto que denotava algo passageiro, com início, meio e fim, mas que dura mais de vinte anos. E vamos viajar no tempo com uma sonoridade declaradamente “vintage” e que procurou, com maestria, homenagear não apenas um estilo, uma vertente do rock, que teve o pilar nos longínquos anos 1970, mas uma banda que foi e é sinônimo de persistência e que ajudou, apesar de tudo, a construir a cena hard, a cena doom metal, o occult rock: falo do Pentagram.

Mas o que tem a ver o Witchcraft com o Pentagram? O que os une além do doom metal, do occult rock, do hard rock? Talvez os mais jovens ou aqueles que passaram a conhecer o Witchcraft nos seus trabalhos mais recentes, não se lembram da história que gira em torno do seu primeiro e singular álbum, homônimo, de 2004.

E nessa época o Witchcraft era uma banda totalmente “retrô” e o propósito dos seus integrantes à época era recriar o psych-hard dos anos 1970, de bandas cujas sonoridades eram revolucionárias e pouco ortodoxas já naquela época. E o responsável se chamava Magnus Pelander, vocalista, guitarrista e principal compositor do Witchcraft que a criou em 2000 na cidade de Örebro, com cerca de 120 mil habitantes e duas horas a oeste da capital sueca, Estocolmo.

Magnus Pelander

A intenção de Pelander era criar um projeto para homenagear o frontman do Pentagram, o grande Bobby Liebling e Roky Erickson icônico líder do 13th Floor Elevators. Para a empreitada ele chamou seu amigo John Hoyles, na guitarra e os irmãos Ola no baixo e Jens Henriksson na bateria. A banda estava pronta!

Bobby Liebling

Roky Erickson

O single “No Angel or Demon” com “You Bury Your Head” no lado B, já com o nome da banda de Witchcraft (feitiçaria em inglês), foi lançado pelo pequeno selo independente “Primitive Arts Records”, em 2002. Já com essas músicas a banda atingiu alguma visibilidade e ainda com a oferta de contrato do selo de Londres “Rise Above Records”, do líder da banda Napalm Death, Lee Dormian, Pelander ganhou um estímulo para continuar a compor outras músicas.

A banda deu uma hibernada e os demais músicos seguiram as suas vidas enquanto Pelander continuou a compor e compor de forma voraz e intensa. Até que finalmente em 2004 “Witchcraft” ganhou a luz, de uma forma tão original, tão “vintage”, tão autêntico. É evidente que Magnus Pelander, com as suas letras, queria trazer à tona, dos escombros do vilipêndio, o passado de bandas de hard psych dos anos 1970. Cabe aqui também uma curiosidade sobre a capa do álbum. A imagem da capa do álbum foi uma versão ligeiramente alterada da gravura “Merlin”, de Aubrey Beardsley, para a capa do livro "Le Morte d'Arthur" (1485), de Sir Thomas Malory.

Lembro-me que quando ouvi “Witchcraft” pela primeira vez e me deleitando de um passado que não vivi, de ter visto no Witchcraft bandas como Black Sabbath, Blue Oyster Cult, Coven e evidente o próprio Pentagram. Lembro-me também, apesar das redes sociais não serem tão atuantes em 2004, um feedback não muito agradável por parte dos especialistas de músicas e de alguns ouvintes e até hoje esse álbum não figura entre os melhores do estilo ou é pouco lembrado dizendo que é pouco original ou pior, uma cópia das bandas do passado.

Claro que os fãs do moderno doom metal e stoner rock torceram o nariz, talvez pelo simples fato de não estarem inteirados pela história desta vertente do rock e, sobretudo pela proposta e história da banda para com esse álbum, em especial. Ele vislumbra definitivamente a homenagear as bandas clássicas dos anos 1970.

Outro detalhe importante que convém lembrar no debut do Witchcraft e redução drástica da batida, acentuando os graves, enfatizando as guitarras solos cheia de riffs alucinados, lisérgicos e pesados com vocais entoando letras angustiadas e com fantasias macabras. Hoje nesta cena é praticamente impossível vermos bandas com essa proposta sonora. Lembremos que, dada as devidas proporções, o próprio Black Sabbath adotou essa vertente sonora em seu primeiro álbum não sendo tão pesado assim, com viés blueseiros e psicodélicos.

