O ano era 1969. O rock
progressivo italiano era apenas uma “maquete”, embrionário. Sequer falava em
rock progressivo em qualquer parte do mundo, inclusive, no máximo se tinha músicas
de improvisação, experimentais, sem a tal nomenclatura que se convencionaria no
seu auge, lá pelo ano de 1971, 1972, aproximadamente.
O beat italiano, baseado na
psicodelia norte americana, com um viés comercial, porque adicionava um
“tempero” da música popular italiana era o que se ouvia nas rádios de música
italianas e tinham em bandas como Le Orme, por exemplo, como seu principal
expoente, sua principal referência.
E bandas como essas que
edificariam o estilo progressivo que tomaria conta dos olhares de algumas
gravadoras e selos que surgiriam investindo nessas bandas de jovens transviados
que gostariam de ousar na música, importando o prog rock da Inglaterra,
sobretudo de bandas icônicas como Emerson, Lake & Palmer.
Algumas bandas italianas,
como Premiata Forneria Marconi, o próprio Le Orme, foram bandas que beberam
dessa cena beat e que logo reformulariam a sua sonoridade aderindo ao rock
progressivo que, nos idos de 1971 e 1972, estava em voga.
Mas apesar da prolífica cena
progressiva que invadia a Itália no início dos anos 1970, algumas bandas caiam
no mais puro ostracismo, tornando-se obscura, pela sua estrutura sonora, pelas
mensagens afiadas de suas letras, muitas de cunho político e comportamental
que, em virtude de uma sociedade conservadora, são relegadas ao esquecimento.
E uma banda, rara e obscura,
pode se adequar a esse cenário com segurança é o CAPITOLO 6 com o lançamento de
seu único álbum, em 1972, chamado “Frutti per Kagua”. A banda, para variar,
permaneceu desconhecida na Itália, a despeito da qualidade de sua música, que
entrega um progressivo vigoroso e repleto de complexidade, uma sonoridade
inquieta e “escrava” da livre criatividade de seus músicos.
O Capitolo 6 foi formado em 1969 a partir da fusão de duas bandas: I Rangers, de Livorno e o Gli Eremiti da região de Viareggio. O quinteto original, que continha dois bateristas, consistia em Riccardo Bartolotti (vocal, guitarra, flauta), Jimmy Santerini (teclados, vocais), Giovanni Galli (baixo e bateria) imediatamente substituído por Mauro Romani (baixo), Lorenzo Donati (bateria, voz) e Luciano Casa (guitarra, bateria). Entretanto há alguns desencontros de informações divulgadas sobre a banda, principalmente quanto ao local em que foi formada, onde aventou-se que os mesmos tenham surgido em Roma.
Contudo não é apenas essa
informação que gera discussão e questionamento, pois de acordo com algumas
informações divulgadas, o Capitolo 6 teria lançado um single para o selo “Acto”
praticamente assim que foi formada, que é a “Cool Jerk” e “Please, Please,
Please”, ambos covers da banda Capitols, mas a notícia é discutível a ponto,
inclusive, de ser categoricamente negada por um dos membros da banda.
O Capitolo 6 conseguiu um
contrato, em Roma, com a subsidiária da RCA, a IT, que era dirigida por
Vincenzo Micocci, graças à intercessão do amigo e produtor de Viareggio, Franco
Tessandori, lançando seu primeiro e real single chamado “Mi Innamoro di Te”, em
1971.
A banda já estava radicada
em Roma e o novo quinteto com Loriano Berti, da região de Grosseto, aconteceu,
substituindo Luciano Casa. É provável que o Capitolo 6 tenha sofrido várias
mudanças de formação nesse período e a prova contundente é de um clipe da TV
iugoslava chamada “Tele Capodistria”, já os mostra como um quarteto, com Donati
como vocalista, Santerini (no baixo), sax/flautista Berti e o guitarrista Roberto
Ghiozzi (ex-tecladista e cantor do grupo beat
de Livorno, I Satelliti), este último como substituto temporário de Bartolotti
que não tinha passaporte para ir para o exterior.
A banda esteve bem ativa fazendo vários shows pela Itália e ganhou alguma visibilidade no Viareggio Pop Festival em 1971 abrindo shows, inclusive, do Led Zeppelin. Finalmente veio o momento de gravarem o seu álbum de estúdio que passaria a se chamar “Frutti per Kagua”, em 1972. A capa do álbum denuncia um trabalho conceitual, que fala sobre a origem dos “Redskins americanos” e as complicadas negociações de terras indígenas pelo homem branco.
“Frutti per Kagua”, quando
foi gravado e lançado, tinha, em seu line up cinco integrantes, que são
Riccardo Bartolotti nos vocais, guitarra e flauta, Jimmy Santerini nos teclados
e vocais, Loriano Berti no saxofone e flauta, Maurizio Romani no baixo, Lorenzo
Donati na bateria e vocais. Mas foi reduzida para um quarteto, com a efetivação
de Santerini e Bortolotti.
