sábado, 8 de novembro de 2025

Tapiman - Tapiman (1972)

 

Costumo associar ou comparar algumas bandas, principalmente aquelas de vida efêmera, com uma estrela cadente, como são conhecidos, popularmente, como meteoros. São fugazes, são manifestações naturais, que, quando surgem, são fugazes e, dependendo de sua magnitude, destroem tudo o que veem pela frente.

Não há comparação melhor com as bandas obscuras e que surgem na escuridão, na obscuridade, vivem uma vida curta, desaparecem sem deixar rastros, mas, ainda assim, conseguem servir de referência para suas vertentes sonoras, mas não gozando de sucesso e popularidade.

E como estrelas fugazes podem ser apreciados por poucos, afinal tem de estar com os seus telescópios, seus olhares voltados para o lugar certo e no momento certo. E repararam quando presenciamos tais fenômenos nos sentimos privilegiados? Pois é, caros leitores, isso se aplica também às bandas que surgem, vivem e perecem obscuramente.

Por isso que costumo dizer que nasci no “tempo errado”. O tempo é relativo, porque temos a sorte de termos gravadoras undergrounds abnegadas e dispostas em trazer à tona bandas e álbuns esquecidos e jogados no fundo do baú empoeirado do rock n’ roll e que podemos ouvir e perceber, definitivamente que, os anos 1970, foram os mais prolíficos para o rock.

Então falemos de uma excepcional banda catalã, surgida, claro, em Barcelona, que abalou com as estruturas sônicas daquela proeminente cena rock trazendo um hard rock potente calcado ainda no blues rock e no que convencionaríamos, no futuro, de heavy metal. A banda? TAPIMAN.

Tapiman

As origens do Tapiman vêm do exímio baterista Josep María Vilaseca "Tapi", que era uma lenda do rock espanhol, tido, inclusive como o melhor baterista de seu tempo. Reza a lenda de quem o conheceu, de que ele era um menino e mais a frente um jovem a frente de seu tempo, que gostava de beber e se divertir. Tapi era uma maravilha com as baquetas na mão. Parecia levitar com seu instrumento, quando se apresentava.

E a sua trajetória no rock se fez com a banda Vértice e em 1969 ingressaria no Maquina!, uma referência do rock catalão na transição das décadas de 1960 para a de 1970. Com a dissolução do Maquina!, Tapi decidiu alçar novos voos e contou com o excelente guitarrista Miguel Ángel Núñez para formar o Tapiman, lá pelo ano de 1970. A origem do nome “Tapiman” vem do nome “Tapi” de Josep e a contração do nome do guitarrista Miguel (MAN). Se juntaria, logo após, à banda o baixista Pepe Fernández, que tocou também no Vértice com Tapi. Vale dizer também que “Tapi” era o nome artístico de Josep, porque ele morava rua Tapioles (Tapi / oles), na Chinatown de Barcelona.

O “power trio” estava formado. E eles de fato trouxeram algo novo, arrojado ao rock n’ roll espanhol. E com um punhado de músicas no braço os jovens músicos foram em busca de algum produtor, empresário ou gravadora para materializar seu sonho de gravar um álbum e as suas músicas, até que o selo Edigsa decidiu gravar, em 1971, o primeiro single do Tapiman, com duas músicas, "Hey, You!" e "Sugar Stone", duas grandes canções que seriam o prelúdio do que viria mais tarde com seu primeiro álbum.

E o destaque fica para “Sugar Stone” que apresenta um hard rock puro, potente, vigoroso, tido, por muitos, como uma das músicas pioneiras da música pesada na Espanha e que tinha alusões claras, em sua letra, a temas psicodélicos, fruto ainda de uma fase no rock onde a lisergia reinava ou pelo menos, lá pelos idos de 1971, terminava seu reinado.