Então a formação do Witchcraft para o lançamento de seu primeiro álbum, de mesmo nome, em 2004 trazia nos vocais e guitarra Magnus Pelander, John Hoyles, na guitarra, agora com um novo baterista, Jonas Arnesén, no lugar de Jens Henriksson e seu irmão Mats Arnesén no baixo, no lugar de Ola Henriksson que também não seguiu na empreitada.

No álbum inaugural do Witchcraft traz a versão de "Please Don't Forget Me", música composta por Bobby Liebling, quando tinha 16 anos, na banda que é considerada como o “Pré-Pentagram”, chamada Stone Bunny, de um álbum, único, lançado em 1970 de nome “Nothing Left” e “Yes, I Do” que aparece na versão original do LP lançado no Japão, apenas.

Stone Bunny - "Nothing Left" (1970)

“Witchcraft” entrega basicamente arranjos soltos, quase jazzy, com riffs de guitarra maravilhosamente simples, porém muito efetivos e vocais dramáticos e sombrios que lembram os de Ozzy Osbourne no Black Sabbath. Uma sonoridade densa, de atmosfera densa, por vezes, pesado, lisérgicos, arrastado como um doom primitivo, dos primórdios evocando Sabbath, evocando Pentagram. Enfim, o primeiro álbum do Witchcraft engloba tudo o que havia de bom na cena proto doom e hard rock dos anos 1970: estruturas minimalistas, riffs carregados de reverberação, bateria descontraída, linhas de baixo intensas e vocais limpos e assustadores.

O álbum é inaugurado com a faixa título “Witchcraft” com uma bateria marcada e de poderosa batida com riffs de guitarra alucinantes e aterradores em uma atmosfera garageira, alternativa com uns vocais limpos e por vezes gritados, um tanto quanto meticulosamente abafados. Do peso fica mais arrastado e sombrio, com o vocal perigoso e uma bateria ao fundo com riffs ocasionais. Mudanças de ritmo mostram o quanto são grandiosos.

"Witchcraft"

Segue com “The Snake” um tanto quanto teatral que impõe a realidade de um proto doom, uma sonoridade arrastada, riffs pegajosos e pesados de guitarra, vocal mais despretensioso, que se revela arrogante e, por vezes, agressivo.

"The Snake"

E eis que surge o clássico obscuro do Stone Bunny “Please Don't Forget Me”, composto por Bobby Liebling, que segue fielmente como na versão original, revelando o peso e a psicodelia muito comum em um ano que foi tido como a fase de transição entre o psych rock e o hard rock. E assim se mostra a música: um voluptuoso hard psych cheio de vida e intensidade.

"Please Don't Forget Me"

“Lady Winter” é pesado e nos remete a outro projeto de Liebling chamado Bedemon, com uma sonoridade cadenciada, com a “cozinha” muito bem entrosada, com a bateria batendo forte e marcada e um baixo pulsante. O destaque também fica para o solo, simples, mas pleno de guitarra.

"Lady Winter"

“What I Am” segue basicamente a mesma proposta da faixa anterior: bateria pesada, riffs de guitarra trazendo uma textura sombria e indulgente, sendo corroborada pelo vocal perigoso e docemente louco de Pelander, com um baixo pesadão e muito vivaz.

"What I Am"

“Schyssta Logner” já bate com o pé na porta, riffs arrogantes e lisérgicos, poderosos e tocados muito alto, seguindo com a bateria na mesma levada, com alguma cadência sendo capitaneada pelo vocal mais rasgado.

"Schyssta Logner"

“No Angel or Demon”, que foi o primeiro single da banda e uma das mais antigas composta por Magnus Pelander realmente sintetiza a proposta “retrô” do Witchcraft e que traz o hard rock mais abrangente, sonoramente falando, com algo mais jazzy, mais bluesy também. Uma sonoridade mais bem elaborada.

"No Angel or Demon"

“I Want You to Know” abre com riffs mais pegajosos, mais pesados, a bateria segue em uma jornada que encorpa a sonoridade e que, em uma salutar disputa com a guitarra, faz da música mais plena e viva. Solos de guitarra preenchem espaços de forma simples e direta, mas efetivas.

