Eu não preciso dizer que este
reles e humilde blog dedica-se a dar luz ao rock obscuro, o nome já denuncia
isso. Trazer à tona as bandas obscuras e raras é o mote desse site. A banda que
falarei hoje empunhará a temática de forma eloquente, porém parte dos músicos
que a conceberam gozaram de notório sucesso em suas carreiras.
Para muitos os dois músicos
que apresentarei criaram essa banda com o intuito de buscar novos mercados que
não fosse do habitual Jazz-Rock Fusion que faziam parte e eram qualificados.
Falo de John Lee e Gerry Brown, falo também da banda norte americana MEDUSA.
Antes de falar um pouco da banda, torna-se relevante falar das mentes por
detrás do projeto “Medusa”, principalmente dos seus currículos invejáveis.
Gerald D. Brown, conhecido
como “Gerry Brown”, nascido na Filadélfia, Pensilvânia, é um baterista renomado
de jazz e já tocou com os baixistas Stanley Clarke e, claro, John Lee. Foi
membro da banda do exímio pianista, também de jazz, Chick Corea e esteve na
banda Return to Forever, banda esta que Corea também esteve.
Brown trabalhou também com Phil
Collins, Julee Cruise, Roberta Flack e Marvin Gaye, além de ter sido baterista
de turnê de Steve Wonde por muitos anos. Ele também trabalhou na Alemanha.
John Gregory Lee, conhecido
como “John Lee”, nascido em Roxbury, Massachusetts, é um baixista, engenheiro e
produtor de jazz. Fundou a “Jazz Legacy Productions” e a “Alleycat Studios”,
com sede em West Orange, Nova Jersey.
Lee se apresentou em Nova
Iorque no início dos anos 1970, com Joe Henderson Pharoah Sanders e o Max Roach
Quartet, antes de se mudar para a Europa em 1972, onde conheceria Gerry Brown.
Foi a partir desse momento que o elo artístico de Lee e Brown aconteceria. Os dois começaram a trabalhar juntos na banda de fusion do flautista holandês Chris Hinze, “The Chris Hinze Combination”. E, em 1974 lançariam o seu álbum de estreia, chamado “Infinite Jones".
Em 1975, John Lee juntou-se ao
Eleventh House de Larry Coryell, permanecendo até 1977, e foi ouvido em
"Motherland" de Earl & Carl Grubbs, "Hip Elegy" de
Joachim Kuhn, "Esoteric Funk" de Hubert Eaves, "New Love"
de Carlos Garnett, "However" de Jasper Van't Hof, "Poussez!
Leave That Boy Alone" e "Symphony Sessions" de Dizzy Gillespie.
Lee foi baixista de Dizzy
Gillespie de 1984 a 1993. Ele se apresentou e gravou no Dizzy Gillespie
Quintet, Dizzy Gillespie Big Band, Dizzy's United Nation Orchestra, Dizzy
Gillespie All-Stars, Dizzy Gillespie All-Star Big Band e Dizzy Gillespie
Afro-Cuban Experience.
Lee também trabalhou nas
bandas de Gary Bartz, Jon Faddis, Aretha Franklin, Roberta Gambarini, Roy
Hargrove, Jimmy Heath, Gregory Hines, Claudio Roditi, Sonny Rollins e McCoy
Tyner.
Depois do debut, de 1974, “Infinite
Jones”, a parceria de Gerry Brown e John Lee, continuou forte e frutífera com
mais lançamentos como “Sunrise”, de 1975, “Still Can’t Say”, de 1976, “Chaser”,
de 1979, “Fancy Glance”, de 1979, com a participação de Stu Goldberg, um
pianista americano de jazz, entre outros trabalhos.
