A psicodelia fervia na costa
californiana em meados para o fim dos anos 1960. Bandas como Jefferson
Airplane, Quicksilver Messenger Service e tantas outras ditavam as regras
sonoras e culturais daquela região e de todos os cantos dos Estados Unidos. Era
a voz do rock n’ roll, que vibrava com o experimentalismo e as viagens
lisérgicas, com guitarras ácidas, o som, por vezes, dançantes. Era o “flower
power”, era a cultura do “paz e amor” e contra a guerra do Vietnã e outros
dogmas sociais.
Não podemos negligenciar
também que dentro dessa cena que, para muitos pairou na controvérsia em todos
os aspectos, que variam da própria música, como no comportamento, haviam bandas
que ousaram trazendo sonoridades arrojadas e diferentes que, por consequência,
flertaram com a marginalidade, caindo no ostracismo.
Temas sombrios, de sonoridades
pesadas e densas, tingiam de uma realidade nua e crua os escombros de uma
sociedade pseudo conservadora e tornando-a palpável na sua música, tendo como
exemplo clássico, bandas como Black Sabbath, The Stooges, Alice Cooper, que tinha
um som cru, seco, poderoso, pesado e letras horripilantes, paranormais e
ocultas.
Por outro lado, bandas
assumiram outras vertentes mais ousadias, flertando, não só apenas com o som
que dominava a costa da Califórnia na segunda metade dos anos 1960, mas também
absorveu outros estilos que estavam em voga já nos anos 1970, sobretudo no início
daquela década, como o hard rock e o rock progressivo. Posso, caros e estimados
leitores, citar uma banda que diria ser seminal: A EUPHONIOUS WAIL.
Claro que poucos conhecem
diante do arsenal de bandas clássicas existentes na transição das décadas de
1960 e 1970, mas esta banda que apresento trazia alguns atrativos que realmente
são dignos de atenção, no mínimo. A banda é produto de seus primórdios e do
período que produziu seu único álbum, de 1973, autointitulado.
Mas antes de falar do seu único trabalho lançado, falemos um pouco sobre a banda. O A Euphonious Wail surgiu em Santa Rosa, na costa da Califórnia, no ano de 1968. O nome da banda veio da inspiração da música “The Euphonious Whale”, de Dan Hicks. Durante os cinco anos que separaram o seu surgimento e o lançamento oficial de seu álbum, a banda se apresentou localmente abrindo para bandas como Iron Butterfly e Steppenwolf.
As apresentações da banda eram animadas e por vezes explosivas e a sua sonoridade pouco deslocada do que se fazia à época parece ter sido um dos motivos pelo qual alguns selos não tenham contratado o A Euphonious Wail para a gravação de seu primeiro álbum. Mas haviam algumas gravadoras que assumiam o “risco” e traziam à tona essas bandas, digamos, arrojadas.
E foi assim que a Kapp
Records, graças à essas apresentações, decidiu levar o A Euphonious Wail para o
estúdio para gravar “A Euphonious Wail”, em 1973. A banda era composta por Doug
Hoffman (bateria), Bart Libby (teclados), Suzanne Rey (vocais), Steve Tracy
(guitarra, vocais) e Gary Violetti (baixo).
Alguns críticos classificam a música do A Euphonious Wail como hard prog e não deixa de ser uma realidade, pois, como disse, a banda flertou com várias vertentes do rock que estavam em voga e também fora de moda, como o hard rock, profundamente evidenciado pelo som da guitarra Steve Tracy, bem como o rock psicodélico, graças a sua origem, além do próprio rock progressivo e até mesmo nuances de soul music garantidos pelo vocal feminino de Suzanne Rey.
O fato é que a banda era
difícil de se rotular e o seu álbum corrobora essa condição, trazendo um
caldeirão de um alimento sonoro com várias camadas e temperos. Bom amigo leitor
se gostas de bandas versáteis e pouco estereotipadas, aposte em A Euphonious
Wail e seu único trabalho, de 1973.
O álbum foi co-produzido e
projetado no MCA Recording Studios por Brian Ingoldsby, que trabalhou com Joe
Cocker, Jimmy Web, Biff Rose, Linda Perhacs, Fanny Adams, Elton John entre
outros. O enigmático desenho da capa do álbum foi feito por Michael Hawes e
dependendo de como você olha para ele, se vê algo completamente abstrato ou até
mesmo obsceno. O fato é que essa arte um tanto quanto surrealista traz certo
apetite para a audição deste belo álbum.
