Sabe aquelas bandas, de
caráter e reputação regional, que, quando descobrimos e ouvimos nos orgulhamos
de gostar dessa música extraordinária que é o rock n’ roll? O que, para muitos,
pode parecer algo deveras ortodoxo e muito linear, o rock n’ roll é híbrido e
tem as suas bases em diversos estilos, como gospel, rockabilly, jazz, blues,
música tribal africana, entre outros.
E por que falo de orgulho?
Exatamente por isso! Pela inevitabilidade do rock! Sim, caros amigos leitores!
Ainda há, sempre teve, na realidade, bandas que nunca se renderam aos clichês
do estilo e dos rótulos que muitas almejam para ganhar um lugar ao sol no reino
fantástico da indústria fonográfica e o descartável e irreal sucesso.
E o caráter regional não é
demérito para banda alguma! Claro que, sob o aspecto comercial da coisa, a
banda perece, não foi competente, fracassou! Mas neste reles e humilde blog, as
bandas “fracassadas” reinam absolutas. Amamos o fracasso! Aqui as bandas
exprimem as suas verdades!
E a banda de hoje vem de longe, de uma região que sempre ganhou as manchetes pelas suas guerras, pelos conflitos locais, pelo ódio e a intolerância que esses eventos ocorrem, sobretudo pela questão perversa política e econômica: da Croácia, a ex-Iugoslávia.
Pois é, nobres leitores, da
Croácia! Fujamos um pouco das regiões centrais do rock n’ roll, para provarmos,
definitivamente, de que há vida, há rock em outros cantos desse planeta e de
boa qualidade!
E essa banda eu descobri, como sempre, em minhas incursões pela grande rede que, nesse aspecto, nos salva, graças aos abnegados que a usa para difundir a música de que amamos e achei a capa um tanto quanto indulgente, com os rostos dos integrantes em uma arte que os coloca em um plano um quanto divino, mas me interessou!
A música também se consome
com os olhos! Quando comecei a ouvir foi uma espécie de deslocamento da vida
cotidiana que me alçou para um plano melhor, de puro e genuíno prazer. Que
sonoridade pouco atípica, mas que se identifica, mesmo caindo nos clichês do
rótulo. Uma miscelânea improvável, mas que se encaixou divinamente.
Por isso que a minha saga
pelo mundo perdido da obscuridade do progressivo continua e me coloco em um
panorama viciante e saudável nos confins da música relegada ao vilipêndio, ao
ostracismo, das bandas obscuras, vítimas, sim, das circunstâncias
mercadológicas, do acaso ou do que quer que seja.
Mas sem mais delongas vamos às apresentações da croata SPEKTAR. Conhecem? Pois é, mais uma raridade que merece a luz. A banda veio, mais precisamente da cidade de Zagreb e se tornou muito conhecida naquela região, graças às suas apresentações ao vivo.
O Spektar foi formado no início de 1974 pelo compositor, tecladista e percussionista Enco Lesić que havia acabado de sair de uma banda chamada Indexi. O Indexi foi formado em Sarajevo, atual capital da Bósnia e Herzegovina, em 1962, e tocava beat psicodélico com viés popular que lançou vários compactos e EPs com covers e composições próprias, alcançando sucesso por vários países do leste europeu.
Lançaram apenas três álbuns,
o primeiro em 1972, com uma música, chamada "Sve ove Godine" que lhes
rendeu sucesso naquele mesmo ano. O segundo lançado em 1978 e o último em 1999.
Apesar de continuar em atividade nas décadas de 1980 e 1990, o Indexi gravou
muito pouco até se desfazer definitivamente em 2001.
O nome da banda, voltando
para o Spektar, foi inspirado em uma música do primeiro álbum do exímio
baterista panamenho Billy Cobham, de nome “Spectrum”, lançado em 1973, e também
uma faixa, na realidade uma sub-faixa, um fragmento da música “Searching For
The Right Door / Spectrum”. Spectrum significa espectro, em inglês que, por sua
vez, em croata, significa “spektar”.
O Spektar, quando lançou seu
único álbum, em 1974, tinha a seguinte formação: Davor Rocco no baixo, Dragan
Brčić na bateria, Neven Frangeš no piano e Enco Lesić nos teclados,
sintetizadores, mellotron e vocal. Frangeš logo saiu ao lançamento do álbum,
homônimo, para se dedicar a sua carreira acadêmica e no jazz, mas, de alguma
forma, continuou a colaborar com a banda no palco. Davor, além do baixo, também
produziu o trabalho do Spektar. Lesić, além dos teclados e
vocais, dedicou-se as composições das músicas do álbum.