"I Want You to Know"

“It's So Easy” começa particularmente solar, intensa, vivaz e plena e o destaque fica para o vocal que eleva toda essa condição, cantado de forma límpida e alta, com grande alcance, por vezes, gritado. Nessa faixa temos uma síntese fiel da influência de bandas como Pentagram e Bedemon.

"It's So Easy"

“You Bury Your Head” começa avassaladora com os pratos da bateria explodindo em intensidade e agressividade, irrompendo logo em algo mais cadenciado trazendo à tona o doom metal, sendo tocada de forma pegajosa e arrastada.

"You Bury Your Head"

E fecha com “Her Sisters They Were Weak” é maravilhosamente obscura, minismalista e arrisco dizer que traz alguns elementos progressivos, pois se torna contemplativa e com algumas mudanças de ritmo. É pesada, é densa, é sombria, é aterrorizante. Uma das grandes faixas do álbum e que o finaliza perfeitamente.

"Her Sisters They Were Weak"

Embora tenha sido lançada apenas no LP na versão japonesa, convém falar um pouco da faixa “Yes, I Do”, também de Bobby Liebling, que é extremamente pesada, com riffs ultrajantes e solos de guitarra curtos e grossos que torna a faixa pesada e intensa.

"Yes, I Do"

Reza a lenda que “Witchcraft” foi gravado em um porão. Se isso de fato aconteceu, tenho certeza que não foi por uma circunstância de uma eventual falta de dinheiro, de pouca verba. Não, não foi. Certamente foi para manter a aura que o álbum entrega e ao ouvi-lo é notório que era como se o mesmo tivesse sido gravado há quase cinquenta anos atrás, afinal essa era a vibe, essa era a intenção, afinal trata-se de uma homenagem às bandas esquecidas, muitas delas, que compunham a cena occult rock nos primórdios dos anos 1970.

“Witchcraft” traz instrumentos tocados de forma nebulosa, está além das superproduções e gravações com mega estrutura tecnológica que já tinha à disposição de muitas bandas no início dos anos 2000. A bateria soando distante e oca, as guitarras difusas e arrastadas, o baixo, por vezes pulsante, é discreto e sombrio. “”Witchcraft” parece surgido de uma época distante e antiga, de tempos perdidos e esquecidos, empoeirados.

Quase vinte depois de seu lançamento o Witchcraft lançaria outros álbuns, mas sem o “charme” de seu debut, mas não me entendam mal, caros leitores, a banda foi encorpando, trafegando por outros estilos, do hard rock ao heavy metal, mas vejo como evidente esse aperfeiçoamento sonoro nos lançamentos posteriores, mostrando que a banda não pararia no tempo se revelando madura, grandiosa.

Nada será como antes e ver uma banda como o Witchcraft, em plenos anos 2000, voltar em um tempo esquecido e até desprezado por alguns “conservadores” do rock n’ roll, e gravar um álbum que homenageia bandas do naipe de Black Sabbath, Coven, Pentagram, Bedemon e tantas outras do estilo, é levar ao jovem e, as vezes, perdido fã de rock uma fatia essencial da história desse estilo que parece que fazem questão de enterrar. Músicas essas que foram também produzidas por músicos jovens mostrando que o discurso funesto de algumas figuras destrutivas que trafegam no universo do rock, que insistem em dizer que o rock morreu. Não morreu para o Witchcraft.


A banda:

Magnus Pelander nos vocais e guitarra

John Hoyles na guitarra

Jonas Arnesén na bateria

Mats Arnesén no baixo

Ola Henriksson baixo (Em “No Angel or Demon”)

 

Faixas:

1 - Witchcraft           

2 - The Snake         

3 - Please Don't Forget Me

4 - Lady Winter       

5 - What I Am          

6 - Schyssta lögner

7 - No Angel or Demon     

8 - I Want You to Know     

9 - It's So Easy        

10 - You Bury Your Head 

11 - Her Sisters They Were Weak


"Witchcraft" (2004)

Audição do álbum pela "Last.fim" aqui