Fica o destaque também em dizer que o Tapiman foi o primeiro “power trio” da história do rock espanhol e nitidamente mostrava influências de bandas como Black Sabbath que à época estava iniciando a sua trajetória com a sua trinca pesada de álbuns seminais e pesados, além de Jimi Hendrix e, claro, Cream, o primeiro “power trio” da história do rock. Outra novidade para o rock espanhol era o baterista como vocalista também, mesmo que Tapi tivesse certa barreira com o idioma inglês, compensava com potência e por vezes um vocal rasgado que harmonizava perfeitamente com a sonoridade do Tapiman.

Naquele mesmo ano, 1971, o Tapiman lançaria outro single, agora com as músicas “Love Country” e “Walking All Along the Life”, porém com outro guitarrista. Seria a primeira baixa da banda, saindo o grande guitarrista fundador, Miguel Ángel, devido ao serviço militar obrigatório. Tapi não demorou muito para encontrar um novo guitarrista para compor a banda e este foi outro exímio “guitar man” chamado Max Sunyer, outra lenda viva que também havia tocado no Vértice e que já era um guitarrista profissional experiente.

Vale, como registro histórico, que, pouco antes disso, Tapi, juntamente com três dos músicos do Vértice, além de ter colaborado com os singles que a banda lançou, gravaria, em 1970, um álbum de nome “Rock n’ Roll Music”, de um rock muito poderoso e com tendências muito progressivas que incluíram versões de John Mayall e Ray Charles. Este álbum foi lançado com uma tiragem muito curta. Esse projeto é um claro avanço do que viria mais tarde a ser o Tapiman.

"I Want a Boogie"

Para alguns críticos da época e fãs também esse segundo single lançado pelo Tapiman perderia a força do anterior lançado, sendo um passo em falso considerando o que viria no ano seguinte com o seu primeiro álbum, mas para outros a adição de Sunyer foi preponderante para o crescimento sonoro da banda. Independentemente de qualquer coisa, a chama estava acesa, a força do Tapiman ainda estava lá com seu DNA explosivo calcado no blues e hard rock.

O início dos anos 1970 foram confusos para a Espanha, dada a sua instabilidade social e política. Em 1971, antes do Tapiman lançar o primeiro álbum, participaria do festival permanente do Iris Hall de Barcelona. Juntamente com o Tapiman estavam bandas como Smash, Sisa, Pan, Alcaçuz entre outras.

Dado o clima de revolta que ainda enfileirava após os chamados processos de “Burgos”, a polícia se dedicou a bater, sem dó, nos apreciadores de rock n’ roll que saída do festival, pelo fato de serem “cabeludos”. O Tapiman também participaria, em Madrid, de um festival de rock progressivo que no ano anterior não pôde ser realizado por causa de uma batalha campal entre estudantes e roqueiros. Mas, apesar dessa instabilidade política e da atmosfera de violência, também foram dias de grande emoção e diversão.

E assim surgiria para o mundo, graças ao olhar do selo Edigsa, que confiou no trabalho arrojado e louco do Tapiman, o álbum homônimo, em 1972, tendo como base no que foi lançado no primeiro single, que contava ainda com Miguel Ángel à frente da guitarra na banda. Mas claro que teve a assinatura de Max Sunyer dada a sua já experiência no universo da música. A capa, marcante, com uma caveira rosa, foi concebida por Guillem Paris, membro do Pan e Licorice, bandas que compartilharam palcos e a cena no início dos anos 1970.

“Tapiman” surgiu como uma bomba do hard rock muito à frente do seu tempo, um álbum cru, sujo e forte, totalmente despretensioso. Pepe e Tapi fazem uma seção rítmica bem entrosada, com a bateria que é uma verdadeira delícia e que deixa um bom terreno para Max implantar todas as suas habilidades na guitarra. Apesar da energia do álbum, não se destacam propriamente por serem muito pesados ou muito progressivos, têm uma personalidade muito marcada e inconfundível e um trabalho importante e realizado nas partes mais psicodélicas.

