Atualmente ou diria desde
sempre muitos materiais esquecidos de algumas bandas, que, por algum motivo, caíram
no ostracismo, estão ganhando a luz, sendo lançados. Músicas inacabadas, demos
tapes, momentos de descontração dos músicos que foram captados etc, são
lançados com aquela promessa de algo inesquecível, com aquele discurso de
pérola esquecida.
Não se sabem os motivos
pelas quais essas músicas são lançadas: caça-níquel? Talvez! O dinheiro
ganhando relevância na indústria da música em detrimento da música. Para
amenizar a “dor” dos fãs, carentes, viúvos de materiais inéditos de suas bandas
preferidas? Bem possível! Alguns álbuns são lançados com aquele título de “edição
de colecionador”, pois sabem que, avidamente consumirão esses materiais.
Agora será que a qualidade
sonora é ou pelo menos deve ser colocada como possibilidade, haja vista que sobras
de estúdio, ensaios e momentos de descontração deve se pontuar com momentos de
criação, de criatividade? Quem sabe!
O fato é que não custa
conferir tais materiais e tirar as suas próprias conclusões, pois as percepções
de música são particulares, afinal o que pode ser ruim para alguns, pode ser
muito bom e proveitoso para outros. Mas será que somos influenciáveis? O que
quero dizer com isso? Será que, quando amamos uma banda e, claro, sua
sonoridade, quaisquer comentários e análises podem vir carregadas de fanatismo,
pela cegueira desmedida de “fã”.
Mas não quero aqui levantar,
o tempo todo, conjecturas, e deixar o meu depoimento textual de álbum que ouvi,
há algum tempo, que fez com que eu revisse os meus conceitos em relação a esses
álbuns.
Falo do segundo álbum da
banda italiana ALPHATAURUS chamado “Dietro L’Uragano”, lançado há trinta anos
atrás, em 1992. Conheci, como outras pessoas, o Alphataurus pelo seu estupendo
debut, de nome “Alphataurus’, de 1973 que, apesar de não ter tido aquela visibilidade
à época, atualmente está em um status de grande importância para a cena
progressiva italiana e que serve, sem dúvida de referência para muitas bandas
novas que surgem fortemente na Itália, sobretudo nos últimos 20 anos.
“Dietro L’Uragano” foram esboços,
alguns diriam “sobras” deste álbum de 1973 e que seriam usados para o novo
trabalho da banda que seria lançado naquela época, ou ainda composições que
estavam sendo empreendidas mas que, por algum motivo deixou de ser, essa última
é a história mais difundida na história obscura dessa grande banda que merecia,
à época, mais credibilidade pelo que produziu.
Esse que vos fala, ou melhor,
escreve, é um amante do Alphataurus e que, quando conheci seu debut foi como
que uma nova janela de perspectivas sonoras se abrindo diante dos meus olhos,
abrandando o meu coração e deleitando os meus ouvidos. E quando ouvi “Dietro L’Uragano,
afinal, nada mais natural, quando conhece uma banda e aprecia, você busca mais
materiais desta para se aventurar em sua sonoridade, foi igualmente
arrebatador.
Mas antes de mergulhar fundo
em “Dietro L’Uragano” falemos um pouco da história da banda. O Alphataurus Surgiu
na cidade de Milão, em 1970, e foi tida como uma das bandas obscuras que povoa
a cena progressiva italiana nos anos 1970.
Apesar de atingir essa
condição de banda desconhecida conseguiu um contrato com uma nova gravadora
chamada “Magma” e lançou seu primeiro grande álbum, “Alphataurus”, em 1973. Provavelmente
o conseguiu tal contrato por não ser conhecida e, como o selo era novo, estava
investindo em bandas novas e desconhecidas.
O fato é que “Alphataurus”
não conseguiu atingir o êxito comercial esperado apesar de apresentar todas as
características típicas do rock progressivo italiano: camadas fantásticas de
teclado, vocais dramáticos e bem elaborados, cantados em italiano, claro, uma
mistura excepcional de seções leves e pesadas, com viradas instrumentais de
tirar o fôlego, até levadas blueseiras e jazzísticas.
A formação da banda neste
álbum tinha Michele Bavaro, nos vocais, Guido Wasserman na guitarra, Pietro Pellegrini
no piano, hammond, vibrafone, moog, Alfonso Oliva no baixo e Giorgio Santandrea
na bateria.
Reza a lenda que, quando eles estavam se preparando para gravar o segundo álbum, que não tinha nome, ainda em 1973, onde Iniciara os trabalhos de composição, de produção do mesmo, ocorre algum infortúnio que ninguém sabe ao certo, a banda se separa, some da cena progressiva da Itália sem deixar rastros. Os vocais não foram gravados, não foram inseridos nestas composições e tudo indica que o vocalista abandonou a banda ou não teve tempo para gravar a sua parte. Tudo que girou em torno desse “esboço” foi em uma aura de mistérios e incertezas.
