sexta-feira, 1 de maio de 2020

The Can - Monster Movie (1969)


O CAN se notabilizou e atingiu algum êxito comercial enquanto banda com o vocalista japonês Damo Suzuki e admito aos amigos que leem essas linhas que trabalhos posteriores desta seminal banda representante e pioneira do bom e velho krautrock são ótimos! 

O que dizer de “Tago Mago”, de 1971? E dos grandes álbuns “Ege Bamyasi” e “Future Days”, respectivamente lançados nos anos 1972 e 1973? Pois é, a fase áurea precisa ser enaltecida e reconhecida como a pedra fundamental da música experimental e progressiva da Alemanha, mas não podemos negligenciar o seu início, não podemos esquecer a fase inaugural dessa importante banda da cena krautrock, iminente movimento contracultural da Alemanha e que sintetizou uma revolução sonora e comportamental da juventude inquieta e descontente com o status quo daquele país. 

Can

E o Damo foi importante nesse momento importante do Can ou The Can, como era conhecido nos seus primórdios. Um japonês, que fez algum sucesso na Alemanha e que cantava em inglês. E foi nessa “babilônia” que ele, como um cometa, uma força da natureza, mexeu com as estruturas da banda germânica que foi formada em 1968 na cidade de Colônia.

Damo Suzuki

Mas quero falar do debut do Can, quero falar da gênese dessa banda que foi um símbolo de uma cena que foi o alicerce do rock n’ roll alemão, chamado “The Monster Movie”, de 1969. E por que falar de um álbum menos conhecido, menos “badalado” do Can? 

Pela sua representatividade histórica, pela sua importância, até hoje, para a música. Sempre quando o ouço ele me parece tão jovem, tão atemporal. Um som minimalista, mas que revela a expressão mais genuína e primordial de uma música que não envelhece e que dita “moda”, mesmo que os progenitores da moda não saibam ou fazem que não sabem de nada, afinal, para quem acha a música do Radiohead vanguardista, ouçam “Monster Movie” do Can e logo se aperceberão que estão redondamente equivocados. 

The Can em 1968

Falo do debut do The Can, que, como mencionado, usava o “The” antes do Can, pois o considero, juntamente com o outro seminal disco da cena chamado “Phallus Dei”, do Amon Duul II, lançado no mesmo ano, como um dos pilares do krautrock.

“The Monster Movie” configurou uma verdadeira revolução sonora que não se via na Alemanha pós-guerra há muito tempo. Dos escombros das grandes guerras surgiu uma música anarquista, crua, mudanças drásticas de paradigma passou a ser vista e ouvida nas ruas alemãs contra um status quo calcado em comportamentos conservadores, com uma cultura pop alienante com músicas que não retratavam os anseios de uma juventude ávida por mudanças sociais, políticas e econômicas, que lutava por um lugar ao sol. 

Eram tempos difíceis. Mas por outro lado, “Monster Movie” não se enquadrava em nenhum estilo, não dava a entender um segmento sonoro, eram tempos embrionários, de transições, de novas percepções sonoras. 

Os garotos do The Can estavam preocupados em personificar em sua música os seus instintos subversivos e não se enganem que eles estavam preocupados em mostrar virtuosidade, eram o oposto a tudo isso, mas ainda assim foram responsáveis por edificar a cena psicodélica tipicamente alemã e consequentemente a cena progressiva. 

Isso que é revolução! E os responsáveis por essa manifestação artística foram: Malcolm Mooney no vocal, Michael Karoli na guitarra, Irmin Schmidt no órgão e teclados, Holger Czukay no baixo e Jaki Liebezeit na bateria.


“Monster Movie” é uma verdadeira “salada” sonora, levando-se em consideração os estereótipos e os rótulos tão necessários para muitos nos dias de hoje, mas que sequer tinha uma nomenclatura naqueles remotos tempos. Mas já que os temos (estereótipos) atualmente, vamos a tentar nomear este ótimo álbum: psicodélico, improvisações experimentais, jazz fusion, progressivo de vanguarda, lisérgico, sombrio, em alguns momentos, contemplativo em outros. 