Apesar de ser um álbum similar ao que estava se fazendo na Europa e nos Estados Unidos, com o viés do peso, do hard rock e até mesmo pegada progressiva e blueseira, o que tornava, também, o debut do Tapiman especial e único é a sua veia psicodélica e principalmente uma camada proto heavy que, certamente, serviria de referência para a cena metal da Espanha e da Europa nos anos 1980 e nas gerações de músicos mais à frente.

O álbum é bem recebido à época e teve boas críticas na também escassa imprensa que atuava na área musical nos longínquos anos 1970. Mas ainda assim não foi considerado como o melhor álbum de hard rock gravado na Espanha, essa parte é plenamente discutível, pois temos, de fato, bons trabalhos lançados no início dos anos 1970, mas “Tapiman” definitivamente foi o melhor de sua época! Ah já que falamos de melhores álbuns, destaco, da mesma cena espanhola de Barcelona, um trabalho magnífico, lançado anos mais tarde, em 1979, do álbum “La Bruja”, da banda Rockcelona, cuja resenha pode ser lida aqui.

Abre com a faixa “Wrong World” que já entrega, em sua introdução, um riff que deixaria bem claro o que vamos ouvir em todo o trabalho do Tapiman: um hard rock volumoso, pesado, agressivo, potente, com uma jam enérgica e viva. A sequência traz "Gosseberry Park" que me remete a uma veia mais pop, mas que não entra em conflito com a proposta do álbum. O resultado é uma música elegante, cativante e amigável para o rádio.

"Wrong World"

Segue com “Don't Ask Why” que revela um blues progressivo portentoso que traz a sensação de que você nunca sabe como vai continuar, mas não se torna excessivo, indigesto ou ainda enfadonho, porque a guitarra soa melhor, uma sonoridade mais rebuscada e o final é apoteótico. “Practice” não foge à regra e traz um festival de riffs de guitarra pesados e agressivos com uma bateria marcada e extremamente pesada. É de tirar o fôlego!

"Don't Ask Why"

“Paris” é um belo instrumental que soa melancólico acompanhado por um órgão Hammond, onde a guitarra de Sunyer se torna o destaque, que chora suavemente e que me remete, em parte, a um blues antigo. “No Chance” começa com a guitarra mais viajante e uma sonoridade mais calcada no psych, um psicodélico mais pesado, que traz à memória Cream e Hendrix.

"No Chance"

“Moonbeam” é outra faixa instrumental muito bem executada, mostrando a destreza dos músicos com seus respectivos instrumentos e traz à mente, em sua base rítmica, o rock andaluz da época. “No Control” traz de volta o peso sujo do álbum, uma guitarra arrastada, agressiva e densa, ao mesmo tempo, que me remeteu ao doom metal oitentista. Vocal rouco e rasgado também é o destaque.

"No Control (Álbum: "Hard Drive")

Eis que surge “Jenny”, a balada do álbum. Mas em vez de cair no brega previsível tem uma atmosfera sombria e, claro, psicodélica deslumbrante. Viajante! E fecha com a música mais complexa e longa do álbum, “Driving Shadow (Pepe’s Song”). Essa faixa alterna entre partes brutais de hard rock poderoso, psicodelia, um solo de bateria e os inevitáveis solos de guitarra, uma das marcas registradas desse álbum. Uma música brutal e complexa que raramente é feita nos dias de hoje.

"Jenny"

Embora, como eu disse, “Tapiman” tenha sido bem recebido pelos fãs e pela crítica e ter tido todos os predicados de seu pioneirismo, o álbum não foi bem sucedido nas vendas. Claro, porque, olhando para trás com perspectiva, pode-se perceber o quão estranho, arrojado e original foi este álbum. E como costuma acontecer, surgiriam os primeiros conflitos entre os integrantes do Tapiman.

