O ápice da “New Wave of
British Heavy Metal” aconteceu em meados dos anos 1980. As bandas, outrora
marginalizadas e temidas pelas suas indumentárias e letras ultrajantes calcadas
nas mazelas comportamentais da sociedade ou temas obscuros, se tornaram “mainstream”, se tornaram populares.
Algumas cenas, algumas
“células” do heavy metal como o glam metal, por exemplo, ganhou notoriedade,
atingindo as rádios, a MTV, com clipes caros, atingindo status de superprodução
cinematográfica, com androginia que excitam as menininhas que, revoltadas sem
motivo, tentavam, a todo custo alarmar seus pais.
O heavy metal estava na
moda. No Brasil rádios como Fluminense, a famosa “Maldita”, catapultava o “rock
de bermuda” e, cada vez mais o público “consumia” cada vez mais as bandas estrangeiras
que estavam no pedestal do sucesso, culminando no até então maior festival de
música do país, o “Rock in Rio”.
Ozzy Osbourne, hedonista, se
drogava, ostentava dinheiro, Iron Maiden se apresentava em palcos suntuosos,
Def Leppard fazia as menininhas suspirarem, o glam metal era um tapa na cara da
sociedade politicamente correta com suas roupas espalhafatosas e homens
meticulosamente “femininos”.
Mas como tudo na indústria
fonográfica, há também o lado “obscuro”, o lado esquecido, “empoeirado”, que,
vilipendiado, formou um nicho marginalizado, longe dos olhares e ouvidos dos
ardorosos fãs que trafegavam na “zona de conforto” das bandas medalhonas e é
essa cena que soube, com maestria, construir uma cena intocável e genuína.
E claro, a cena não foi
“setorizada”, restrita a países, mas globalizada e consequentemente algumas
bandas, espalhadas pelo mundo, ostentaram o seu ostracismo. E, a partir daí,
vem a pergunta: Por que algumas bandas foram relegadas a esta condição? Muitos
são os fatores, logo difíceis de mensurar exatamente: maior sorte,
incompetência, sonoridade “pouco digerível” etc.
O fato é que por aqui neste
reles e humilde blog, essas bandas, fracassadas sob o aspecto comercial da
coisa, ganha luz, ganha vez. E uma em especial é digna de contar a história,
embora pouco, muito pouco mesmo se saiba a respeito dela, por isso, óbvio, é
uma banda extremamente rara e obscura, falo da banda norte americana WITCH.
A banda foi formada em
Dayton, Ohio, mas não se sabe exatamente em que ano os caras se juntaram. O
pouco que há a respeito do Witch é de que a banda teve uma vida curta e gravou
apenas um álbum de estúdio chamado “Salem’s Rise”, em 1985.
Reza a lenda que a banda
gravou o álbum apenas para eles, os músicos e para alguns amigos mais próximos,
enfim, trata-se de um trabalho predominantemente “artesanal” vide, inclusive, a
arte gráfica do álbum, muito simples, diria inocente de tão “rudimentar”, em
suma, é realmente um trabalho artesanal.
Sabe-se que o álbum teve
lançamento inaugural da série OH Wax Gotta Groove Records e originalmente
lançado pela gravadora “Eargasm Productions”. O produtor executivo da Eargasm
Productions, Tim Grogean foi apresentado ao guitarrista do Witch, Ted George,
em 1984, quando este foi ao estúdio em Dayton, Ohio, de Gorgean.
Ted foi ao estúdio de Tim
Grogean para pedir para produzir um single de sua banda para ele. Ted George
era conhecido por ser um avassalador guitarrista da cena de Ohio, conhecido
também pela sua apresentação animalesca nos palcos. Ted ansiava em escrever um
álbum e Tim estava procurando por um projeto para apresentar às grandes
gravadoras em Los Angeles, onde estava borbulhando a famigerada cena glam
metal, e também na cidade de Nova Iorque.
As composições e os ensaios começaram em Versailles, Ohio. Além de Ted George na guitarra e composição, a banda era formada por Dave Chappie, no baixo, Tony Chappie, na bateria e Ace Matthews no vocais. Muitas e muitas noites os caras do Witch tocaram no porão da casa dos irmãos Tony e Dave para dar existência ao seu álbum de nome “Salem’s Rise”.
A pré-produção foi feita nos
estúdios do Eargasm. A gravação de “Salem’s Rise” aconteceu na “Audio
Productions”, em New Carlisle, em Ohio e teve a engenharia de Tim e Mike
Niklas. Tim Grogean, além de produtor executivo do álbum, ajudou também na
composição das músicas e na guitarra. Foi masterizado na QCA em Cincinnati,
Ohio, onde também foi originariamente fabricado os LPs. Tonny Chappie e Tim
Grogean escreveram os solos de bateria e o pianista Larry “LD” Hampshire ficou
ao lado de Ted para a composição dos teclados.
“Salem’s Rise” é o típico
heavy metal oitentista, solos galopantes de baixo, guitarras estridentes, com
riffs pegajosos, pesados e vocais melódicos e com algum alcance, mas traz algo
diferente, algo inocente, algo orgânico que não se faz nos dias de hoje, onde a
avidez é para atender a demandas de um público distante e que não se apega aos
instrumentos.
Não é um álbum matador, um
petardo sonoro, mas personifica a cena heavy dos anos 1980, trazendo todos os
ingredientes para se ter um álbum de heavy rock, pois ainda traz nuances do
hard rock setentista perdido e esquecido pelo tempo.
