O texto hoje assumirá um
caráter de homenagem. Não que os outros que estão registrados neste humilde e
reles blog não sejam, mas esse lamentavelmente tem um ensejo póstumo. No
primeiro dia de novembro de 2023 o virtuoso e grandioso guitarrista italiano, baseado
na Suíça, Vittorio Vergeat, nos deixou.
Talvez para muitos
apreciadores de rock n’ roll esse nome não seja lembrado, esteja no ostracismo,
nos porões empoeirados do estilo, mas se tratou de um dos melhores e mais
influentes dos guitarristas que o mundo testemunhou nos últimos cinquenta anos!
É sabido que é mais salutar
que as homenagens devem ser feitas em vida, mas quis as circunstâncias que Vic
Vergeat, como era conhecido, nos deixasse tão prematuramente, antes de ter um
texto sobre a banda gigante, porém pouco comercial, que fundou: o TOAD.
Embora, como disse, o Toad não tenho gozado, ao longo das décadas, de fama, sucesso, se tornou emblemática pelo menos na Suíça, sendo, sem sombra de dúvida, uma das precursoras do heavy rock, do proto stoner naquele país. Se tornou também um ponto fora da curva quando se tratou de apresentações ao vivo.
A banda se notabilizou em seu país por sua ferocidade, musicalidade e
algumas “travessuras”, se é que me entendem, no palco, principalmente quando
Vic tocava guitarra com os dentes, algo que emulou de sua grande inspiração no
instrumento: Jimi Hendrix.
Então já que falei das
poderosas apresentações ao vivo do Toad, nada mais interessante falar de um
registro ao vivo avassalador que, apesar de ter acontecido na cidade de Basel,
em 1972, foi lançado apenas em 2005, levando o nome de “Open Fire – Live in
Bassel 1972”.
O Toad passou por várias
mudanças de formação ao longo de sua trajetória, mas construiu os seus melhores
e mais criativos momentos com o seguinte line
up: Vic Vergeat na guitarra e vocal, Werner Fröhlich no baixo e voz e
Cosimo Lampis na bateria.
Mas antes de passear na
história do Toad e de seu registro emblemático ao vivo, “Open Fire – Live in
Bassel 1972”, vamos falar um pouco também da história de Vic Vergeat, o nosso
também homenageado.
Vittorio Vergeat nasceu e viveu na Itália até os quinze anos de idade, se mudando para Ticino, na Suíça. Começou, nesta mesma idade, a tocar violão, um autodidata, gravando sua primeira música com um produtor com certo renome precocemente e logo começou a se apresentar com uma banda que tinha gêmeos cantando. Com quinze anos também lançou um single que foi traduzido para o inglês com uma banda chamada “The Black Birds”, que tinha um ótimo cantor com o dobro de sua idade.
Em 1969 decide tentar a
sorte em Londres. Lá chegou a tocar brevemente com uma banda que nascia e se
chamava Hawkwind! Sim! Vergeat foi o guitarrista original do Hawkwind! Mas
apesar da pouca idade e do talento prodigioso na guitarra, o relacionamento com
os outros caras do Hawkwind não era dos melhores, sempre brigando. Diante da
falta de perspectiva em Londres e das intensas brigas com o Hawkwind decidiu
largar tudo e voltar para a Suíça, baseando-se em Basel.
Em Basel havia uma banda de psych rock, de krautrock chamada Brainticket que estava meio alinhada aos que os alemães da cena kraut estavam fazendo em seu país natal e que estava fazendo algum sucesso na Suíça. Na realidade a banda tinha músicos da Alemanha, da Suíça, da Itália. Era uma banda, digamos, “multinacional”.
Vergeat se aproximou dos
caras e tal proximidade fez com que Cosimo Lampis e Werner Frohlic, baterista e
baixista, respectivamente se juntassem a ele para formar uma nova banda, o
Toad. E como os caras não se sentiam bons vocalistas o “time” se completou com
Benjamin Jaeger. Mas Cosimo e Werner, antes de sair do Brainticket, ajudaram a
gravar o debut da banda chamado “Cottonwoodhill”, gravado em 1970 e lançado em
1971.
