Costuma-se dizer que determinadas
bandas assume uma personalidade sonora em estúdio e outra ao vivo, nos palcos.
Algumas se sobressaem primorosamente ao vivo, no palco, mostrando nuances de
improviso, mais peso, mais substância, outros se mascaram na tecnologia do
estúdio e se mostra incipiente nos palcos, entre outras particularidades.
A banda germânica NOVALIS mostra-se
grandiosa em estúdio e principalmente ao vivo, é o que revela o excepcional
registro ao vivo chamado “Konzerte” gravado em abril de 1977. A banda havia
passado por várias modificações desde o lançamento de seu debut “Banished
Bridge”, de 1973, sofreram as tormentas de mares revoltos da incerteza, não
obtiveram êxito comercial nos seus álbuns de estúdio lançados em um passado não
muito distante.
A banda esteve a ponto de findar suas atividades. Mas, a partir de seu segundo álbum, “Novalis”, de 1975, a banda começou a se situar musicalmente falando, com uma temática sinfônica que passaria a se tornar popular na Alemanha em meados da década de 1970, passando a cantar na sua língua mãe, o alemão, mas não obteve aquele êxito comercial que se esperava, de que eles, enquanto banda aspirava, mas ganhou certa credibilidade em sua terra, na Alemanha, embora alguns ditos “formadores de opinião”, alguns pseudos especialistas digam que a banda não impactou na cena musical local.
Mas foi sim, graças ao Novalis que essa cena frutificou, sendo o Novalis um pioneiro no estilo naquele país. A mudança interna, que poderia trazer certa insegurança e gerar descaracterizações, não ocorreu, a banda encorpou, encontrou-se com a sua identidade, adquiriu personalidade sonora, amadureceu, o mérito criativo chegou com o esforço e o empenho, juntamente com o risco de que não tinham nada a perder e o resultado está estampado em “Konzerte”, onde a banda, em seu estágio natural, vívido, apresenta clássicos de seus álbuns anteriores, de suas grandes obras, sem sujar a sua história, a sua essência.
O álbum “Konzerte” sinaliza a vocação progressiva do Novalis, nos brindando com músicas do calibre de “Sommerabend”, uma linda suíte de quase dezenove minutos; as viajantes e instrumentais, “Es Färbt Sich Die Wiese Grün” e "Impressionen" e “Wunderschätze”. Verdadeiras pérolas do progressivo sinfônico, do clássico e reverenciado Novalis que merece uma parte na história da música progressiva. Os heróis dessa façanha sonora foram: Fred Mühlböck nos vocais, guitarra acústica e elétrica e flauta, Detlef Job na guitarra elétrica e vocais, Lutz Rahn nos teclados, hammond, moog, piano e clavinet, Heino Schünzel no baixo e Hartwig Biereichel na bateria.
E esse registro ao vivo do
Novalis contara com estreia do vocalista austríaco Fred Mühlböck. E ele de fato
tinha uma presença vocal, foi uma grande aquisição para o Novalis à época. Ele traz
dramaticidade às músicas, sem soar chato e histriônico demais, dando peso e
força a banda e também é um multi-instrumentista, tocando guitarra e flauta em
algumas faixas de “Konzerte”.
Analisando esse registro como um disco, um vinil, o primeiro lado de “Konzerte” traz 70% do grande álbum “Novalis”, de 1975 e o outro lado entregam 70% do álbum que deu alguma visibilidade a banda: “Sommerabend”.
Talvez pudesse ser incluído algo de “Banished
Bridge”, debut da banda de 1973, que fiz, inclusive, uma resenha que pode ser
lida aqui, mas talvez quisessem se desvencilhar dessa curta fase de sua
história pelo simples fato de cantar as músicas em inglês, mas as faixas
escolhidas caíram como uma luva para versões ao vivo.
E o grande destaque fica
para os momentos de improvisação, trazendo novos olhares e sentimentos aos
ouvintes da música, sendo também impactadas pelas novas formações musicais dos
novos integrantes da banda fazendo com que o Novalis trouxesse em sua textura
sonora, além do já característico progressivo sinfônico, umas pitadas
generosas, diria, de hard rock tudo envolto em uma camada complexa e linda de
som.