Um dos primeiros problemas vieram com relação a seriedade com que os músicos não estavam levando no que diz respeito a condução da banda e isso, além de conflitos criativos, culminaram com a dissolução da banda no mesmo ano em que seu álbum foi lançado, em 1972. Max, por ser um músico mais experiente, vivia da música e exigia um nível de trabalho que Pepe e Tapi, aparentemente, não estavam dispostos a dar. Uma passagem, uma existência precoce e surgiu como um fenômeno da natureza.

Mas a história não terminaria em 1972. Em 2017, a abnegada gravadora Guerssen Records lançaria algumas gravações esquecidas de material restante e inacabado da primeira fase, diria da fase inaugural, do Tapiman, em 1971, resgatado pelo jornalista Alex Gómez Font, após localizar Miguel Ángel Nuñez, vocalista original da banda.

O álbum, intitulado “Hard Drive”, nos traz uma série de músicas com uma qualidade de gravação um tanto quanto precária, mas que só realçam, mais uma vez, a crueza e agressividade que fez do Tapiman a banda que foi: pesada e agressiva, trazendo a despretensiosidade ao seu DNA sonoro e que materializou em seu álbum lançado em 1972.

"Hard Drive" (1971 - 2017)

No final dos anos 1970 o Chapa Discos decidiu revitalizar o rock espanhol, materiais de bandas esquecidos pelo tempo, dos pioneiros do rock daquele país. Foram várias as bandas e, claro, o Tapiman não ficou de fora. Surgiria “Em Ruta”, em 1979. Um álbum ao vivo que foi reeditado e que trazia, além de Tapi, na bateria e vocal e Pepe Fernández no baixo e na guitarra, com mudança, teria Javier Moreno, ex Hot Panotxa.

Tapiman em 1979

“En Ruta” mostrou um Tapiman ainda vivo, mostrando seu habitual peso, seu hard rock potente e volumoso, mas faltou um pouco mais de atenção à banda por parte da equipe que o geria, bem como as intensas instabilidades que insistiram em rondar a vida da banda, muito graças a vida louca de Josep Tapi.

"En Ruta" (1979)

O primeiro álbum do Tapiman não é muito elaborado, porque é direto e cru, a síntese perfeita do que convencionamos de hard rock na sua gênese. O “power trio” espanhol sem dúvida foi um dos pioneiros do hard rock espanhol e serviu de referência para o rock espanhol, para a música pesada daquele país e ouso dizer de toda a Europa! Em 1994, Josep Tapi morreria deixando um legado de despretensiosidade do rock n’ roll e uma chama viva personificada no grande Tapiman.

“Tapiman” teve alguns relançamentos. Em 1993, no formato CD, na Espanha pelo selo PDI. Em 2003 foi lançado pela Guerssen Records e PDI, no formato LP. Em 2005 mais relançamentos na Espanha, novamente com a Guerssen e PDI: dois lançamentos no formato CD. E o mais recente, em 2012, no formato CD, pelo selo Picap, também na Espanha.





A banda:

Josep María Vilaseca "Tapi" na bateria e vocal

Max Sunyer na guitarra

Pepe Fernández no baixo

Com a minha menção honrosa ao fundador da banda, Miguel Ángel Nuñez, guitarrista.

 

Faixas:

1 - Wrong World

2 - Gosseberry Park

3 - Don't Ask Why

4 - Practice

5 - Paris

6 - No Chance

7 - Moonbeam

8 - No Control

9 - Jenny

10 - Driving Shadow (Pepe's Song)


 


"Tapiman" (1972)


























 


 










sábado, 1 de novembro de 2025

Plum Nelly - Deceptive Lines (1971)

 

Uma joia! Uma pérola esquecida! Alguns termos parecem ser manjados nos dias de hoje quando buscamos alguns adjetivos para as bandas obscuras, raras, que trafegam no ostracismo do underground! Embora soe piegas, em alguns casos determinadas bandas e álbuns merecem tais títulos.