O álbum é inaugurado com a
faixa “Pony” que tem uma incrível introdução de baixo bem dançante ao estilo
soul e dessa forma a música vai se desenvolvendo, com essa pegada, mas traz
também algo de psych e hard rock, com a predominância do órgão, dos teclados e
de riffs pesados de guitarra. O final é pesado, o “duelo” entre guitarra e
teclado é espetacular! Psych, rock e soul na medida certa e com uma dose bem
inusitada e ousada.
Segue com “We've Got the
Chance” continua na pegada mais soul music com “pitadas” mais rock!
Definitivamente a guitarra traz o lado rock às músicas. As teclas, mais
discretas, não negligenciam, ainda assim, o seu protagonismo. Aqui domina o
vocal feminino de Suzanne Rey que se mostra alto e vívido. A música vai
ganhando “corpo”, tendendo, cada vez para o hard rock, os solos de guitarra são
de tirar o fôlego e corrobora o seu lado mais pesado.
“Did You Ever” tira o pé do
acelerador e mostra a primeira balada do álbum. A bateria cadenciada e lenta
traz lembranças de jazz melancólico e introspectivo, os teclados lembram um
psych, o vocal masculino é límpido e transparente. O solo de piano é
simplesmente espetacular e te alça a voos altos e contemplativos.
Na sequência tem “When I Start
to Live” que é introduzida com um órgão em camadas introspectivas e
psicodélicas e assim continua até irromper em uma sonoridade mais solar e
animada, agitada, com alguma velocidade. Bateria pesada e cadenciada e baixo
mais pulsante mostra uma “cozinha” rítmica coesa e cheia de talento. Guitarra
ácida e pesada revela, claro, o lado pesado da faixa.
“F#” entrega o lado mais
raivoso do álbum! Aqui o hard rock reina absoluto! Bateria pesada, baixo
distorcendo, riffs pegajosos de guitarra que desagua em solos pesados e
agressivos, sem contar com os vocais que seguem a “proposta” da música, sendo
gritados e altos. Espetacular!
“Chicken” dá sequência a
porrada sonora da faixa anterior e aqui o baixo protagoniza sempre pulsante e
galopante, cheio de groove, com pancadaria agressiva e pesada da bateria,
teclados energéticos e riffs e solos de guitarra de tirar o fôlego. Nessa faixa
a performance instrumental é exuberante até o vocal de Suzanne entrar, trazendo
mais balanço à faixa.
“Night Out” continua na mesma
vibe das músicas anteriores: pesada, animada, dançante, mas com uma
característica mais radiofônica. Percebe-se, nessa faixa, uma pegada mais
acessível, mas não menos interessante que as demais. O destaque fica para os
riffs e solos mais diretos de guitarra!
“Love My Brother” é mais
cadenciada e calcada em uma levada mais soul rock. É contagiante a música,
dançante e solar. A seção rítmica ganha destaque e o peso da guitarra traz o
lado “encorpado” da música. Baixo cheio de groove, teclados ao estilo Deep
Purple. Música cheia de recursos e muito, muito versátil, mostrando a
capacidade instrumental de seus músicos.
E fecha com “I Want to be a
Star” que retorna à calmaria da balada e a voz límpida e transparente de
Suzanne Rey conduz a faixa para a beleza sonora que se revela. Dedilhados e
solos de guitarra faz da música uma “gangorra” sonora, com várias mudanças
rítmicas. Na metade da faixa o peso ganha evidência até finalizar
brilhantemente.
O único do A Euphonious Wail,
que teve uma visualização mínima na carreira, quando a banda encerrou as
atividades, logo após o lançamento de seu único álbum autointitulado, foi o
tecladista Bart Libby que tocou no EP da banda britânica “Terraplane”, de nome
“Arrives”, de 1981. Aparece também nos créditos do álbum de Francis Anfuso,
“Who Will Tell Them?”, de 1986.
“A Euphonious Wail” teve
alguns relançamentos, depois de seu oficial, ocorrido em 1973. O primeiro
relançamento foi na Austrália, em 1994, pelo selo W.O.T.S.V Ltda, no formato
CD. O segundo, pelo selo Media Arte, em 2012, por toda a Europa, também no formato
CD e o último, até onde posso saber, aconteceu em 2013, no Japão, pelo selo
Vivid Sound Corporation.
A banda:
Suzanne Rey nos vocais
Bart Libby nos teclados
Steve Tracy na guitarra e
vocal
Gary Violetti no baixo e vocal
Doug Huffman na bateria e
vocal
Faixas:
1 - Pony
2 - We've Got the Chance
3 - Did You Ever
4 - When I Start to Live
5 - F#
6 - Chicken
7 - Night Out
8 - Love my Brother
9 - I Want to be a Star