A trajetória deste reles e
humilde blog vem revelando uma predileção minha: essas bandas “one-shots”,
ou seja, bandas que lançaram apenas um álbum de estúdio e some do mapa,
desaparece para sempre da cena musical. Para muitos pode parecer uma preferência
pelas bandas fracassadas, mas, admito e com certa alegria, meus caros leitores,
que este blog traz histórias de bandas fracassadas.
Fracassadas, sob o aspecto
comercial, mas que nos proporcionam histórias memoráveis, histórias genuínas,
de bandas que sem sombra de dúvidas entregaram, mesmo que em um efêmero tempo
de vida, as suas verdades sonoras. Acredito que seja por isso que essas bandas,
de alguns anos para cá tem me cativado, não apenas pelo quesito sonoro, mas
pelas histórias que é uma das essências desse blog.
E eu preciso destacar uma
banda que, claro, lançou apenas um álbum no prolífico ano para o rock n’ roll,
1972, e que logo pereceu e tinha, em sua formação, músicos da Inglaterra,
Alemanha e da Holanda, ou seja, era uma banda multinacional, porém baseada na
Alemanha. Falo do ODIN. Afinal, como muitos músicos em início de carreira, os
caras do Odin saíram de seus países natal para ter um lugar ao sol. As
audiências em seus países de origem pareciam não estar tão interessado na
sonoridade da banda ou não acontecia um contrato de gravação, então as
migrações se tornaram inevitáveis.
As origens do Odin vieram de
uma banda chamada Honest Truth que tinha na formação o baterista britânico
Stuart Fordham e do também britânico Ray Brown, que era baixista, o guitarrista
e vocalista holandês Rob Terstall, além de um tecladista húngaro que morreria
precocemente dando, de forma abrupta, um ponto final a banda, além também do
roubo de seus equipamentos.
E com o fim do Honest Truth os
caras se juntaram com o tecladista alemão Jeff Beer e, já na Alemanha, a banda
mudaria seu nome para Odin. Beer, antes de se juntar ao recém-nascido Odin,
fazia parte da banda Elastic Grasp. Enfim uma banda nova nascia e as esperanças
dos jovens músicos também. Largaram seus países, foram, apenas com a tal
esperança no fundo da mala, de fazerem sucesso, precisava acontecer para o
esforço fazer valer a pena.
E tudo parecia indicar que o
futuro seria gentil para com o Odin. Surgiu a possibilidade de um contrato de
gravação, já para o ano de 1972, com um dos selos mais reverenciados do mundo à
época, a Vertigo, e finalmente aconteceu, lançando seu primeiro trabalho
autoral, chamado simplesmente “Odin”. Mas o álbum só teve lançamento na
Alemanha.
“Odin” é um álbum
multifacetado, diversificado sob o aspecto sonoro. Traz um som mais cru,
calcado no hard prog, com distorção pesada, bateria agressiva, mas ainda assim
entrega uma sofisticação que só mesmo o rock progressivo pode proporcionar ao
ouvinte. Sim o ouvinte que aprecia várias vertentes do rock como as que eu
citei certamente irá se identificar com o primeiro álbum do Odin.
Essa sopa musical, embora não
traga nada de revolucionário, é muito boa, muito bem executada, principalmente
para mim que aprecia flertar com estilos que adoro, como o hard rock mais agudo
e texturas progressivas que eleva a sonoridade, fazendo da banda poderosa,
intensa e viajante nos inúmeros recursos propiciados pelo prog rock. Um som
eclético, um crossover digno de reverências e talvez pouco compreendido à
época, pois o sucesso comercial tão esperado pela banda não aconteceu, mesmo em
uma “praça” como a Alemanha, cujo público absorvia bem, nos anos 1970,
sonoridades pouco ortodoxas, as vendas foram um fiasco.
A instrumentação é
verdadeiramente exótica em “Odin” o que reforçou a sua condição de anticomercial,
sendo, consequentemente pouco assimilado pelo mercado à época. Há, neste álbum,
excentricidade e experimentação divertida e que traz, além da pegada hard
progressiva, pitadas gentis de jazz rock, psicodelia que entrega a este
trabalho belíssimas e arrojadas melodias de rock, as vezes pesados, lentas,
melódicas e até mesmo melancólicas, mesclado a riffs pesados de guitarra,
também inspirados no blues rock.
