sábado, 29 de agosto de 2020

L'Impero delle Ombre - L'Impero delle Ombre (2004)


Uma coisa pode puxar a outra e de forma contínua e frenética, dependendo do que se propõe a buscar ou enveredar as suas intenções. Sou um grande apreciador da banda inglesa Black Widow, formada na cidade de Leicester, na Inglaterra no final da década de 1960, inclusive fiz um texto interessante sobre a mesma sobre o seu show de 1970 que pode ser lido aqui: Black Widow - Demons of The Night Gather To See Black Widow (1970). E, como tenho um ávido interesse pelo contexto histórico das bandas que gosto decidi procurar mais e mais sobre a banda e confesso que sou compulsivo pelas histórias das bandas e que tem uma relação íntima com as músicas que compõe. E quando fazia meus garimpos avistei um link na grande rede que falava de uma banda italiana que tinha, entre outras, uma influência do grande Black Widow. Resolvi, pensando que fosse algo relacionado a banda inglesa, conferir e percebi, logo de cara, não se tratar da mesma, mas sim de uma banda chamada L'Impero delle Ombre, formada em meados dos anos 1990, mais precisamente em 1995, na região de Gallipoli, na famosa cidade de Apúlia, conhecida por produzir grandes vinhos. Já me interessei de forma imediata, principalmente com a capa do seu primeiro álbum lançado em 2004, autointitulado. Uma linda arte gráfica que, como um headbanger convicto que sempre fui me impactou de cara. Não é à toa que a capa é a porta de entrada para os álbuns, embora não seja uma unanimidade.


Realmente o L'Impero delle Ombre tem uma relação muito forte, sobretudo na questão sonora e estética, com o Black Widow, pois, quando a banda foi formada seu palco era repleto de cruzes e apelo estético voltado para os filmes de terror, com apresentações teatrais e rituais, como o início, nos primórdios dos anos 1970, pela banda inglesa. Mas não se engane que as influências da banda está restrito ao Black Widow, o que, se fosse, seria o máximo, mas traz também referências a bandas como Goblin, Jacula, Black Sabbath, Angel Witch, Paul Chain Violet Theatre e Death SS. Seu primeiro álbum é muito eclético e flerta com estilos que vai do heavy rock, heavy metal, hard rock oriundo dos anos 1970, a estilos um pouco mais “recentes”, da década de 1980, como doom metal, metal progressivo e algumas pitadas sombrias de rock experimental mesclado ao psicodélico com occult rock que me trouxe à tona bandas como Coven e Comus.


Mas antes de falar do álbum “L’Impero delle Ombre”, falemos um pouco sobre as origens “ocultas” da banda. L’Impero delle Ombre foi um projeto concebido por Giovanni “John Goldfinch” Cardellino e era, na sua gênese, uma banda cover que basicamente tocava músicas de suas maiores influências como Black Widow, Death SS, Angel Witch e Black Sabbath, além de algumas bandas clássicas italianas do gênero. Esta formação não vingou, não teve uma sequência de sucesso, afinal era uma banda cover e, como grande músico que é, Giovanni Cardellino tinha a necessidade de fazer músicas autorais e mostrar ao mundo a sua percepção de música. Então convoca o seu irmão, o guitarrista Andrea Cardellino que, na primeira formação do L’Impero dele Ombre, era muito jovem para tocar, se apresentar em pubs e clubes de música. Esse hiato da banda fora decisivo para Giovanni colocar em prática o seu trabalho autoral e colocar o L’Impero delle Ombre em um patamar mais importante para a história da cena rock da Itália que estava em voga na década de 1990, principalmente entre a cena progressiva, mas que acabava por “puxar” outros estilos. Os irmãos Giovanni, no vocal e percussão e Andrea na guitarra e seguido pelos os outros irmãos Dario e Enrico Caroli, que tocaram no Sabotage, e respectivamente na bateria e no baixo fecharia a formação da banda que gravaria o debut “L’Impero dele Ombre” ou “Empire of Shadows”, em inglês pelo emblemático selo “Black Widow Records”, em 2004, dez anos depois de sua formação.