Com o Toad formado, isso em 1970, eles precisavam, claro, fazer shows, compor para lançar seu novo álbum. O primeiro show da banda aconteceu em Zurique e a banda foi, para variar, muito bem recepcionada, os moleques curtiram e muito a ferocidade do Toad no palco. Depois tocou em Ticino. A banda ainda não tinha nome. Precisavam criar um nome para facilitar a sua divulgação. Vergeat, antes do show começar, decidiu dar uma volta nos jardins do clube em Ticino e viu um sapo, foi daí que veio a inspiração para o nome da banda: Toad!
Apesar da banda, ainda
jovem, não ter uma formatação em seu estilo de som, afinal era muito cru,
estava nítido que o Toad tinha a vontade de seguir a linha dos “power trios” muito comum na época, como
Blue Cheer, Cream, Mountain, Jeff Beck Group, Experience, de Hendrix etc. O som
era um volumoso hard rock, com pegadas blueseiras bem pesadas. É notadamente um
som voltado para o proto metal e proto stoner,
muito solar e pesado.
O Toad logo ganhou alguma visibilidade recebendo ofertas para tocar em vários lugares na Suíça. A banda foi encorpando público de forma natural, graças, principalmente às suas apresentações ao vivo e ao seu primeiro álbum, homônimo, que seria lançado em 1971.
Tal trabalho foi concebido
em um estúdio em Londres, após assinatura de contrato com a “Hallelujah Records”.
O dono da gravadora foi extremamente legal com os caras do Toad, embora eles
tenham gravado em uma semana, afinal, estar em estúdio era caro, principalmente
para uma banda nova como o Toad. “Toad” foi mixado por Martin Birch, lendário
produtor que trabalhou, entre outros, com o Deep Purple. A banda fez mais de
200 shows por toda a Suíça.
Um ano depois, em 1972, a
banda lançaria seu segundo álbum, “Tomorrow Blue”. Esse trabalho traria uma
veia mais “blueseira” mas sem deixar de lado, claro, seu hard rock potente e
poderoso. Vergeat assumiria os vocais, pois Benjamin Jaeger sairia da banda, ao
fim da produção do primeiro álbum. Martin Birch assumiria também a produção
deste álbum. Assim nasceria o Toad no “formato” power trio, o que sempre sonhou
Vic Vergeat. Um dos grandes e subestimados “power trios” da história do rock n’
roll nos anos 1970.
Com o lançamento de “Tomorrow Blue” a banda sairia em turnê, claro, afinal, o segredo do Toad estava em sua energia ao vivo, nos palcos. A cada show que realizava, o seu público aumentava, ganhava corpo. As casas, algumas pequenas, já não comportava os jovens que passavam a seguir o Toad e todo o seu belicismo sonoro.
Um dos shows mais
significativos e importantes foi na cidade de Basel, em 1972, intitulado “Open
Fire – Live in Basel”, que viria a ser lançado em CD, apenas em 2005, será alvo
de nossa resenha de hoje para homenagear Vic Vergeat, sintetiza fielmente, além
das influências de Vic e companhia, como toda a força, a consistência e poderio
do hard rock da banda suíça. Inclusive este ao vivo contempla faixas
eternizadas e escritas por Jimi Hendrix, como: “Red House” e “Who Knows”.
Então falemos de “Open
Fire”. O álbum é inaugurado com a faixa título do segundo álbum, “Tomorrow
Blue”. A introdução, ao estilo “bluesy” contagia, anima, é dançante. A bateria,
cadenciada, mas pesada, dá o tom do poderio bélico dessa faixa. A propósito
essa faixa, em sua versão ao vivo, ganhou vida, mais peso, a banda se permitiu
improvisar, ousar em alguns momentos, tanto que atinge os 14 minutos de
duração. Guitarras explosivas, distorcidas, baixo marcado e pulsante. “Tomorrow
Blue” é um verdadeiro arrasa quarteirão!