O álbum tem duas faces bem
distintas, mas homogeneizadas por uma sonoridade bem dura, substancial,
consistente e enérgica com grandes trechos de rock progressivo, sinfônico e até
mesmo um volumoso hard rock. Tem quebras de ritmo bem ousadas, com passagens de
tirar o fôlego com quebras entre um verso e outro das músicas com destaque para
os vocais com a flauta e o sax sobressaindo em alguns ótimos momentos.
O álbum é composto por apenas cinco, mas fabulosas faixas, sendo a primeira uma verdadeira joia digna do que conhecemos como rock progressivo italiano. A faixa título, “Frutti Per Kagua”, de quase 19 minutos, é conduzida com extrema perfeição por Berti com belas passagens de flauta ao longo de seu percurso. Traz também uma forte seção de blues rock que me faz lembrar os primeiros trabalhos do Jethro Tull e até algo de “Benefit”. A guitarra é carregada de emoção, com bons e elétricos riffs. E quando os instrumentos se “desligam” por um momento arpejos de órgão se estabelece dando entornos evidentes de rock progressivo, mantendo um forte diálogo com a flauta. É sem dúvida uma faixa aclamada, definitiva da banda.
“Grande Spirito” é uma linda
balada acústica, bem cativante, traz uma levada bem contemplativa, viajante, em
uma atmosfera bem dramática, intensa. A faixa não é brilhante, mas linda e
visceral.
“Il Tramonto di un Popolo” começa
com um breve canto e ruídos de bateria, antes que a instrumentação traga uma
alternância sólida de passagens de rock furioso e passagens pastorais. A
diversidade que levou 18 minutos para se desenvolver e se acomodar na suíte
está aqui compreendida sem perder um pingo de tensão.
O encerramento do álbum é
com a faixa 'L'Ultima Notte' carrega uma vibração muito semelhante, embora com
maiores doses de expansão e fluidez, o que é bom para seus quase doze minutos
de duração. O baterista trabalha eficientemente na base, enquanto o guitarrista
principal oferece o que são indiscutivelmente seus melhores solos no álbum.
“Frutti per Kaqua” foi
relançado em 1999 pelo selo Akarma com uma capa dobrável. As primeiras cópias
desta reedição tinham o desenho da capa impresso ao contrário e abrindo-a não
dá para ver todo o cacique, pois as duas metades são giradas 90 graus uma em
relação à outra. Este defeito foi corrigido em cópias posteriores.
Novas reedições de vinil
foram lançadas em 2017 e 2020. O álbum foi relançado em CD em março de 2003
pela BMG, com capa “mini-LP” gatefold e obi, como parte de sua série “Dei di um
Perduto Rock” e, posteriormente reimprimido em outubro do mesmo ano, quando um
segundo lote desses CDs saiu.
O álbum foi relançado em CD
em março de 2003 pela BMG com capa mini-LP gatefold e obi, como parte de sua
série "Dei di un Perduto Rock", e posteriormente reprimido em outubro
do mesmo ano, quando um segundo lote desses CDs saiu.
Como muitas bandas e artistas
assinaram com a RCA, o Capitolo 6 foi destaque em algumas compilações lançadas
por esta gravadora. Um deles foi o “Sanremo 1972”, um álbum que incluía
originais e remakes da edição daquele
ano do concurso de canções da TV italiana.
O Capitolo 6 não apareceu no show, mas foi incluído no LP com suas músicas cover: “Jesahel” e “T Voglio” do Delirium. Uma compilação semelhante chamada “Hit Parade Itália número 4 – Sanremo ‘72”, foi lançada na Alemanha, novamente pela RCA.
Outras compilações foram
lançadas na América do Sul, uma delas na Venezuela chamada “Em Español: Los
Finalistas del Festival de Sanremo 1972 e incluiu algumas faixas do Capitolo 6.
Na Argentina uma outra compilação foi lançada, mas agora do festival de Sanremo
de 1971 intitulada “Festival de Sanremo 1971.
O segundo single do Capitolo
6, “M’innamoro di Te”, foi lançado em versão em espanhol (“Me Enamoro de Ti” e
“Amabamos Tres”) foi lançado na Argentina e no Uruguai, bem como na Venezuela.
Algumas faixas, para o mercado sul americano, foram gravadas pela banda após
este single, porém nunca lançadas.
Uma reedição de “Frutti per
Kagua” foi lançada no Japão em 2008, em CD, pela BMG com uma capa de mini-LP
reproduzindo o original.
A banda:
Riccardo Bartolotti nos
vocais, guitarra, flauta
Jimmy Santerini nos teclados
e vocais
Loriano Berti no sax e flauta
Maurizio Romani no baixo
Lorenzo Donati na bateria e
vocais
Faixas
1 - Frutti per Kagua
2 - Grande Spirito
3. Il Tramonto di un Popolo
4. L'Ultima Notte
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