O álbum é inaugurado pela
faixa “Life is Only”, a música mais longa deste trabalho do Odin, com quase
onze minutos de duração e que personifica a essência de todo álbum: uma
combinação explosiva e de tirar o fôlego de hard rock e uma composição
progressiva sinfônica excelente. O baixo estabelece uma seção rítmica dinâmica
juntamente com um impressionante solo de guitarra. A beleza desta faixa está na
sua estrutura complexa e as texturas de teclado corroboram tal condição. Em
seguida há uma pequena faixa instrumental, a “Tribute to Frank”, uma homenagem
a Frank Zappa, que tem um trabalho interessante de vibrafone, com um arranjo
meio experimental, mas não muito complexo.
Na sequência tem “Turnpike
Lane” que é basicamente uma faixa instrumental, mas o destaque fica para os
riffs e solos lindos e bem trabalhados de guitarra, com as linhas de baixo
excelentes, mais uma vez, com groove, sendo ainda pulsante, vívido. “Be The Man
You Are” vem com uma mudança de tempo na sonoridade da banda neste álbum, com
um viés um pouco mais comercial, trazendo uma balada, com acordes um tanto
quanto repetitivos, mas bem executados. Percebe-se uma guitarra suave com
tonalidades folk interessantes, mostrando que a banda tem recursos.
O álbum volta ao rock
progressivo com a faixa “Gemini”, mas traz aquela mescla típica com o hard
rock, pois traz certa aspereza, peso e até alguma agressividade na sua
sonoridade. Em alguns momentos tem a impressão de que a estrutura da faixa é
basicamente calcada no hard rock, mas o prog rock também está lá em toques mais
sofisticados, tanto que o trabalho de guitarra e dos teclados me lembra algo
como o prog sinfônico e muito bem executado, diga-se de passagem. E assim se
faz também a variação rítmica, também típica do rock progressivo.
“Eucalyptus” é um instrumental
bastante descontraído e solar que traz um jogo interessante e exótico de
sintetizadores que flerta com o prog rock e o rock psicodélico, pois percebi
algo de lisérgico, ácido neste contexto melódico. A banda finaliza o álbum com
outra faixa longa, “Clown”, que traz, mais uma vez, a bela harmonização entre
hard rock e progressivo, com a adição de uma guitarra psicodélica, ácida, muito
parecida com a faixa inaugural. Uma música que sem dúvida agradaria a fãs de
prog e hard, sem sombra de dúvidas.
Com o lançamento de seu
primeiro álbum de estúdio o Odin estava se preparando para uma turnê, para se
apresentar e divulgar seu novo trabalho. Inclusive a banda recebeu um convite
para gravar em um estúdio de rádio, na Alemanha, em 1973, a “SWF Sessions”, e
até gravaram mais três músicas novas: “King King”, “Oh No” e “Make Up Your Mind”,
além de duas faixas do álbum de estúdio (“Turnpike Lane” e “Life is Only”), o
que denotava um futuro novo álbum, mas esse trabalho só veria a luz do dia em
2007, lançado pelo selo Long Hair Music.
E a turnê, que estava
planejada para o ano de 1973, não aconteceria também devido a desacordos de
caráter legal e uma crise se instaurou no Odin, acabando, pouco a pouco, com a
energia dos músicos que, aos poucos, se viram desestimulados. A banda se viu
obrigada a encerrar, de forma precoce, as suas atividades em 1974. A banda
durou apenas três anos ou talvez um pouco menos do que isso.
A maioria dos músicos que compunha o Odin desistiu da carreira musical. Jeff Beer continuou na Alemanha e seguiu uma carreira nas artes plásticas, reza a lenda, enquanto o britânico Rob Terstall, que também ficou na Alemanha, continuou na música em uma banda que tocava jazz e rock, uma banda cover, que se chamava Motion-Sound. Ray Brown virou um carpinteiro, enquanto Stuart Fordham voltou para a Inglaterra e investiu em uma carreira no ramo de eletrônicos antes de falecer em 2003.
Apesar das frustrações em sua
trajetória o Odin produziu um álbum sólido, poderoso, audacioso, mesmo sem ter
sido tão revolucionário à época. Muitos álbuns e bandas pagaram o preço por
serem exatamente audaciosos, por ter seguido um caminho que ninguém seguiu, não
se rendendo a modismos, seguindo a sua criatividade somente. Deixou, ainda
assim, um trabalho importante, mesmo que trafegando, até os dias de hoje, pelo
submundo do rock. O álbum teve apenas um relançamento, no formato CD, em 1991,
pelo selo Repertoire.
A banda:
Jeff Beer nos teclados,
vibrafone, percussão, vocais
Rob Terstall na guitarra,
vocais
Ray Brown no baixo, vocais
Stuart Fordham na bateria,
percussão
Faixas:
1 - Life Is Only
2 - Tribute To Frank
3 - Turnpike Lane
4 - Be The Man You Are
5 - Gemini
6 - Eucalyptus
7 - Clown