Tentarei, estimados leitores, trazer alguns exemplos ou pelo menos um exemplo que certamente ilustrará o meu texto de hoje. Vamos da cena rock de Nova Iorque da virada dos anos 1960 para os anos 1970, principalmente no início dos anos 1970, onde o hard rock, aliado à psicodelia, a lisergia, dava o tom.

O rock progressivo parecia não gozar de tanta popularidade na terra do Tio Sam, mas tinha uma banda que trazia tal conceito sonoro, ainda engatinhando, praticamente no mundo, mas que também foi impactada pela sonoridade que agitava os jovens transviados da época: o hard rock.

A banda se chamava PLUM NELLY! Mas como atribuir tamanha importância para uma cena que estava embrionária e que sequer teve e ainda tem representatividade entre os fãs de rock? Pois é, amigo leitor, pode parecer um contrassenso, porém vou assumir o risco mesmo diante de minha magnânima ignorância.

Plum Nelly

Acredito que consiga, ainda assim, trazer alguns elementos, diria, substanciais, para argumentar o que afirmo de forma tão categórica. Seu único álbum, lançado no longínquo ano de 1971, entrega verdadeiras jams, com vertentes sofisticadas e progressiva, com inserção de flautas, teclados em profusão, guitarras pesadas, com solos bem elaborados, trazendo texturas de hard rock e até mesmo de um blues rock.

Nome do álbum? “Deceptive Lines”! Bem eu me adiantei um pouco e falei sobre o álbum, mas foi por um bom motivo, afinal, precisava pelo menos trazer um argumento para atribuir tamanha importância ao Plum Nelly, mesmo se tratando de uma banda obscura da cena nova iorquina dos anos 1970. Mas falarei, para não perder o costume, um pouco da história deles.

Como disse as origens do Plum Nelly remontam de Nova Iorque no final dos anos 1960, formado por cinco jovens músicos que tocavam na cena underground da cidade, em bares, clubes, começou a sua história com o nome de “Creedmore State” e trazia na sua formação inicial: Peter Harris, no baixo e vocais, Christopher Lloyd, na bateria, Ric Prince, nos vocais e teclados, Steve Ress na guitarra e vocais e John Earl Walker na guitarra, além de Jeremy Steig na flauta e Dave Bash Johnson na conga e timbal. Vale a curiosidade: Jeremy Steig, flautista americano de jazz, é filho do famoso cartunista William Steig, criador do personagem de desenho animado “Shrek!”.

As primeiras apresentações do Plum Nelly, ou melhor, “Creedmore State”, foram em pequenos clubes e, por mais que a questão estrutural não fosse um ponto positivo para a banda, foi graças a alguns proprietários desses clubes, mais precisamente Arnie e Nicky Ungano, que tinha um estabelecimento em Nova Iorque, exatamente com o nome de “Creedmore State”, que os jovens e persistentes músicos conseguiram seu primeiro contrato, com a Capitol Records.

E, por forças deste mesmo contrato que assinaram, foram forçados a mudar o nome da banda para “Plum Nelly”. Reza a lenda que a mudança do nome teria sido motivada por esses mesmos proprietários de clubes nova iorquinos que conseguiram para a banda este mesmo contrato com a Capitol. O fato é que, o agora Plum Nelly, entraria em estúdio, mais precisamente no Capitol East Studios, em novembro de 1970, e ficou até o final de dezembro para gravar seu álbum, tendo sido lançado em 1971.

“Deceptive Lines” é um formidável trabalho de hard rock, energético, arranjado de forma limpa e meticulosa. Ele é tão sofisticado e bem composto que nos remete ao rock progressivo quase que involuntariamente, pois tem complexidade, mas muito orgânico. A você, nobre leitor, que aprecia prog rock, esse álbum cairia muito bem aos seus ouvidos.