O álbum é inaugurado com a
faixa “Poison”, uma faixa típica de heavy metal com riffs pesados e pegajosos,
com bateria marcada, cadenciada, baixo pulsante e vocal indulgente e sombrio.
“Poison” entrega algo de hard rock também, algo dos primórdios da New Wave Of
British Heavy Metal em meados dos anos 1970, quando eram mais cruas e que
sofriam influência das bandas setentistas.
“Beckon” começa cadenciada,
riffs discretos de guitarra traz uma textura mais sombria, algo como occult
rock, mas que logo irrompe em uma explosão heavy com um vocal mais alto, por
vezes mais gritado. Música direta e poderosa!
“Eyes on You” tem uma
abordagem mais pop, mais comercial e radiofônica, mas não se perde do contexto
do álbum com os indefectíveis riffs pegajosos de guitarra dando o ritmo. Essa
música me remete a fase oitentista de Alice Cooper. Bandas como Ghost, que é
notória fazendo esse tipo de música atualmente, o Witch já o fez mais de trinta
anos antes.
“Lady Medusa” vem botando o
pé na porta e traz uma miscelânea
interessante entre heavy metal e hard rock, com um vocal límpido e quase falado
em alguns momentos com uma “cozinha” bem entrosada, dando uma textura intensa e
densa ao contexto sonoro, com um solo lindo e direto de guitarra sendo a cereja
do bolo.
Segue com “Will I See You
Again” que traz a evidência dos teclados, dando uma nostalgia sombria dos primórdios
do occult rock, como o Coven, por exemplo, com um vocal de grande alcance. Uma
atmosfera sombria e melancólica se arquiteta nessa música e fecha de forma
excelente com um solo de bateria.
“Teen of Darkness” segue
basicamente a mesma atmosfera da faixa anterior, uma pega mais occult rock,
porém com uma diferença: peso. O peso protagonizado pela guitarra, pelos seus
riffs e a intensidade da bateria que também dita o ritmo da faixa e toda a sua
indulgência.
“Hear the Thunder” faz jus
ao nome da faixa. Traz de volta o heavy rock do álbum com a excelente
dobradinha entre a bateria e a guitarra, sendo tocadas de forma intensa e
agressiva. O baixo vai ganhando força e encorpando a música, dando-lhe certo
groove. Uma das melhores músicas de “Salem’s Rise”.
E agora segue com a faixa
título, “Salem’s Rise”, que é arrastada, com algumas evidentes “pitadas” de
doom metal. Traz algo de sujo e ameaçador em sua melodia. Cada nota tocada me
trouxe a impressão de que a banda flertava com o despretensioso e orgânico, mas
com algumas variâncias rítmicas que denota complexidade. Intrigante e
fantástica faixa.
“Loki” é uma ode ao heavy
metal, mas que, ao mesmo tempo, entrega algo complexo também, ousaria dizer que
remete a bandas como Mercyful Fate, com o seu metal progressivo e todas as suas
mudanças de andamento, mudanças de ritmo. Os vocais e os riffs de guitarra são
os destaques da música.
E fecha com “Something Evil” não poderia encerrar da melhor maneira, bateria pesada, riffs pesados e agressivos, baixo pulsante e vocal alto e gritado, rasgadão mesmo. Tem uma sonoridade direta, curta e grossa, sem rodeios, mas é, por outro lado, robusta, encorpada, intensa, energética, solar.
“Salem’s Rise” teve uma
festa de lançamento que foi realizada na “Hara Arena”, em Dayton, Ohio. As
cópias do álbum esgotaram quase que imediatamente, foram poucas cópias
produzidas. Mas nem tudo foi festa, porque diante de um mercado perverso e que
ansiava pela new wave e a “big hair metal”, o famoso “metal farofa” e também
com o glam metal, “Salem’s Rise” se viu deslocado de tudo que o mercado
fonográfico queria e a banda não conseguiu nenhum contrato de gravação, ninguém
quis assinar com o Witch.
A maioria dos músicos
envolvidos com o Witch continuam tocando e gravando até os dias de hoje. Ted
passou a liderar várias bandas e a trabalhar com outros artistas, incluindo
Rick Derringer. Ele é conhecido hoje como “Fast Eddie” devido a sua velocidade
ao tocar guitarra.
Os irmãos Chappie acabaram
se tornando empresários e pouco ou nada se sabe sobre o futuro do vocalista Ace
Mathews. O tecladista “LD” continuou a tocar em bandas com Tim Grogean e
gravaram muito nos estúdios da área de Dayton, em Ohio. Tim passou a trabalhar
com bandas como Rush, Sponge, Days of The New e Sun e até hoje grava e faz
turnês com sua atual banda chamada Amplified. O álbum foi relançado, em outubro
de 2018, pelo selo “Gotta Groove Records”.
A banda:
Dave Chappie - baixo
Tony Chappie - bateria
Ted George - Guitarras
Ace Matthews – Vocais
Com
Larry “LD” Hampshire –
Teclados
Tim Grogean – Produção,
composição das músicas
Faixas:
1 - Poison
2 - Beckon
3 - Eyes on You
4 - Lady Medusa
5 - Will I See You Again
6 - Teen of Darkness
7 - Hear the Thunder
8 - Salem's Rise
9 - Loki
10 - Something Evil
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