O trabalho emana subversão. Não gosto de comparações, mas o The Can é o Pink Floyd da Alemanha, para situar aqueles que se estão na zona de conforto e entendem que a banda britânica é a pioneira do experimentalismo no rock no mundo. Ah, quanta ingenuidade...

Mas antes de dissecar “Monster Movie”, falemos rapidamente de algumas curiosidades históricas do The Can e que molda a sua música e as mensagens políticas e anárquicas da banda. O The Can, como disse, foi formada em 1968, tendo como seus fundadores o tecladista Irmin Schmidt que tinha base e formação clássica e mesclou essa parte erudita com a lisergia e o minimalismo em voga na época. 

Irmin Schmidt

Era tudo muito agressivo e ameaçador. Fundaram também a banda o baterista inovador Jaki Liebezeit e o baixista Holger Czukay. A banda, no início se chamava “Inner Space”, mudando para “The Can” e finalmente “Can”, na sua fase mais conhecida. Segundo o baterista Liebezeit “CAN” era a abreviação para “Comunismo”, “Anarquismo” e “Niilismo”. 


Precisa dizer mais alguma coisa para definir o som da banda e de seu trabalho de estréia, “Monster Movie”? A obra abre com “Father Cannot Yell” que de cara já mostra a loucura chapante e lisérgica do CAN com sonoridades eletrônicas com uma pegada bem acid rock, bem hard que lembra Velvet Underground com muita agressividade e uma sonoridade crua e um destaque para cozinha coesa entre bateria e baixo que faz com que dancemos mesmo que inconscientemente. Demais!

"Father Cannot Yell"

“Mary, Mary So Contrary” começa com uma atmosfera meio space rock, com harmonias mais complexas, uma música viajante, uma balada transcendental, linda, uma obra-prima. Uma melodia cativante e contemplativa e que só não alçou voos por conta de questões geográficas, claramente.

"Mary, Mary So Contrary"

“Outside my Door” tem um pouco do pop sessentista, uma música simples, com uma batida simples e um vocal meio raivoso, quase gritado que ouso dizer que me remete aos acordes de um punk clássico, nova iorquino mesmo (Blasfemia?). E o que dizer dos acordes de guitarra? Riffs sujos, perigosos, ameaçadores, pesado. Proto punk não seria nenhum exagero.

"Outside my Door"

“Yoo Doo Right” fecha o disco com status de faixa épica e que sintetiza o que o The Can faria ao longo de sua brilhante trajetória na música. Psicodelismo, progressivo de vanguarda, dança hipnótica, viagem chapante, tudo você percebe ou ouve nesta música, é a síntese do movimento krautrock.

"Yoo Doo Right"

“Monster Movie” é um clássico não só do krautrock, da psicodelia alemã, é uma ode ao subversivo, uma tapa na cara do conservadorismo de uma sociedade que estava sendo vítima do genocídio cultural alemão que parecia que estava matando mais do que as grandes guerras mundiais. 

É a síntese do underground, mas que personificou a revolução musical da época e que até hoje dita regra, é referência, é atemporal. Tem o tempo nas suas mãos. Para se ter a dimensão da importância desse álbum, reza a lenda que Malcolm Mooney, logo após o lançamento de “Monster Movie”, saiu da banda para buscar um pouco de sanidade. Loucura sonora! 

O The Can mostrou a capacidade de inovar, de trazer uma nova e arrojada linguagem no rock aliando psicodelia que, em 1969, na época da feitura deste álbum, estava no auge do movimento hippie, do proto progressivo, jazz fusion e viagens experimentais aliadas a verdadeiras libertações criativas, fomentadas por jovens inquietos que até hoje parecem que não envelheceram.




A banda:

Irmin Schmidt nos teclados e órgão 
Jaki Liebezeit na bateria
Holger Czukay no baixo
Michael Karoli na guitarra
Malcolm Mooney no vocal


Faixas:

1 - Father Cannot Yell
2 - Mary, Mary, So Contrary
3 - Outside My Door
4 - You Doo Right 




The Can - "Monster Movie" (1969)





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