Mas não se engane que o álbum se limita apenas ao hard rock e rock progressivo: há nuances de blues rock, toques de jazz, elaborando um estilo rico e compacto, que, por passar por tantas intensidades, se mostra intenso, poderoso e vívido. Sem contar com a jams, sempre poderosas e rígidas, com muito dinamismo, com bons solos e bons riffs de guitarra, além de uma seção rítmica pulsante e um vocal extremamente competente.

A produção das músicas, consequentemente seguem marcantes, agregando a ela um som compacto, sem aqueles manjados tons místicos ou atmosférico, com aquele típico sombrio, mas muito poderoso, concreto, agressivo e solar. O desempenho de seus instrumentistas revela a versatilidade de seus músicos.

O álbum é inaugurado pela faixa “Deception” que traz uma leve e contemplativa flauta na introdução que é substanciada por uma “cozinha rítmica” bem entrosada e um vocal alto, mas límpido que cresce juntamente com o instrumental: bateria pesada e marcada, dedilhado de uma guitarra acústica que faz o contraponto, além de um baixo forte e pulsante. A faixa é tipicamente progressiva, com mudanças de andamento, variâncias rítmicas que seu frontman confirma com sua privilegiada voz. A guitarra dá o som com dedilhados ao estilo Yes, mas com um pouco de peso. Excelente faixa para começar!

"Deception"

Segue com “Carry On” que começa introspectiva, dedilhados de baixo discretos que logo irrompem em riffs pesados de guitarra, em pegada mais calcado no hard rock. Bongôs são ouvidos e entrega uma veia mais percussiva e dançante. Ouve-se também uma guitarra mais lisérgica, psicodélica, uma entrega mais experimental se se percebe quando o bongô se cruza com a guitarra ácida! O hard rock retorna e ganha a cena, com um momento mais pesado e intenso. Nesta faixa o hard prog ganha evidência. O vocal é forte, alto e gritado, em alguns momentos. Mais uma vez se mostra altivo.

"Carry On"

“The Demon” assume um caráter mais acessível em sua sonoridade. Não direi se tratar de uma faixa comercial ou radiofônica, mas, ainda assim, acessível, pois entrega versatilidade de uma maneira mais simples em sua sonoridade. A faixa agradaria facilmente aos fãs de prog, com suas viagens pastorais e aos apreciadores de hard e classic rock, com riffs mais pesados de guitarra e de batidas de bateria mais fortes e marcadas. O final da música passa a predominar o hard rock, com instrumentais mais pesados e vocais rasgados.

"The Demon"

“Lonely Man’s Cry” começa leve, acústica, dedilhados de um violão acústico abrem para uma balada com uma veia voltada para o country music. É viajante, agradável e contemplativa. Os vocais alternam entre a limpidez e suavidade, com momentos de mais alcance. A música vai ganhando mais corpo, com solos de guitarra mais pesados, alternando com solos de country. Os vocais de fundo trazem leveza e são, para curiosidade, executados por um grupo vocal chamado “The Sweet Inspirations”, que eram liderados por Cissy Houston, mãe da famosa cantora Whitney Houston e que também estava gravando para Elvis Presley e Aretha Franklin à época.

"Lonely Man's Cry"

“Sail Away” começa com flautas, deduzindo uma faixa mais voltada para o prog rock, mas logo se mostra mais intensa, riffs de guitarra mais pegajosos e pesados. Embora cadenciada revela-se potente, com bateria com uma batida mais pesada e baixo pulsante e igualmente pesado. Não se pode negligenciar o trabalho rítmico nessa música.

"Sail Away"

E fecha com “Never Done” que começa também com flautas, porém em um interessante “duelo” com solos de guitarra de tirar de fôlego. O suave se encontra com o peso, dando um caráter versátil e arrojado à faixa. E depois de alguns minutos com uma apoteótica apresentação instrumental, entra os vocais que, mais uma vez, se mostra competente, agora com riffs de guitarra ao estilo hard rock dos anos 1970.