“Konzerte” sinaliza um
Novalis progressivo, fincado nos teclados, tendo a guitarra a função de trazer
a harmonia e o corpo às músicas, a força e o peso de hard rock sofisticado, bem
delineado no que tange às melodias.
Mas a improvisação, como destaque de “Konzerte” traz um Novalis mais cru, mais direto e revelam músicas mais arrojadas, com um caráter mais irreverente e poderoso.
Depois de uma introdução que é uma amostra do bolero de Ravel a banda começa com a curta, porém significativa instrumental “Dronsz” que tem como destaque um riff intenso e pesado de órgão com a guitarra dando a sustentação necessária criando uma salutar “rivalidade”.
E aí depois desse “pequeno aperitivo” começam os verdadeiros exemplos de épicos sinfônicos personificados em faixas como “Es färbt sich die Wiese grün” com aquela introdução de teclado obscura, contemplativa, introspectiva com o vocal quase que em evidência, que depois irrompe em uma explosão sonora de guitarras em solos curtos mas envolventes e bateria marcada e baixo pulsante.
Segue com “Impressionen” que
remete ao krautrock mais viajante, psicodélico, algo de Pink Floyd, aliando a
lisergia a complexidade do progressivo, com algo solar, poderoso, pesado que
vai crescendo, se manifestando de forma espetacular, o solo da guitarra é forte
e evidente, entre solos de flautas e uma bateria meio jazzy. Que faixa caros
leitores!
“Wer Schmetterlinge lachen
hört” traz o seu inconfundível teclado introdutório muito típico da discografia
do Novalis e o vocal alto, potente e dramático aparece em destaque e que ganha,
mais uma vez peso, com a guitarra em solos curtos e diretos, mas cheios de
vida. Psicodelia e prog rock em perfeita sinergia aparecem novamente.
“Wunderschätze” tem, mais
uma vez nas teclas, o seu destaque. Aquela atmosfera contemplativa e viajante enche
de satisfação os ouvidos e alma de qualquer ouvinte. Uma balada linda, com
dedilhados de guitarra que faz te tirar os pés do chão involuntariamente, de
faz viajar de forma plena e delicada. Uma sonoridade delicada sim, mas traz a
força e o corpo sonoro de uma banda infalível para a história do rock alemão.
Uma performance arrepiante!
E eis que finaliza com “Sommerabend”,
o clássico da banda tocada na sua plenitude, cada nota executada integralmente,
tudo estava ali diante dos ouvidos e olhos daqueles que estiveram neste show,
alvo de minhas linhas neste blog, e para aqueles que ouviram e ouvem até hoje nos
formatos de lançamento de “Konzerte”. Um épico, um desfile de como se tocar
rock progressivo na sua mais fiel essência: dramaticidade, complexidade, um som
encorpado, delicado, poderoso, cheio de variâncias rítmicas, vocal de excelente
alcance, guitarras explodindo em solos elaborados, teclados complexos, tudo
conspirou a favor dessa faixa em sua versão ao vivo. Que clássico obscuro!
As músicas do Novalis
definitivamente te fazem levitar e te deixar em total estado de êxtase. Talvez “Konzerte”
tenha sido o último grande lançamento discográfico do Novalis, o trabalho que
fecha a história honrosa de uma banda que sempre soube defender a sua verdade
sonora sem amarras de indústria fonográfica e de estereótipos que escravizam
músicos e bandas.
A banda:
Hartwig Biereichel na
bateria
Detlef Job na guitarra e
vocais
Fred Mühlböck nos vocais,
guitarra e flauta
Lutz Rahn - Hammond H100 organ, PPG synth, Mellotron, piano
e clavinet.
Heino Schünzel no baixo e
vocal
Faixas:
1 - Bolero (Ravel)
2 - Dronsz
3 - Es färbt sich die Wiese grün
4 - Impressionen
5 - Wer Schmetterlinge lachen hört
6 - Wunderschätze
7 – Sommerabend
...a) Wetterleuchten
...b) Am Strand
...c) Der Traum
...d) Ein neuer Tag
...e) Ins Licht
Nenhum comentário:
Postar um comentário