O projeto ficou inacabado,
não foi concluído. Foi esquecido. A banda finalizou as suas atividades,
precocemente. Os músicos seguiram, cada um, as suas carreiras individualmente. O
baterista Giorgio Santandrea esteve por um breve período na banda Crystals,
enquanto que o tecladista Pietro Pellegrini colaborou, entre outros, com
Riccardo Zappa e Premiata Forneria Marconi.
O vocalista Michele Bavaro gravou um disco solo, de viés comercial, no fim dos anos 1970, inclusive esse trabalho teve o foco de exportar a música italiana para o mercado sul americano, tendo visitado o Brasil, inclusive e cantado em algumas cidades, como Cuiabá e Belo Horizonte.
Em 1992, a gravadora Mellow
descobriu esse material esquecido, perdido e o lançou, quase dez anos depois do
lançamento de “Aphataurus” com o nome “Dietro L’Uragano” e digo, com toda a
força de minha alma e coração, de que este álbum, embora tenha uma carga de críticas
não muito boas, traz a força e a proposta sonora do Alphataurus, sobretudo
impressa no seu primeiro álbum.
As faixas bem elaboradas,
com uma “nitidez” absurda que expõe todas as características do rock
progressivo italiano: peso, personalidade, alto teor de dramaticidade, com viés
sinfônico, com ênfase nos teclados, em solos viajantes de guitarra e uma “cozinha”
bem sinérgica e definida.
O álbum traz a seguinte
formação: Guido Wasserman na guitarra, Pietro Pellegrini, nos teclados, Alfonso
Olive no baixo e Giorgio Santandrea na bateria e vocal.
Então dissequemos, faixa a
faixa, esse belo trabalho sim, do Alphataurus e se preparem para a viagem sem
passagem de volta, pois sem dúvida trata-se de um trabalho excepcional da
banda, mesmo que incompleto, sem vocal.
O álbum é inaugurado logo
com uma pedrada, com um arrasa quarteirão: “Ripensando E...”. O trabalho do
moog, das teclas emociona, é contemplativa, te tira do chão, faz flutuar. A
bateria entra, marcada, seguindo o ritmo viajante, o progressivo italiano se
faz presente, é a personificação timbrada nesta música. Pode ser sentida a
ausência do vocal, podemos, sem sombra de dúvida, encará-la como um clássico
instrumental, a beleza dos instrumentos é inquestionável.
A “situação” não muda com a
faixa seguinte: “Valigie Di Terra”. A introdução agora fica a cargo da bateria,
em um estágio meio experimental, entrando e mantendo tal atmosfera os teclados
e, gradativamente, vai ganhando substância, corpo, peso, se tornando mais
solar, animada, as viradas rítmicas ganhando protagonismo. Outra música digna
de reverências.
Na sequência tem a curta “Idea
Imcompiuta” que se destaca, em uma espécie de introdução, os teclados, com a
participação da bateria dando uma textura jazzística, mostrando o Aphataurus
tal perícia desde os seus primórdios.
E fecha com a excelente “Claudette”
que começa lindamente com um piano que depois nos conduz a uma seção estupenda
de inspirações sinfônicas avassaladoras e nesse emaranhado de fragmentos
sinfônicos tem no fundo um baixo forte, pulsante e vivaz marcando plenamente
essa faixa com uma riqueza instrumental invejável. É simplesmente de tirar o
fôlego, tantas viradas, tantas percepções sonoras em uma única faixa. Mas na
metade da faixa finalmente surge um vocal, a voz do baterista Giorgio
Santandrea, discreto, sem tanta potência.
De fato “Dietro L’Uragano”
pode ter sido conhecido como o “projeto inacabado”, sem dúvida, mas com a
sensibilidade e a competência de músicos que afloram de forma singular. Há de
se deleitar com os instrumentos, a viagem instrumental é garantida e por mais
que seja sentida a ausência de um vocal conduzindo todos esses soberbos
instrumentos, sobretudo depois de um álbum anterior com um vocal marcante,
podemos encarar esse trabalho como uma exibição, sim, instrumental e de grande
inspiração.
Em 2010, três dos componentes originais (Pellegrini, Wassermann, Santandrea) reformaram a banda para participar do Progvention de Mezzago, um festival conhecido na Itália. A formação, que inclui o cantor Claudio Falcone, o tecladista Andrea Guizzetti e o baixista Fabio Rigamonti, permaneceu também para alguns shows em 2011.
E em
2012 finalmente é lançado um álbum de inéditas chamado “AttosecondO”, com a
inclusão do baterista Alessandro "Pacho" Rossi e em 2022, após esse
período pandêmico, a banda retorna com nova formação e fazendo shows pela
Itália. Mas isso é outra história.
A banda:
Guido Wasserman na guitarra
Pietro Pellegrini nos teclados
Alfonso Oliva no baixo
Giorgio Santandrea na
bateria e vocal
Faixas:
1 - Ripensando E....
2 - Valigie Di Terra
3 - Idea Imcompiuta
4 - Claudette
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