Entre esses álbuns que Lee e
Brown lançaram nos anos 1970, surgiu aquele que falarei, “Medusa”, de 1978. Esse
trabalho foi introduzido ao mercado com a nítida tentativa de buscar um público
mais diversificado, tendendo para o AOR. Neste álbum vislumbra-se uma pegada
mais para o rock, diria o hard rock, soul music e até mesmo para o funk. Uma
miscelânea sonora pouco improvável, mas que surtiu um efeito bem interessante e
até mesmo arrojado. Eles se reuniram em Nova Iorque após assinar contrato com a
Columbia Records (Zembu Records) e começaram a gravar.
Arrojado e talvez, para muitos
conservadores, como algo delirante, pois nota-se que John Lee e Gerry Brown
queria criar um nicho dentro de uma concepção, de um conceito comercial, de uma
música diversificada, plural, que pudesse contemplar vários públicos. É notável
a musicalidade em “Medusa” e o risco também. O álbum foi produzido por John e
Gerry com a ajuda de Skip Drinkwater para a Zembu Records, subsidiária da
Columbia.
A formação da banda, quando
gravou e lançou “Medusa” trazia, além de Gerry Brown na bateria e percussão e
John Lee no baixo, Eric Tagg nos vocais, Charyl Alexander também nos vocais,
Jim Mahoney na guitarra, James Batton nos vocais e teclados, Darryl Thompson,
na guitarra elétrica e acústica. Contou com algumas participações como David
Sancious no órgão e sintetizador, Bobby Malach, no saxofone e Peter Robinson no
ARP Odyssey on.
O álbum é inaugurado com a
faixa “Soul Free” que proporciona logo ao ouvinte o peso da bateria, o hard
rock mais refinado, mas com uma pegada AOR, soando radiofônico, pop. Traz o
“classic rock”, o sinfônico personificado nos teclados tocados freneticamente,
repleto de energia. Um misto de musicalidade fina, mas acessível. Solos de
guitarra animados, solares corroboram a sua condição, dando-lhe o peso
identificado. Já começa intenso e animado.
Segue com “Heartburn” que chuta a porta com um riff pegajoso, típico do hard rock dos anos 1970! A diversidade da faixa anterior não se encontra em “Heartburn”, que, de forma avassaladora, abre as cortinas do velho e bom hard rock. Os riffs são elegantes e atraentes e nos faz bater a cabeça, mas dançar também. Os vocais, para seguir a proposta, vem rasgado, quase gritado. Solos de guitarra são bem elaborados e põe a música em seu lugar: pesada!
"Second-Hand Brain" traz
de volta o arrojo de seus músicos tentando diversificar e mesclar os sons. E
consegue com êxito! Aqui se percebe, com nitidez, o heavy rock com uma dosagem
bem temperada de R&B. Nota-se a produção excelente, a qualidade das
melodias. É dançante, é pesado, os teclados são arrebatadores, enérgicos, os
solos de guitarra, embora simples e diretos, são solares e conduz o formato
animado e diversificado dessa faixa.
"Our Love Is Surely Gospel" começa com uma pegada mais voltada para o progressivo sinfônico,
mesclado com um balanço, extremamente dançante e um vocal límpido e bem
executado. Há um toque de exaltação nessa música que talvez se confirme o
“Gospel” no nome da faixa. É cheia de luz e vida. Os instrumentos de sopro
entram discretamente, como o saxofone, e deixa tudo mais rico e diversificado
sonoramente falando.
A faixa título chega, “Medusa”,
com riffs poderosos de guitarra, que a torna pesada e que me remete a um
Southern Rock com uma pitada bem generosa de R&B e soul music. Se tornou
inevitável lembrar de Trapeze no auge, com Glenn Hughes. Aqui não se
enquadraria em uma faixa que tende para o AOR, uma música comercial. Ela é
ousada e pouco compreendida para um público menos exigente.
"Hit And Run Lover" começa
animada e linda com doses cavalares de piano e riffs de guitarra. O hard rock,
com uma pegada mais radiofônica, se mostra aqui novamente. O vocal, com um viés
mais R&B se faz presente também. Esse é um risco adorável que a banda
assumiu fazer. Um cantor de R&B cantando hard rock. E falando no hard rock,
o solo de guitarra chega e vem poderoso, trazendo, ainda mais, textura de um
hard rock mais comercial.