L'Impero delle Ombre

Um exemplo de persistência, mesclado a dificuldades de que essas bandas, com essa proposta sonora e estética sofrem, alheio ao perfeccionismo de Giovanni e seus colegas tiveram ao longo desses anos todos, com a participação de Bud Ancillotti, no vocal da música “Il Giardino dei Morti” e o tecladista Sandro Massa. O álbum foi lançado em 2003 e teve alguma repercussão entre os críticos especializados e o público, principalmente aqueles mais atraídos pelo estilo dark rock e doom metal, com texturas de hard rock setentista e umas pegadas experimentais e progressivas da banda e que estava, de forma mesclada, mas bem conectada, as peças muito bem montadas retratada na música deste debut da banda, afinal já eram músicos maduros e experientes e gozavam de muito talento. Mas a banda decidiu intitular o seu som como “Rock de Cemitério”, muito impulsionado também pelo aspecto estético de seus músicos, da produção de palco e as suas apresentações teatrais. Diante do resultado surpreendentemente positivo a gravadora sugere que a banda grave o seu segundo álbum, surgindo, em 2011, o “I Compagni di Baal”, baseados em uma série de televisão francesa da década de 1960 divididas entre sete episódios de 50 minutos cada, em preto e branco, feitos por Pierre Prévert, sendo transmitidos de 29 de julho à 9 de setembro de 1968.  Era feito com poucos recursos e diria ingenuidade, mas com bom gosto e mensagens extremamente atemporais, pois vinha com muita crítica social e comportamental. Muito dessa história e do demônio “Baal” foi responsável pela concepção sonora, estética e artística da banda no seu início, mesmo sendo concretizada somente com o lançamento do segundo trabalho em 2011, com uma obra conceitual sobre a série. Após vários shows para divulgar o seu primeiro álbum, os membros do L’Impero dele Ombre se envolveram em outros projetos como Witchfield e Homo Herectus em 2008, mas nada se revelou tão sublime como o trabalho do “l’Impero dele Ombre”.

Les Compagnons de Baal (1968)

O álbum começa com “Il canto del Cigno” que, com uma camada soturna e ameaçadora de um órgão e piano abre as portas do inferno para a excelente “Condanna” que, cantado em italiano, que começa introspectivo, praticamente ao som do vocal abafado e melancólico, mas que irrompe com um riff tipicamente sujo e arrastado, típico do doom metal, com uma proposta mais retrô, dos anos 1970, mas que logo fica veloz e avassalador com um heavy metal que lembra Mercyful Fate e Angel Witch e assim vai cadenciando entre hard e heavy lindamente.

L'Impero delle Ombre - "Il Canto del Cigno"


L'Impero delle Ombre - "Condanna"

“Rituale” chega com o vocal dissonante e um riff de guitarra pesado, com um trabalho poderoso da “cozinha” instrumental, com baixo agressivo e pulsante e bateria marcada, com uma camada sombria e perigosa de teclado.

L'Impero delle Ombre - "Rituale"

“Tormento ed Estasi (Di anime inquiete attratte dal nero)” é um exemplo primoroso de um dark progressive, com passagens generosas de metal e hard rock, que lembra Goblin e Antonius Rex em seus novos tempos. O solo de guitarra que inaugura a música te faz viajar e entrega peso a faixa, eficiente e direto, mas trazendo personalidade a essa faixa com destaque instrumental, uma das melhores do álbum.

L'Impero delle Ombre - "Tormento ed Estasi (Di anime inquiete attratte dal nero)"

“Nel Giardino (Intro)” tem um curto momento falado, ao estilo Jacula, tenso e ameaçador que entrega o peso e a agressividade a “Il Giardino dei Morti” com riffs calcados no heavy rock, de bandas clássicas do heavy metal britânico com destaque também para o vocal tenebroso, limpo de dom alcance e um órgão que confere a faixa um clima sombrio.

L'Impero delle Ombre - "Nel Giardino (intro) e Il Giardino dei Morti"

E eis que surge a obra-prima “Ghost”! Um som abafado, com alguns discretos dedilhados de guitarra, explode em um riff ao estilo Black Sabbath alto, imperioso, pesado com a bateria igualmente pesada e marcada, um típico metal progressivo, com a pegada “dark” já tão característica do álbum. Não podemos negligenciar os solos de guitarra sempre limpos e altivos.

L'Impero delle Ombre - "Ghost"

E fecha com “Corpus, Animae et Spiritus” e o órgão volta a toda prova, remetendo bandas como Jacula e Black Widow, uma ode ao dark progressive, uma reverência ao passado com uma proposta contemporânea.

 
L'Impero delle Ombre - "Corpus, Animae et Spiritus"

O frescor dos novos tempos ganha luz com o L’Impero delle Ombre, com o reflexo da escuridão. Uma sonoridade funesta, com sinos, cantos, teclados, define bem essa banda que definitivamente veio para ficar e figurar como o novo clássico obscuro da Itália, trazendo a tona, em uma espécie de reverência e homenagem, as grandes bandas pioneiras do estilo, mas entregando os novos ares da contemporaneidade.



A banda:

Giovanni "John Goldfinch" Goldfinch no vocal e percussão
Andrea Cardellino na guitarra
Dario Caroli na bateria
Enrico Caroli no baixo

Com:

Sandro Massa nos teclados
Bud Ancillotti, no vocal da música “Il Giardino dei Morti”

Faixas:

1 - Il Canto del Cigno
2 - Condanna
3 - Rituale
4 - Tormento ed Estasi (Di Anime Inquiete Attratte dal Nero)
5 - Nel Giardino (Intro)
6 - Il Giardino dei Morti
7 - Ghost
8 - Corpus, Animae et Spiritus