terça-feira, 16 de junho de 2020

Osanna - L'Uomo (1971)


O vasto e rico rock progressivo italiano merece ser explorado de forma latente e visceral. A cada voo alçado na velha bota uma velha nova história é descoberta e a banda que falarei hoje foge um pouco o convencionalismo sinfônico que permeia a cena italiana progressiva. Como Il Balletto Di Bronzo, temos outros grandes nomes do hard progressivo dignos do peso que ostentam em sua música. Mas do peso das guitarras, dos riffs poderosos, de solos agressivos, fluía também a natureza plena e altiva da complexidade do rock progressivo e do folclore italiano e uma dose sombria de música pagã, marginal como deve ser o rock na sua mais genuína expressão. Falo de uma das mais emblemáticas bandas da cena progressiva italiana de todos os tempos: Osanna. A dica é o seu debut chamado “L’Uomo”, de 1971. 

"L'Uomo"

Como muitas bandas italianas surgidas entre o fim dos anos 60 e o início da década de 70, o Osanna mostra um beat cheio de psicodelia, música pop, classic rock e um progressivo ainda em processo embrionário enquanto música, cena e cultura. Mas o Osanna, além das características citadas, mostra uma força sonora, calcado no hard rock cru, mesclado com a flauta em nuances de suavidade e caos, saxofones frenéticos, cheios de corpo e substância, com um pouco de um jazz fusion e música clássica também. O que poderia soar algo desconexo, tudo se encaixa fantasticamente bem. Uma das poucas bandas de sua época que tiveram a capacidade de criar um estilo inovador e memorável. “L’Uomo” trazia o frescor da nova música que nascia na Itália, é a pedra fundamental de sons que se flertavam, se retroalimentavam, como o prog rock, o hard rock, o folk rock, era uma sinergia que se personificava também em um aspecto teatral, cênico, com os seus músicos com máscaras, com vestimentas coloridas, talvez resquícios do hipismo, aliado ao peso e a agressividade de uma música intrincada e complexa A história do Osanna começa na cidade de Nápoles no final da década de 60, surgido das sombras do Monte Vesúvio, em uma região chamada Vomero, entre becos lotados, onde o medo, a violência, a pobreza era evidente nos olhos e na pele. Foi nesse ambiente que a música do Osanna foi edificada. O Osanna foi construído a partir da banda local I Volti Di Pietra com Lino Vairetti no vocal, Carlo Fagiani na bateria, Enzo Petrone no baixo e Lino Ajello na guitarra. O nome mudou para Cittá Frontale, nome retirado de um livro do escultor abstrato da Sicília Pietro Consagra. Desde 1969 a banda vinha sofrendo com os intensos rodízios de músicos mas que, a partir dessas intensas mudanças a formação umbilical do Osanna estava nascendo. Fagiani é substituído por Massimo Guarino, Petrone também abandona a banda dando lugar a Lello Brandi e Lino Ajello também decide sair indo para o Il Balletto Di Bronzo, dando lugar a Danilo Rustici. O saxofonista Elio d’Anna, que era de outra banda local, de Nápoles, Showmen, estabilizaria a formação do jovem Osanna.

Osanna

A banda atraiu muita publicidade e atenção ao subir nos palcos com vestimentas romanas e os rostos pintados, mostrando seus dotes artísticos não apenas pela música, mas pela parte visual, teatral e estética, tanto que alguns grupos de teatro colaboraram com a banda neste quesito estético transformando seus shows em verdadeiras performances cênicas o que era totalmente novo e revolucionário naquela época na Itália. O Osanna ganhou alguma fama e foi considerada como uma das melhores bandas no Festival Pop de Caracalla. Nessa época o Gênesis se apresentou na Itália e o Osanna os acompanhou abrindo seus shows o que facilitou a vida da banda para atingir certa visibilidade. A formação do Osanna em “L’Uomo” tinha: Lino Vairetti no vocal, harmônica, hammond, sintetizador e guitarra, Danilo Rustici na guitarra, Elio D'anna  na flauta e saxofone, Lello Brandi no baixo e Massimo Guarino na bateria e percussão.

Osanna com seus rostos pintados

O álbum é inaugurado com a sugestiva faixa “Introduzione" com um violão suave, sintetizadores em uma atmosfera contemplativa, depois surge o baixo, bateria, guitarra e gaita em uma crescente agressiva, pesada, o hard rock de braços com o progressivo em uma mescla mais do que perfeita.

