Histórias que caíram no
ostracismo. Bandas vilipendiadas em detrimento do sucesso avassalador de outras
tantas que bebendo das suas vitórias se tornaram pioneiras, as primeiras,
aquelas que criaram um conceito sonoro, uma moda, ditaram comportamentos,
formaram opiniões.
E as bandas que pereceram
que fracassaram? Fracassaram? O que é fracasso para você, ouvinte de roco n’
roll? O fracasso comercial incorre em uma pretensa falta de qualidade sonora?
Será que as bandas obscuras, esquecidas, que não tiveram sucesso comercial não
podem ser consideradas como pioneiras?
São perguntas que me faço
desde que “construí” este blog que publica as bandas “fracassadas” e seus
trabalhos esquecidos. Muitas dessas bandas que, abnegadas, ajudaram, inclusive
simultaneamente com as bandas de sucesso, a construir uma cena, um núcleo
sonoro, mas que por quaisquer infortúnios não seguiram em frente, mas que, de
certa forma, foram os embriões de uma história qualquer.
Essa banda que falarei
agora, eu achei em minhas incursões pela grande rede e confesso que o que me
atraiu foi o aspecto visual. A capa, embora pouco arrojada graficamente falando
chama a atenção com um morcego tenebroso e bizarro que parece mesmerizar,
hipnotizar quem o olha com requintes de detalhes.
Claro coloquei os fones de
ouvido, lembro-me bem, com a ansiedade de uma criança que ganha o seu primeiro
brinquedinho e os acordes se fizeram ouvir, adentrando os ouvidos e impactando,
de forma avassaladora, diria arrebatadora, o coração, a alma. Um hard rock
poderoso, envolvente, cru, seco, o famoso “direto ao ponto”. A banda se chama
PRIMEVIL, baseada na cidade de Indiana, EUA, e o álbum, único da banda,
chama-se “Smokin' bats at Campton's”, gravado em 1974.
Mas como muitas bandas
obscuras e sem nenhum apoio não conseguiu lançar à época esse trabalho, sendo
engavetado, talvez pelo fato do álbum não ter sido bem digerido pelas
gravadoras que, com medo de uma sociedade conservadora, bem como alguma parcela
dos “tais amantes do rock n’ roll” também são, decidiram não lançar o material.
Pois é leitores amigos, vai saber o motivo!
“Smokin' bats at Campton's”
é um album poderoso, pesadão, um legitimo hard rock setentista, mas se percebe
uma “sopa sonora” que adiciona rock psicodélico, algumas viagens de teclados,
músicas acústicas e agressivas convivendo em um trabalho arrojado e
revolucionário.
Por que digo revolucionário?
Respondo: o álbum foi relançado anos depois, mais precisamente em 2006, no
formato CD pelo selo Outer Limits Of Sound e uma frase estava ligada a esse
álbum ou quando ele é mencionado por fãs garimpadores dessa pepita de ouro que,
na realidade, tem um caráter de afirmação: “A Touchstone of Stoner Rock”. A
pedra fundamental do stoner rock! Será? A cena stoner, tão em evidência
atualmente, com tantas bandas na ativa teria, mesmo que inconcientemente, bebido da água do Primevil? Seria o Primevil a pedra fundamental do
stoner rock?
É sempre muito difícil pontuar
uma situação dessas, levando em consideração o surgimento, antes, inclusive, de
várias outras bandas com a mesma pegada do Primevil, mas ouvindo “Smokin' Bats
at Campton's” reconheci, falo por mim, essa sonoridade em um caráter
embrionário! Sem sombra de dúvida encaro esse trabalho como um proto stoner!
Mas tentemos falar um pouco
do álbum antes dos comentários “faixa a faixa”. E comecemos com uma curiosidade
que, no mínimo vai contra os conceitos conservadores. O título do álbum faz
referência ao consumo de maconha na casa do vocalista do Primevil, Dave Campton.
Pois é sempre as bandas fazendo referências as drogas e as tendo como
inspiração para as suas composições, entre outras coisas, sendo destrutivo ou não.
Ah já que falamos do
vocalista da banda, Dave Campton, façamos a escalação do resto da banda que
gravou esse único registro de estúdio: Mel Cuppa na bateria, Larry Lucas na
guitarra, violão e vocal, Mark Sipe no baixo e Jay Wilfong na guitarra e sintetizador
(teclados).
E pelas imagens da banda à
época se percebe que eram jovens, muito jovens, eles ainda estavam na
adolescência, não podiam sequer sair da cidade sem a autorização dos seus pais,
seus responsáveis. E é incrível que, ao ouvir seu álbum, mostra um Primevil
forte, poderoso e visceral, faziam um som de gente grande.