"Never Done"

Após o lançamento de “Deceptive Lines” o Plum Nelly fez uma turnê pelos Estados Unidos, tocando juntos com nomes pesados da música, como: Bo Didley, BB King, Buddy Guy, The Kinks, Savoy Brown, John Mayall, Fleetwood Mac, The Faces, Joe Cocker, Dr. John, Muddy Waters, Terry Reid, The James Gang, entre outros.

Em 1974 mudaram-se para Los Angeles. O que parecia ser um novo começo com a sua ida para Los Angeles, dois anos depois, em 1976, a banda encerraria as suas atividades. O fim da banda foi motivado, entre outros fatores, pela saída do vocalista John Walker que formou, no final dos anos 1970 e início dos anos 1980, a sua banda: “The John Earl Walker Band”. Infelizmente nada mais foi ouvido sobre o Plum Nelly após a sua dissolução, o que é lamentável, levando-se em conta o potencial que os jovens músicos tinham à época.

Eles não eram jovens, eles eram praticamente adolescentes e já mostravam um talento inegável, mas, além da saída de Walker, a promoção que foi dada ao álbum, à época de seu lançamento, foi muito pobre e incipiente, deixando seu álbum sem nenhuma divulgação. Mas eis que surge uma luz no fim do túnel, quando, em maio de 2025, “Deceptive Lines” ganha uma reedição pelo selo Survival Research. Um grande trabalho de garimpo e de reconhecimento a um trabalho excepcional produzido nos longínquos anos 1970 que, independente se foi ou não conhecido ao grande público do rock n’ roll, foi uma referência para o hard rock estadunidense.





A banda:

Ric Prince: vocais e teclados

John E. Walker: vocais principais

Steve Ress na guitarra e vocais

Peter Harris no baixo e vocais

Christopher Lloyd na bateria

Com:

Jeremy Steig na flauta

Dave Bash na conga e timbal

 

Faixas:

1 - Deception

2 - Carry On

3 - The Demon

4 - Lonely Man's City

5 - Sail Away

6 - Never Done



"Deceptive Lines (1971)"

 




 


 



 

















sábado, 18 de outubro de 2025

Surprize - Keep On Truckin’ (1972)

 

Certas experiências pelas quais passamos podem revelar e descortinar mudanças radicais em nossas vidas! Embora isso seja óbvio, não parece ser muito fácil, principalmente pelo fato de que tais decisões vêm em detrimento de abdicar de outra vida que você levava e às vezes uma vida repleta de glamour ou de um futuro promissor seja pessoal ou profissionalmente falando.

Vocês devem estar se perguntando, nobres leitores, mas que diabos ele está dizendo isso? Mas, como sempre, para manter aquele suspense, sugiro que, caso tenha se interessado, fique até o fim em sua leitura, pois entenderão. Não se enganem, este blog não está tendendo para autoajuda, a música, evidente, ainda está presente e no texto de hoje vocês terão uma ótima música, cuja banda tinha todos os elementos para conquistar um espaço na indústria musical, mas sucumbiu por conta das mencionadas experiências e decisões.

Falemos do SURPRIZE! A banda foi formada na Filadélfia, nos Estados Unidos, em 1971 e trazia, em sua formação Peter Accardi no vocal, percussão e gaita, Mark Shapiro na guitarra e vocal de apoio, Frank Bissel, nos teclados e vocal de apoio, Rick Martin no baixo e vocal de apoio e Fred Kieffer na bateria.

Apesar de muito jovens, tudo aconteceu muito rapidamente na história do Surprize. Em pouco mais de oito meses de formada, a banda entraria em um dos melhores estúdios do país para gravar o seu primeiro e único álbum, chamado “Keep On Truckin’”, em 1972, pelo selo East Coast Records. Após o lançamento de seu álbum, a banda começou a receber muitos convites para se apresentar em TV e rádio.

