quarta-feira, 5 de janeiro de 2022

Spettri - Spettri (1972/2011)

 


O rock progressivo italiano é singular. Embora essa afirmação seja óbvia para muitos, ela se faz presente e renova a cada dia quando se descobre bandas obscuras daquele país. Bandas antigas que ganham a luz do dia graças a velocidade das informações protagonizadas pelas redes sociais e a internet que encurta o caminho entre o ouvinte, ávido por explorar novas possibilidades sonoras, e algumas abnegadas gravadoras que redescobrem algumas bandas e promovem o renascimento de suas sonoridades sempre ricas e com peculiaridades avassaladoras, transgressoras e repleto de vanguardismo.

E o pilar do vanguardismo transgressor das bandas obscuras está no teor dos temas que abordam. Temas estes que pouco palatáveis para a sociedade conservadora, para o status quo. As mazelas humanas são expostas, as feridas precisam continuar abertas, mostrando as entranhas de uma sociedade, cuja gênese guarda o que há de mais violento e odioso personificado nos seus instintos mais primitivos.

As bandas obscuras são obscuras porque são marginais, não venderam seus princípios, não corromperam sua arte que, por mais marginal que seja, culmina com a identidade de muitos ouvintes que tem no seu DNA a inquietude da sua indignação com o mundo que vivemos. A obscuridade progressiva italiana traz uma homérica riqueza qualitativa e quantitativa e mostra o quão ainda é inexplorado.

E não podemos deixar de falar da história do SPETTRI. Apesar de ser uma banda pouco conhecida da Itália progressiva, o Spettri sintetiza com veemência a história do rock progressivo desde o início dos tempos, porém com pontos incomuns em sua sonoridade que faz com que seja diferente, maravilhosamente diferente.

A banda foi formada na cidade de Florença no longínquo ano de 1964, pelos irmãos Ugo e Raffaele Ponticiello, vocal e guitarra, respectivamente, Stefano Melani nos teclados e hammond, Giorgio Di Ruvo na bateria e o outro mais jovem do clã dos Ponticiello, Vincenzo, no baixo.


Era praticamente um trabalho em família. A banda, quando fora formada, em meados da década de 1960 praticava o beat, muito comum naquela época na Itália, baseada na música psicodélica norte americana e britânica, mas com um viés pop, comercial e acessível e lançou alguns EP´s e, a título de curiosidade, passou pelo Spettri o baterista Mauro Sarti que, em 1968, sairia dando lugar a Di Ruvo. Sarti tocaria em outra obscura banda chamada Campo di Marte.

Outra mudança fora no baixo, onde Guiseppe Nenci ficou em curto período de tempo, dando lugar ao irmão mais novo de Ugo e Raffaele, Vincenzo, isso em 1971. As muitas mudanças na sua formação foi a tônica da banda, bem como na sua sonoridade também.

No início da década de 1970 a banda sai do beat e direciona o seu som para uma proposta mais pesada, com uma atmosfera densa lembrando Black Sabbath, com um destaque para os riffs poderosos de guitarra e hammond da pesada remetendo a bandas como Deep Purple e Uriah Heep.

É nesse período que a banda muito produz, tendo material suficiente para gravar um álbum. Em 1972 a banda produz o seu álbum, o “Spettri”, porém, como em muitos casos em que as bandas como uma sonoridade pouco ortodoxa ou ainda sem nenhum patrocínio, esse trabalho não foi lançado oficialmente naquele ano, tendo a luz, saindo da poeira do baú do esquecimento do rock apenas em 2011 graças ao abnegado trabalho do selo Black Widow Records.


O álbum traz o peso e a agressividade primitiva e toscamente mal produzido que traz todo o charme da banda. Neste álbum torna-se perceptível aos ouvidos influências experimentais de bandas como King Crimson e Collosseum, dando-lhe um caráter mais progressivo.

O álbum, conceitual, fala da busca de um homem pelo auto entendimento por intermédio de introspecções metafísicas e também fala sobre o egoísmo e a hipocrisia da sociedade e a destruição existencial da humanidade e a faixa inaugural, “Introduzione”, revela isso, com a fala deste homem.

Na sequência vem a faixa “Prima Parte: Stare Solo” o rock explode com riffs poderosos e hammonds em profusão, uma verdadeira paulada hard prog.

"Prima Parte: Stare Solo" - Live in Firenze (2013)

“Seconda Parte: Medium” arromba a porta com um senhor hard rock com passagens rítmicas de tirar o fôlego, mostrando as raízes do hard prog na Itália. 

“Terza Parte: Essere” começa atipicamente lenta, com dedilhados em violão, introspectiva, trazendo referências de um longínquo King Crimson psicodélico, mas é por pouco tempo, pois a música vai ganhando corpo, com riffs esmagadores e hammond frenético, a música ganha peso, com destaque para o vocal, tenso e altivo.

O álbum fecha com “Quarta Parte: Incubo”, segue o peso com a cozinha poderosa, com linhas de hammond excelentes e passagens entre o peso e calmarias que se conectam perfeitamente a atmosfera deste clássico álbum esquecido.

O Spettri fez grandes shows com bandas influentes do estilo até se desfazer em 1975 que, segundo seus integrantes o motivo fora a indiferença pública em relação a sua proposta sonora. Um álbum cru, tosco, marginal, poderoso, avassalador, transgressor, um diamante bruto que foi lapidado nos dias atuais.


A banda:

Ugo Ponticiello no vocal

Raffaele Ponticiello na guitarra acústica e elétrica

Stefano Melani no Hammond L100

Vincenzo Ponticiello no baixo

Giorgio Di Ruvo na bacteria

Faixas:

1 - Introduzione

2 - Prima Parte: Stare Solo

3 - Seconda Parte: Medium

4 - Terza Parte: Essere

5 - Quarta Parte: Incubo




 

 






 





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