Smokin' bats at Campton's é
complexo, mas cru, traz momentos de Black Sabbath, com o peso, de Led Zeppelin
com o viés prsicodélico, solos de guitarra de tirar o fôlego, bateria funkeada
e marcada, baixo pulsante e um vocal alto, gritado, as vezes. Um álbum a frente
de seu tempo, certamente.
A faixa de abertura, “Leavin’” começa com uma passagem acústica, vocais suaves, violão dedilhado ao fundo, mas não espera uma faixa inteiramente lenta, porque explode com riffs desconcertantes de guitarra sendo acompanhado por uma batida forte de bateria e um baixo frenético. Os solos de guitarra vão e voltam, o hard rock irrompe de forma desbundante.
“Progress” já começa com o
pé na porta! O baixo meio “funky”, bem dançante, a bateria, forte, segue no
mesmo compasso, a guitarra ao fundo disparando seus riffs e solos
desconcertantes, talvez uma guitarra gêmea à la Wishbone Ash se percebe nessa
excelente faixa.
A faixa seguinte “Fantasies”
começa discreta, suave, lenta, com um doce instrumental capitaneado pelo
violão, trazendo referências de country, de música sulista, mas que vem com a
guitarra ácida e psicodélica dando uma textura sonora mais complexa, sim, essa
é a faixa mais complexa do álbum. Vai ao longo do tempo ficando mais pesada
graças aos solos de guitarra. Grande música!
“Pretty Woman” é dançante
até o osso! Não há como ficar parado ao ouví-la! Impressionante a qualidade
musical desses moleques, uma introdução meio “jazzy”, mesclado a um funky,
colocando tudo isso no caldeirão do hard rock com o tempero dos solos de
guitarra de tirar o fôlego, com vocais competentes e sóbrios.
“Tell Me If You Can” traz o
vocal rouco e potente como destaque, bem como riffs sujos de guitarra remetendo
a um heavy rock, a um proto metal de vanguarda, com velocidade e muito, muito
peso.
“High Steppin' Stomper” traz o classic e necessário hardão setentista ao álbum, mas com aquela levada funkeada de novo, o peso, mais uma vez, aliado ao fator dançante que faz desse álbum algo carismático aos ouvidos e alma. Destaque, mais uma vez, para os vocais muito competente, gritados e de grande alcance.
E a derradeira faixa que fecha
este excepcional mostra mais uma faceta dos gratos de Indiana: o blues! Um
blues rock de altíssima qualidade, mostrando que a banda tinha recursos! Algo
meio lamentoso tem nessa música, trazendo a essência do estilo que logo
descamba para um solo de guitarra extremamente competente e dedicado. A “cozinha”
em total sinergia com a atmosfera da música, tudo conspirou a favor nessa
faixa. É a verdadeira “música de banda”, onde todos participam de forma intensa
e incondicional.
“Smokin' Bats at Campton's” é uma relíquia, um petardo sonoro que trouxe hard rock, rock psicodélico, blues e protos toner de bandeja para os aficionados pelos estilos. Mais algumas curiosidades acerca do álbum: foi gravado durante a noite, acreditem, no New Palestine Studio, de propriedade de Moe Whittemore.
E reza a lenda de que as pouquíssimas cópias geradas, cerca de 1.000, dessa gravação circularam, de forma irregular e não oficial em alguns poucos pontos de Indianápolis, mas que um brechó local ganhou alguma reputação por ser o local que abrigou varias cópias dessa gravação, mas que não gerou muito rebuliço. Hoje materiais como esse poderiam ser disputados a tapa por colecionadores ávidos por aí espalhados nesse mundão.
Depois de um relançamento em 2006, o álbum teve novo relançamento, em 2007 pelo selo Radioactive Records. Você pode ler uma entrevista da banda para a “Psychedelic Baby Magazine” neste link: Primevil | Interview | “Hard rock monster from Midwest”. Altamente recomendado!
A banda:
Dave Campton nos vocais,
percussão
Mel Cuppa na bateria
Larry Lucas na guitarra,
violão, vocais
Mark Sipe no baixo
Jay Wilfong na guitarra,
sintetizador
Faixas:
1 - Leavin'
2 - Progress
3 - Fantasies
4 - Pretty Woman
5 - Tell Me If You Can
6 - Hey, Lover
7 - High Steppin' Stomper
8 - Your Blues
Nenhum comentário:
Postar um comentário