Osanna - "Introduzione"

“Introduzione” leva a faixa título, “L’Uomo” que, diante de uma apresentação de guitarras acústicas, uma balada inicial com o vocal limpo e dramático de Lino Vairetti, irrompe em frenéticas notas de saxofone com interlúdios de flauta e gritos de “Hosana”! Uma letra que fala de criação, de vida. Seus versos iniciais dizem por si só: "O homem, a terra, o céu e o mar / Criar, criar, criar em todos os lugares / O sol, a luz, o frio e o calor / O amor, o amor, o amor em todos os lugares."

Osanna - "L'Uomo"

A fusão de música clássica, de hard rock é perceptível em faixas como “Mirror Train” que nos mostra um hardão nos riffs de guitarra, com uma mistura de jazz rock e folk com uma flauta a la Ian Anderson cheio de energia e força. E como toda grande banda de rock italiana dos anos 1970 tem de ser politizada e se posicionar de forma corajosa. A música termina com as notas do hino comunista "Bandiera Rossa", com uma guitarra distorcida e raivosa, lembrando Jimi Hendrix, uma das referências do Osanna que dizia: "Mente para onde você está indo / Se você quiser fazer / Nunca olhe para trás”.

Osanna - "Mirror Train", Live at Napoles (2012)

“Non Sei Vissuto Mai” vem poderosa, varrendo tudo que vem pela frente, um típico e poderoso hard rock, cadenciada por doces flautas, em uma pegada mais psicodélica e folk, mas que logo se encorpa com o peso dissonante das guitarras de Danilo Rustici e o vocal rasgado de Vairetti.

Osanna - "Non Sei Vissuto Mai", Live (1973)

Temos a avassaladora “Vado Verso Una Meta” com um riff pegajoso, mas muito competente de guitarra e uma cozinha de tirar o fôlego, certamente a mais hard do álbum. 

Osanna - "Vado Verso Una Meta"

“In Un Vecchio Cieco” começa com um solo de bateria que descortina uma sonoridade bem folk e suave ao som de um violão acústico, uma balada bem viajante, mas depois nos mostra o poder sonoro e caótico de um saxofone louco e o riff de guitarra que combina com essa loucura toda me remete ao King Crimson dos primórdios.

Osanna - "In Un Vecchio Cieco"

Temos a poderosa balada chamada “L'amore Vincerà Di Nuovo” com destaque expressivo da flauta de Elio D'anna, com dedilhados de guitarra que, entre riffs mais pesados traz todo o clima intenso de um clássico, de um hino, com o vocal poderoso de Vairetti.

Osanna - "L'amore Vincerà Di Nuovo"

“Everybody's Gonna See You Die” é a faixa mais solar do álbum, animada começa com riffs de guitarra pesados, uma faixa cantada em inglês, com uma intensa velocidade com um excelente desempenho vocal. Um hardão setentista com direito a solos de guitarra e flauta tocada mais freneticamente.

Osanna - "Everybody's Gonna See You Die"

E para fechar o álbum “Lady Power” dando sequência a faixa anterior que também é cantada em inglês. Um verdadeiro petardo, uma catarse sonora com solos criativos e pesados de Rustici, flautas arrebatadoras de Elio D’Anna, cozinha bem afiada e sinérgica com um baixo pulsante de Lello Brandi e uma bateria forte e marcada de Massimo Guarini. Uma hecatombe instrumental!

Osanna - "Lady Power"

Não se pode falar da história do hard rock e do progressivo italiano sem passear pelas notas, arranjos e melodia de “L’Uomo”. Já neste álbum torna-se perceptível um Osanna já maduro e com uma identidade musical plenamente definida que viria a se consagrar em “Palepoli”, por exemplo. Um grande álbum que representa com maestria o gênese do progressivo italiano pelo seu compromisso visual, criativo e social e claro, sonoro.



A banda:

Lino Vairetti no vocal, 12-string guitar, harmonica, Hammond  e sintetizadores
Danilo Rustici na guitarra e pipe organ
Elio D'anna na flauta e saxofone
Lello Brandi no baixo
Massimo Guarino na bateria e percussão

Faixas:

1 - Introduzione
2 - L'uomo
3 - Mirror Train
4 - Non Sei Vissuto Mai
5 - Vado Verso Una Meta
6 - In Un Vecchio Cieco
7 - L'amore Vincerà di Nuovo
8 - Everybody's Gonna See You Die
9 - Lady Power 













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