A cena progressiva holandesa é
definitivamente prolífica! Embora pareça uma afirmação tola eu estou
descobrindo-a a cada banda que tenho conhecido nesses últimos meses, anos.
Não há como se estabelecer na
vasta e brilhante discografia do gigante Focus. Lamentavelmente grande parte
das bandas não atingiram o êxito comercial do Focus, sendo difícil destas
chegarem aos ouvidos dos fãs.
A não ser que os fãs sejam
ávidos por desbravar, por conhecer bandas obscuras, que trafegam na escuridão
do underground e que difundem, por intermédio dos mais variados veículos de
comunicação, tais bandas, fazendo com que estas saiam do mais profundo
ostracismo.
E a banda de hoje se
enquadraria no grupo dos subestimados, não sendo apenas uma banda obscura,
alternativa, pouco conhecida. Parece que um complementa o outro. Se é
esquecida, logo incorre no risco de ser ruim, porque ainda aliam a falta de
sucesso a qualidade sonora da banda.
Falo do FINCH. O nome,
confesso, me parece ser bem, digamos, atípico. Em tradução livre significa
“passarinho”. Não sei se os caras do Finch eram ornitólogos ou tinham algum
apreço especial pelos pássaros, mas o fato é que a banda foi batizada com esse
nome. Reza a lenda que o baixista fundador da banda, Peter Vink, alegou que a
tradução de seu sobrenome, em inglês, era “Finch” e assim batizou o nome da
banda.
Além de Peter Vink, no baixo,
a banda contou, na sua formação inaugural com o forte apoio do virtuoso
guitarrista Joop Van Nimwegen, Paul Vink, nos teclados e Beer Klaassena
bateria. O Finch teve uma vida curta, saindo precocemente da cena progressiva
sem deixar rastros, gravando também pouquíssimos álbuns, com três trabalhos,
lançados entre 1975 e 1977, sendo formada em 1974. O álbum que falarei é o seu
debut: “Glory of the Inner Force”, de 1975.
Mas antes de falar nesse
petardo cheio de energia e entusiasmo instrumental, falemos no embrião do Finch
que, como muitas outras bandas, surgiu das cinzas de outras bandas e geralmente
com “pequenas tragédias”.
A banda se chamava Q65. O Q65
estava estabelecido na cidade de Haia Het Paard. Peter Vink era o baixista e
Klaassen Beer era o baterista. Quando a banda acabou, ambos os músicos
decidiram ficar juntos e criar em novo projeto chamado KJOE. Além deles
ingressou o vocalista Johnny Fredericks e o guitarrista Frank Nyuyens. O último
não ficou por muito tempo porque na época quebrou o braço e foi substituído
Ronnie Mayer.
O KJOE tocou em vários clubes
durante as noites, as madrugadas. Claro que bandas novas era sempre mais
difícil conquistar espaços maiores, públicos e o caminho foi muito tortuoso,
até que Ronnie Fredericks abandonaram a banda para tocar em bandas já
estabelecidas.
O prejuízo aumentou. O KJOE
precisava de recrutar novos músicos. Audições foram feitas com vários músicos,
até que Vink e Beer descobriram um garoto de 19 anos chamado Joop Van Breukelen
Nimvegen, tido atualmente como um dos mais influentes guitarristas da Holanda,
que adorava jazz, blues e art-rock.
Muito técnico e rápido o jovem
logo ocupou o cargo de guitarrista da banda. O KJOE passou a ensaiar como um
trio, quando Clem Determeijer assume a vaga de tecladista da banda. Convém
ressaltar que Clem substituiu Paul Vink nos teclados, antes do lançamento do
primeiro álbum já com o nome “Finch”.
O conteúdo instrumental foi tão bom, os ensaios surtiram um efeito tão positivo que decidiram ficar sem vocalista. Essa decisão não foi aleatória, mas tinham a intenção de focar, aprimorar a sua estrutura instrumental. Eis o embrião do Finch. Em 1974 a banda decide mudar de nome trazendo “Finch”.
A EMI holandesa estava
disposta a investir em bandas novas de rock progressivo, afinal, era meados dos
anos 1970 e o estilo estava um tanto quanto em alta e repassou recursos para o
selo local, a “Negram” e a nova banda Finch estava à disposição para ser
reparada e conseguiu, assinando contrato em 1975.
As gravações foram realizadas
em apenas três dias, afinal custava caro bandas novas ficar muito tempo em
estúdio, no “Intertone Studios”, em Heemstead, mixando e masterizando nesse
período, com a produção de Roy Beltman e engenharia de Pierre Geoffroy Chateu.
Assim nasceu “Glory of the Inner Force”.
Há apenas quatro faixas, mas o
suficiente para impor virtuosismo, intensidade e muita energia. São composições
dignamente empolgantes, com interações incríveis entre os músicos e seus
instrumentos, tendo como sustentáculo os teclados e riffs e solos catárticos de
guitarra, em uma espécie de salutar duelo entregando um progressivo sinfônico
carregado de complexidade, mas muito orgânico.
São realmente performances
bombásticas onde arrisco dizer que há peso nas composições, com um Finch
calcado no hard rock. Algo um tanto quanto atípico ver, ou melhor ouvir, um
progressivo sinfônico com tamanha originalidade tendo no peso e na energia o seu
viés sonoro.