"You Leave Me
Hangin'" tira um pouco o pé do freio e entrega um pouco de jazz rock
calcado no piano e na “cozinha” rítmica simples, mas trazendo uma camada bem
forrada de balanço no formato balada rock. O vocal retorna aqui com uma
limpidez incrível, límpido, delicado, sem exageros, mas eloquente pela sua
beleza, juntamente com um backing vocal que nos remete a música negra. Fecha
lindamente com solos de guitarra e saxofones viajantes.
E termina o álbum com "Mr.
C.T." que traz de volta o hard rock que logo se inicia com solos de
guitarra e bateria marcada e pesada. Um hard rock instrumental com belíssimos
solos de guitarra, com passagens sinfônicas do teclado que dá o tom de prog
rock em discretos momentos.
Infelizmente a Columbia
Records assinou com a banda com base no valoroso histórico de jazz fusion de
Gerry Brown e John Lee, as mentes por detrás do Medusa. Mas, como podemos ouvir
em “Medusa” o material é extremamente diversificado e arrojado em sua
sonoridade, mais orientada para o rock clássico, para o hard rock e nuances de
soul music, R&B e até mesmo para o funk com pegadas bem dançantes e
pesadas. Essa era a atenção evidente de Brown e Lee, que decidiram sair um
pouco de seus trabalhos voltados para o jazz fusion.
Só não se sabe exatamente se
esse projeto foi delineado, de forma detalhada, com os executivos da Columbia. Se
não o fez, certamente não agradou muito a gravadora que não fez um trabalho de
difusão do projeto, muito ajudado também pela banda que não decidiu promovê-lo
por intermédio de apresentações.
Então não era de se esperar de
que o álbum tenha passado despercebido entre o mercado da música, entre os fãs,
caindo na mais total obscuridade, ficando esquecido, nas poeiras do rock, até
ser redescoberto, muito graças a reputação de Lee e Brown, na cena jazz fusion,
e por conta das redes sociais, da internet.
A dupla Gerry Brown e John Lee
retornaria, no ano seguinte, mais precisamente em 1979 para gravar o álbum
“Chaser” que, de alguma forma continuou com a pegada jazz fusion, crossover, funk
e soul e hard rock, tanto que contou, inclusive, com alguns músicos do Medusa.
“Medusa” foi lançado
inicialmente pela Columbia Records, no Canadá, onde se criou uma confusão da
banda ser daquele país, sendo, claro, concebida nos Estados Unidos, onde o
álbum foi lançado no mesmo ano de 1978. A CBS lançaria o álbum também pela
Europa, por alguns países de lá, em 1979 e o relançando, também em 1979, pelos
Estados Unidos, pela Columbia Records.
O único álbum do Medusa pode
não ter tido o reconhecimento do público, pode ter sido considerado esquisito,
estranho, com a sua diversidade sonora pouco ortodoxa, mas é exatamente por
conta desse arrojo, trouxe um projeto audacioso e solar. Um clássico obscuro e
improvável!
A banda:
Eric Tagg - vocal
Charyl Alexander - vocal
Jim Mahoney - guitarra
James Batton – teclados e
vocal
Darryl Thompson – guitarra acústica
e elétrica
John Lee – baixo
Gerry Brown – bateria
Com:
David Sancious - sintetizadores
(1,3,4,5,7,8), órgão (1,6)
Bobby Malach – Tenor Saxofone
(4)
Peter Robinson - ARP Odyssey
on (8)
Eef Albers – Guitarra acústica
e elétrica
Faixas:
1 - Soul Free
2 - Heartburn
3 - Second-Hand Brain
4 - Our Love Is Surely Gospel
5 - Medusa
6 - Hit And Run Lover
7 - You Leave Me Hangin'
8 - Mr. C.T.