O frio dos países nórdicos
está, felizmente, restrito ao clima. O rock n’ roll pega fogo com as bandas que
lá brotam, com o perdão da analogia infame e sem criatividade. A riqueza sonora
é grande, que varia do virtuosismo, complexidade à rusticidade e aspereza.
Há
para todos os gostos! Essa que tomará algumas linhas desse texto é muito rara,
pouquíssima conhecida e vem da Dinamarca, da cidade de Randers, e se chama
CINDERELLA. Não se enganem essa não é aquela banda de glam metal ou vulgarmente
conhecida como “heavy metal farofa” que proliferou na segunda metade da década
de 1980 que os músicos vestidos de mulher e com a cara repleta de maquiagens,
numa androgenia que invadiu a MTV.
O Cinderella dinamarquês, além de ter sido o
original, o primeiro, surgida em 1970, tinha um som cru, pesado, agressivo e
direto. Um hard rock viril, intenso e vigoroso. Embora na capa esteja estampada
que o Cinderella era uma banda dinamarquesa de rock progressivo, em nada tinha
de prog rock e talvez tenha usado o título de banda progressiva para ter um
pouco de publicidade, haja vista que o rock progressivo estava nascendo no
início daquela década e ganhando alguma notoriedade e adeptos.
O som é pesado, com guitarras distorcidas, riffs em abundância, envolto em uma
atmosfera psicodélica, ácida e chapante capaz de deixar o ouvinte mesmerizado,
louco e arrebatado por uma música poderosa.
É evidente as influências de Jimi
Hendrix, Led Zeppelin entre outras bandas pesadas da transição dos anos 1960 e
1970. Era um power trio que tinha a seguinte formação: Allan Vokstrup
(bateria), Henning Kragh Pedersen (guitarra, vocais) e Søren Hilligsøe (baixo,
vocais).
Poucas são as informações sobre como a banda surgiu e foi formada, bem
como o histórico de seus integrantes, mas o seu primeiro álbum, de 1970, não
fora lançado na época, foi apenas produzido e gravado naquele ano. Chegaram a lançar um single de nome "The Sandbox Series", em 1970, mas o álbum empacou.
Em 1972 os master tapes
foram perdidos quando a gravadora Spectator Records sofreu um incêndio
embargando o lançamento. Mas as tais fitas ainda existiam e foi descoberta em
1990 quando alguns jovens estudantes de música faziam uma pesquisa sobre o rock
dinamarquês e as encontrou! O “Danish Progressive Rock 1970”, como foi chamado
foi lançado 20 anos depois de sua gravação. Com a redescoberta deste material a própria Spectator Records lançou o álbum do Cinderella.
Este álbum não goza de boa
qualidade na gravação e tudo leva a crer que foi gravado ao estilo “alive in
studio” e é inaugurado com a faixa “Break Song-Red House” com um solo de
bateria e um baixo pulsante, a cozinha super afiada, seguido de uma guitarra
meio bluesy, com passagens jazzísticas que se alternava no hard rock. Um
espetáculo instrumental transborda! Parecia-me um momento de improvisação, de
libertação criativa total, sem amarras.
"Break Song - Red House"
“Carlt” traz uma envolvente percussão,
meio tribal, psicodélica, uma música cheia de candências, o peso é deixado de
lado, uma sonoridade ácida, lisérgica, resquícios dos áureos momentos do flower
power, mas um tanto quanto indulgente e arrogante.
"Carlt"
“Parchman Farm”, o clássico
do blues, de Mose Allison, também está no line up e que foi gravado por muita
gente do rock, como o Cactus, por exemplo. Na versão do Cinderella entrega um
blues mesclado a um rockabilly, algo bem dançante e solar. Ótima versão!
"Parchman Farm"
“Sexbombe”
já entrega de cara solos de guitarra arrasadores com uma bateria carregada de
jazz, soa um pouco comercial, mas de grande qualidade. “Fire”, o clássico
eternizado na voz de Jimi Hendrix, e que faz jus ao nome, quente, sedutora e
poderosa! O Cinderella não trouxe novos arranjos, novidades, sendo fiel a
original, mas a executando com precisão e qualidade.
"Fire"
“Ana-T-Nas” começa ao estilo Cream, um proto metal, um heavy metal de vanguarda, já esmurrando a porta com bateria pesada, baixo pulsante e alto, solos distorcidos de guitarra, um verdadeiro arrasa quarteirão. A cozinha arrasa nesta faixa! Baixo e bateria em uma sinergia incrível!
"Ana-T-Nas"
“Mr. Wild” fecha o disco, curto, com pouco mais de trinta
minutos, com um solo de guitarra ao estilo surf music inaugurando a faixa, a
sensação é de ser levado gentilmente pelas ondas calmas, com o vocal finalmente
revelando seu valor. Parece outra banda, dada a versatilidade personificada nessa faixa que finaliza, com chave de ouro, essa pérola sonora.
"Mr. Wild"
Um álbum excelente e que graças ao acaso ganhou a luz,
nasceu para o mundo há 30 anos atrás. Em 1971 um segundo álbum fora gravado na
cidade de Copenhague com Pete Quaife como produtor.
Este material permaneceu
inédito na época e finalmente também viu a luz, mas apenas em 2006, e que você pode fazer o download neste link. Isso se deve a
gravadora Karma Music em uma espécie de compilação, com as faixas originais de
1970 com algumas versões de músicas ao vivo recebendo o nome de “Udkoksning I Tre Satser”.Outro registro essencial que vale a
audição.
Bandas obscuras, esquecidas, relegadas a própria sorte... Deem o nome que quiserem, mas o que poderia se taxado de fracasso no passado, hoje, ao ouvirmos, nos arrepiamos e chegamos a acalentadora constatação de que bandas como o Cinderella deixaram uma marca indelével para a história da música pesada em todos os tempos. Uma referência! Uma pérola perdida e altamente recomendada!
A banda:
Henning Kragh Pedersen na
guitarra e vocal
Søren Hilligsøe no baixo e
vocal
Allan Vokstrup na bateria
Faixas:
1 - Break Song incl. Red House
2 - Carlt
3 - Parchman Farm
4 - Sexbombe
5 - Fire
6 - Ana-T-Nas
7 - Mr. Wild
Cinderella - "Danish Progressive Rock" (1970 - 1990)
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