Enquanto algumas bandas
holandesas flertavam com a improvisão o Finch trazia elementos mais complexos,
técnicos ao seu som. Em “Glory of the Inner Force” tudo parece estar
meticulosamente no lugar, mas ainda assim não soa mecânico ou sem vida, muito
pelo contrário, é uma música cheia de vivacidade, de um virtuosismo orgânico.
Adicione ao combo prog
sinfônico e pitadas de hard rock, a pegada jazzística, jazz rock e fusion, em
um caldeirão improvável e fantástico de um rock n’ roll enérgico e poderoso. É
definitivamente algo solar neste trabalho inaugural do Finch.
E sem mais delongas vamos
destrinchar faixa a faixa e não se enganem, caros e estimados leitores, são
longas faixas que, diante dessa energia instrumental, não se torna nem um pouco
enfadonha.
E começa com “Register
Magister”! Aqui a composição, além de intensa, vívida e bombástica, traz muita
inspiração, com o fogo do hard rock com a sofisticação do jazz rock, com riffs
de guitarra, solos mais diretos, porém atraentes e inspiradores. Outro detalhe
e que detalhe navega nas intensas variações e reviravoltas sonoras que
definitivamente é e tirar o fôlego. É incrível o humor e o ritmo impresso na
sonoridade dessa faixa. Ah não podemos negligenciar o prog sinfônico presente,
com linhas cavalares de baixo. A “cozinha” nessa faixa é magistral.
Segue com “Parodoxical Moods”
já te cativa com um mellotron assustador, avassalador que propicia as
“travessuras” de guitarra de Joop. Aquele clima salutar de duelo tão presente
em todo o álbum. Mas o melhor estaria de por vir, com um solo incrível de órgão
com a cortesia de Determeyer. São compassos rápidos e loucos, algo atípico
demais para um prog rock sinfônico que alternam em seções lentas, por vezes
temperamentais que saltam sem forçar para os momentos mais animados. Não
preciso dizer, com isso, das lindas alternâncias rítmicas.
E agora vem a majestosa “Pisces”,
que pega um pouco mais leve nos andamentos, mas não foge muito à proposta
estrutural do álbum. Aqui se, evidentemente, o frenesi das teclas com solos
mais longos e a guitarra apenas dando uma textura, com o trabalho mais
eloquentes da “cozinha” com uma levada mais jazz rock.
E encerra com “A Bridge to
Alice” que inicia mais soturno, sombrio, com um baixo mais pesado e bateria
marcada. Riffs de guitarra são ouvidos e corroboram o peso da faixa. O peso
“rivaliza” com passagens mais jazzísticas constatando as já percebidas, em todo
álbum, variações rítmicas.
“Glory of the Inner Force” teve alguma repercussão pela imprensa local, não apenas pelos veículos especializados, mas pela mídia holandesa ampla, sendo, alguns meses depois sendo lançado nos Estados Unidos pela ATCO Records (subsidiária da Atlantic), onde impressões positivas também pipocaram, afinal, não era para menos, tratava-se de um excelente e arrojado álbum. Em 1994 o álbum foi relançado, sendo remasterizado por Peter Vink com a inclusão de duas faixas bônus: “Colossus Part I” e “Colossus Part II”.
O Finch lançou o seu segundo álbum, em 1976, chamado “Beyond Expression” e no ano seguinte traria ao mundo seu terceiro e último álbum de estúdio o “Galleons of Passion”, de 1977. A banda encerrou as suas atividades, precocemente, em 1978 sem deixar rastros.
O Finch traz uma sonoridade
complexa, com temas inspirados e arrojados e de extremo bom gosto, mas sem
deixar de lado a presença humana, orgânica de seus músicos. “Glory of the Inner
Force” traz quatro faixas que são primordialmente músicas de um hard prog
sinfônico. São músicas densas, fortes e técnicas, sobretudo.
A conclusão que se tira desse
excelente trabalho do Finch é de um trabalho múltiplo de vertentes do rock n’
roll recheadas de surpresas mais do que agradáveis, com evoluções técnicas e
orgânicas que faz dessa obra, apesar de alternativa, uma das mais importantes
da Holanda. Definitivamente trata-se de uma pérola mais do que recomendada!
A banda:
Joop Van Nimwegen nas guitarras
elétricas e acústicas
Cleem Determeijer no piano de
cauda, piano honky tonk, piano elétrico, órgão Hammond, Mellotron,
sintetizador Arp Pro-Soloist
Peter Vink no baixo, pedais de
baixo
Beer Klaasse na bateria
Faixas:
1 - Register Magister
2 - Parodoxical Moods
3 - Pisces
4. A Bridge to Alice
Bruno Moraes, excelente a banda! Tenho ouvido muito o duplo "Stage'76" (Live) - "The making of... Galleons Of Passion. "Necronomicon" (que é inclusive nome de uma obscura e boa banda alemã), com seus 17 minutos, parece um remake de "Aquatarkus" do ELP. Excelente a também gigantesca "A Passion Condensed", que lembra muito o Focus com suas alternâncias de guitarra, órgão e bateria. E o guitarrista é herdeiro de Jan Akkerman... Obrigado pela dica. Já ouvindo os outros discos.
ResponderExcluirGeraldo, Finch é demais!
ExcluirA banda tem um som cativante e enérgico, um prog rock que não precisa ser enfadonho só pelo fato de ser prog rock! kkk
Uma banda especial que há tempos estava querendo escrever sobre!
Obrigado por ler!