terça-feira, 28 de dezembro de 2021

The Trip - Caronte (1971)

 


Mais uma vez a Itália se revela majestosa e prolífica quando se fala em rock progressivo. Sua história é irretocável, baseado no primor e na galhardia de suas bandas que escreveram e ainda escrevem, pois grande parte delas ainda está a pleno vigor de suas forças e criatividades, histórias espetaculares e que ainda faz deste país um dos grandes representantes da cena que a cada dia se faz presente e forte com as clássicas bandas e as novas safras que certamente perpetuarão o rock progressivo da velha Itália. 

E a minha dica de hoje é conhecida de todos os apreciadores da boa música progressiva e que com sua sonoridade atemporal e arrojada honrou o clássico e que serve de referência para os tempos contemporâneos. Falo do THE TRIP e seu álbum mais conhecido, o seu melhor trabalho para muitos: “Caronte”, de 1971.

The Trip com “Caronte” flerta com os primórdios do rock progressivo na Itália e ao mesmo tempo se faz perceber a sua sonoridade na nova safra de bandas progressivas na Itália, sobretudo aquelas que primam pelo peso e qualidade na melodia e harmonia. Sim, é possível aliar peso, agressividade e melodia e harmonia com sensibilidade.


Assim é o The Trip com o seu espetacular “Caronte”. E como não posso deixar de falar de um pouco de história para acrescentar ao tempero sonoro, vamos a ela. The Trip foi uma das primeiras bandas italianas de rock progressivo, embora tenha se formado na Inglaterra. Na verdade, se tratavam de músicos ingleses que foram tentar a sorte na Itália em uma época em que beat italiano estava em franca ascendência. 

Isso era meados da década de 1960. Era a psicodelia, era o beat pop que estava em voga na Itália e lá foram eles em busca do sucesso. O The Trip viajou para a Itália e logo serviu de banda de apoio para um cantor de beat-pop chamado Ricky Maiocchi.

Nessa época o guitarrista era um rapaz novo e desconhecido, um tal de Ritchie Blackmore. Blackmore, em 1966, foi para a Itália tentar ganhar a vida como músico, dada também a efervescência daquele país, juntamente com o Maiocchi, que era vocalista de uma banda chamada The Chameleons e lá ficou por poucos meses, entre setembro e dezembro.


O pouco tempo que ficou se deu por conta das incertezas com o seu futuro, pois o show que fazia com o The Trip não estava rendendo dinheiro, o público parecia não apreciar o som da banda, voltado para o psicodélico mais experimental, e os proprietários das casas de shows pagavam muito mal, gerando o retorno precoce do futuro fundador do Deep Purple à Inglaterra. 

Mas em 1969, quando Joe Vescovi foi recrutado, logo assumiu a liderança da banda e começou a trabalhar com a influência de bandas como Vanilla Fudgie, ou seja, um psicodélico, com um progressivo de vanguarda com pitadas de hard rock. Em 1970 gravou seu primeiro álbum, “The Trip” e aqui você pode ler a resenha que fiz sobre este belo álbum, com essa proposta, uma abordagem psicodélica, um acid rock, com um progressivo ainda pouco executado, embrionário.

"The Trip", de 1970

Mas em 1971, veio “Caronte”. Um misto de hard rock elétrico e vigoroso com um progressivo com levadas clássicas com influências de Emerson, Lake & Palmer, como muitas bandas italianas que surgiam no início da década de 70, mas com aquela pegada ao estilo Vanilla Fudge, graças ao grande Vescovi. 

Foi uma guinada espetacular na história do The Trip. “Caronte” foi inspiração do personagem “Charon, o barqueiro do inferno”, de Dante Alighieri, da “Divina Compédia” e constrói uma espécie de metáfora ao conformismo, a uma sociedade conformista, baseada em estruturas frívolas e destrutivas na consumo, na autodestruição, entre outros. Inclusive há faixas mencionando músicos como Janis Joplin e Jimi Hendrix, que, ao olhar da banda, retrata esse conceito de “Caronte”.

Charon, o barqueiro do inferno

A banda, quando produziu ‘Caronte”, tinha a seguinte formação: Joe Vescovi  nos teclados, órgão, mellotron, hammond, William Gray  na guitarra, vocal, Arvid "Wegg" Andersen no baixo e vocal e Pino Sinnone na bateria.


O álbum começa com “Caronte (Pt. 1)” um espetáculo de hard poderoso com uma linha de teclados frenéticos, solos viscerais de guitarra, riffs na mesma escala, uma sonora pedrada. 

"Caronte (Pt. 1)

“Two Brothers” tem mais a cara de um progressivo clássico, com passagens rítmicas, teclados em destaque, uma viagem progressiva em grande estilo, um espetáculo instrumental e um vocal de grande alcance faz dessa faixa um clássico.

"Two Brothers" (Live)

“Little Janie” remete a um The Trip mais psicodélico, uma abordagem mais comercial e acessível que leva a banda aos tempos sessentistas, uma faixa viajante e linda.

"Little Janie", live in Torino 2018

"L'Ultima ora e Ode a Jimi Hendrix” é uma das faixas mais poderosas do álbum. Nesta música o The Trip esbanja em sensibilidade, harmonia, lirismo, uma faixa criativa e que engloba toda a versatilidade da banda: psicodelismo, progressivo, hard rock, tudo se observa nesta música excelente.

"L'Ultima ora e Ode a Jimi Hendrix", live 2011

“Caronte (Pt. 2)” é o desfecho que segue a linha da faixa inaugural, muito peso e tecladeira avassaladora e passional. Assim é “Caronte”, um álbum que abriu as portas do heavy prog na Itália, que foi pioneiro no progressivo pouco voltado para o sinfônico e mais para a agressividade do hard rock e a sensibilidade do rock progressivo.

"Caronte (Pt. 2)

Disco atemporal e necessário para entendermos o que se faz de novo no rock progressivo atualmente na Itália e no mundo, sobretudo com o que conhecemos hoje como metal progressivo tão em evidência nos dias de hoje. A linda capa do álbum é uma representação da ilustração original de Gustave Doré, concebida para somar beleza à fantástica Divina Comédia de Dante Alighieri. 

Em 2021 o The Trip lançou “Caronte 50 Years Later”, em comemoração aos 50 anos de lançamento do espetacular e original “Caronte”, mas isso é uma outra história...



A banda:

William Gray: guitarra elétrica e acústica e vocais

Joe Vescovi: órgão Hammond, piano, órgão sacro, mellotron, arranjos e vocais

 Arvid "WEGG" Andersen: baixo e vocais principais

 Pino Sinnone: bateria


Faixas:

1 - Caronte pt 1

2 - Two Brothers

3 - Little Janie

4 - L'Ultima Ora e Ode a J. Hendrix

5 - Caronte pt 2



"Caronte" (1971)

 

















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