Mas antes de lançar esse
trabalho o Spektar teve um caminho um tanto quanto, digamos, árduo, precisando
fazer alguns shows, provar a sua qualidade nos palcos para enfim chamar a
atenção de alguns empresários de gravadoras para finalmente documentar as suas
composições. E isso, de certa forma, aconteceu.
A recém-formada gravadora “Suzy”,
também conhecida pelo rico catálogo de licenças de estrelas do rock
internacional (selos como CBS e WEA) que eles lançaram na Iugoslávia,
obviamente queria promover uma banda de rock nacional sem muitos critérios de
seleção. Enco Lesić, que já havia deixado o Indexi depois de escrever seu
primeiro single de sucesso "Sve ove godine", provavelmente estava por
perto e com alguma reputação por conta do sucesso da música, definiram que ele
estava adequado para o “perfil” que procuravam, além da nova banda que ele
havia formado. E assim finalmente o debut fora lançado.
“Spektar” trazia um rock progressivo com elementos de jazz, funk e música clássica. Um som complexo, versátil, beirando o sofisticado, mas muito acessível graças ao rock n’ roll, cerne da sonoridade da banda. Outra peculiaridade, pelo menos para nós, do Ocidente e acostumados a ouvir bandas em inglês, do Spektar é que a banda canta em seu idioma natal.
O álbum abre com a música “Spektar I”, que tem uma levada funk bem dançante, que vale conferir, bem como a faixa que fecha o disco, “Spektar II” e “Vrisak Mora”, são certamente destaques do álbum.
Na sequência temos “Pjesmom Bih Htio Da Kazem” que começa em clima bem introspectivo sustentado pelo piano e um vocal bem obscuro.
“Ona Se Igra” tem uma levada bem radiofônica, bem comercial. “Dobri Kapetan” tem uma levada meio jazzística e bom desempenho vocal, que desemboca em um hard rock vigoroso que me remete ao Atomic Rooster, grande faixa.
“Mora” também traz o destaque do vocal com um belo alcance e potência, uma música viajante, com uma base de teclado excepcional. “Žene, Žene” segue a mesma linha de “Ona Se Igra”, bem pop e comercial.
“Spektar II” fecha o álbum
como começou com a predominância de teclas nervosas, bem dançantes e potentes
com uma levada jazzística ao estilo bem “roots”.
O Spektar, logo após o
lançamento do álbum, se desfez devido ao pouco sucesso e a baixa vendagem de
seu álbum. Brčić e Rocco tentaram reformular a banda meses depois sob o mesmo
nome e se unindo a outro tecladista, de formação clássica, Neven Franges.
Enco
Lesić construiu uma das carreiras de produtor mais bem-sucedidas em negócios
musicais na ex-Iugoslávia, mas faleceu, com 63 anos de idade, em 30 de julho de
2013.
Foi,
por exemplo, neste estúdio que foi gravado o álbum "Package
Arrangement", que incluía Idols, Electric Orgasm e Šarlo the Acrobat. Enco
Lesić também foi o produtor do álbum. Outras bandas que produziram em seu
estúdio, bem conhecidas na Sérvia, foram Ekaterina Velika e U Skripcu.
O
fato é que, bandas como Spektar, merece a luz e mostrar ao mundo verdadeiras
pérolas do rock progressivo que parecem, para nossa sorte, minar e que pedem
para se mostrar e, mesmo que, cronologicamente antigas, traz o frescor da
novidade e da perpetuação da música de que tanto amamos.
A
banda:
Enco
Lesić nos vocais, piano, Hammond, sintetizadores.
Davor
Rocco no baixo, guitarra e percussão
Dragan
Brčić na bateria e percussão
Convidados:
Nada
Zgur nos backing vocals
Simona Sterle nos backing vocals
Zvezdana Sterle nos backing vocals
Palmira
Klobas nos backing vocals
Alenka
Felicijan nos backing vocals
Zeljen
Klasterka na guitarra (Faixa 5)
Milan Ferlez na guitarra (Nas faixas 3 e 6)
Faixas:
1 - Spektar
I
2 - Pjesmom
bih htio da kazem
3 - Ona
se igra
4 - Vrisak
mora
5 - Dobri
kapetan
6 - Mora
7 - Zene,
zene
8 - Spektar
II
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