Segue com “Thoughts”, também
do segundo álbum, que já diz a que veio logo no início. Riffs pesados de
guitarra, “cozinha” afinada dando o tom, com a bateria pesada, indulgente, os
pratos parecem voar. Baixo intenso, galopante. Aqui é a personificação do hard
rock sem arestas, puro e bruto.
A sequência tem a sugestiva
faixa “Blues”. Como nome já entrega aqui impera o blues rock. A guitarra viaja
entre o “bluesy” e o hard rock nos seus momentos, claro, mais pesado. Bateria
marcada, cheia de viradas, mas sem deixar de lado o peso. O baixo segue o
compasso e traz algum groove.
“Pig’s Walk”, faixa do
primeiro álbum, de 1971, começa indulgente com a riffs poderosos de guitarra
que logo se entrelaçam com solos avassaladores. Não traz tanto virtuosismo, mas
dá conta do recado trazendo um “tempero” pesado. Pesado é o nome ideal para
essa faixa! Aqui o proto metal parece reinar, com direito a solos de bateria e
tudo o mais!
E eis que surge o clássico
eternizado por Jimi Hendrix, “Red House”. A pegada do blues rock que
notabilizou Hendrix e que serviu de inspiração para Vic Vergeat e sua trupe
parece emulada com sucesso nessa versão. Blues rock mesclado ao hard rock, com groove, balanço e consistência.
E fecha finalmente com outro
clássico de Hendrix, “Who Knows”. A pegada dançante é delineada pela guitarra,
um dedilhado simples, mas genial de Vic dá o tom e abre os trabalhos nessa
faixa que não despreza o hard rock, mas traz uma boa cadenciada que se torna
inevitável dançar e “bater” a cabeça.
O Toad ficou um tempo sem
gravar material, depois de “Tomorrow Blues”, até que em 1974 começa a preparar
o seu terceiro trabalho de estúdio, “Dreams”, que seria oficialmente lançado em
1975. Vic fala com muito carinho desse álbum, dizendo em algumas entrevistas
que o processo de gravação foi muito leve, prazeroso.
Mas a crítica já não olhou
com bons olhos esse lançamento. Em “Dreams” o Toad notadamente direciona sua
sonoridade para uma pegada mais “funk”, alguma mais groove, o que não deixa de
ser percebido, em menor “dosagem” nos álbuns anteriores. Era fato também que os
teclados e o piano suavizariam um pouco a sonoridade da banda neste álbum,
porém era nítida a intenção da banda explorar novas sonoridades.
“Dreams” foi lançado pelo
pequeno selo “Frog”. O álbum foi lançado apenas na Itália. O nível de atividade
da banda diminuiu significativamente, mas não impediu que o Toad continuasse
com as suas poderosas apresentações, dando-lhe o status de uma das grandes
bandas ao vivo dos anos 1970. Mas o Toad não conseguia sucesso comercial nos
Estados Unidos e Inglaterra, o que era intenção de Vic Vergeat.
Então o inevitável acontece
com a saída de Vic Vergeat e o fim, em 1975, do Toad. Assim Vic foi para a
América e o Reino Unido tentar a sorte. Gravou um álbum solo com a intitulada
“Vic Vergeat Band” chamado “Down to the Bone”, em 1980 que saiu pelo selo
“Capitol”. De fato, um belíssimo álbum que foi produzido pelo ícone produtor
alemão Dieter Dirks, que mostra o hard rock com uma pegada mais radiofônica.
Até que deu certo, porque Vic saiu em turnê com bandas do naipe de Nazareth e o
Aerosmith.
Mas Vic Vergeat parece nunca
ter esquecido de seu “filho” pródigo, o bom e velho Toad. A banda se reuniu, de
forma esporádica, nos anos 1980, mas não lançou nenhum material novo.
A banda:
Vic Vergeat no vocal e
guitarra
Cosimo Lampis na bateria
Werner Froehlich na bateria
Faixas:
1 - Tomorrow Blue
2 - Thoughts
3 - Blues
4 - Pig's Walk
5 - Red House (Hendrix)
6 - Who Knows (Hendrix)
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