Foi uma verdadeira hecatombe de emoções e momentos importantes para os jovens músicos da Filadélfia. Além das apresentações nos canais de televisão e nas estações de rádio, com suas músicas sendo diariamente executadas, a banda também passou a tocar em shows de grandes estruturas, com uma ótima produção. O Surprize começou a fazer sucesso! O caminho que estava trilhando era de realização musical e cada dia que passava estava abocanhando novos fãs e se tornando cada vez mais popular.

“Keep On Truckin’” é um trabalho, sonoramente falando, multifacetado, versátil, trazendo um hard rock, com fortes características do rock n’ roll norte americano, com viés psicodélico, ainda vívido na cena rock do início dos anos 1970, com aquela guitarra lisérgica, além de uma pegada de blues rock e de soul music. Ou seja, sonoridades bem típicas da época, em uma mistura em caldeirão com temperos bem saborosos que remete também a uma música mais radiofônica, porém de qualidade superior. De fato, o som do único trabalho do Surprize corrobora o seu sucesso à época.

O álbum é inaugurado com a faixa “Earth Odyssey” que, em sua introdução, traz uma guitarra distorcida e teclados espaciais que anuncia uma música calcada exatamente no hard rock e space rock, com pitadas progressivas. Um riff de guitarra traz variâncias rítmicas e o prog rock se conecta ao rock psicodélico, onde as teclas se mostram mais presentes e enérgicas. Essa música já entrega o que representa o álbum, em sua plenitude.

"Earth Odyssey"

“Sweet Love” já traz a versão dançante e animada ao álbum. É inegável que a sua introdução não faça o ouvinte dançar, é solar. A soul music ganha protagonismo nesta faixa. Bateria swingada, baixo dançante, piano envolvente se envolvem com um pouco de peso graças aos seus riffs e solos ocasionais. E a harmonização entre o soul music e o hard rokc, o que poderia parecer se tornar improvável traz peso e animação aos que tem a mínima capacidade de absorver o som.

"Sweet Love"

Chega a faixa título, “Keep On Truckin’”, que, no seu início traz a gaita chorando e a bateria tocada de forma agressiva, uma batida pesada e evolvente. Tudo isso envolto em riffs pesados de guitarra! O típico hard rock dos anos 1970 se ouve nessa música. Pode se perceber pitadas discretas de um blues rock bem pesado. Solos de guitarra são de tirar o fôlego na metade da faixa.

"Keep on Truckin'"

“Ev’ry Day” começa lenta, ao toque do piano e vocal bem límpido, ouve-se uma balada psicodélica, de sonoridade agradável e bem acessível aos ouvidos, com riffs de guitarra bem lisérgicos. O solo de guitarra é viajante e com ela a música vai ganhando um discreto peso, mas sempre voltando ao tom de balada.

"Ev'ry Day"

“See the Light” traz de volta o balanço, a pegada soul music com os riffs típico de guitarra, mas com a veia mais voltada para o hard rock, com bateria com batida mais pesada e um baixo cheio de groove e igual peso. Não podemos negligenciar o trabalho dos teclados que, de forma enérgica e solar, traz passagens mais progressivas a música. E em determinado momento da faixa ouve-se a pegada progressiva, do hard e do soul. Uma “sopa” sonora incrível!

"See the Light"

E fecha com “Try a Little More” que inicia discreta, leve, ao som do piano e do bongôs e um vocal baixo e introspectivo. E vai aumentando, ganhando estrutura, peso. Um hard rock dançante, alto e nitidamente pesado que traz intervalos mais leves e dedilhados de guitarra psicodélicos. É impossível passar incólume à essa faixa. Animada, solar, dançante.

"Try a Little More"

Quando o Surprize se apresentava fora da Filadélfia, Peter Accardi teve uma experiência sobrenatural que mudaria a sua vida completamente, de forma profunda. Accardi, após esse evento, convocou a banda para uma reunião que seria crucial para o futuro da banda. Compartilhou com todos da sua experiência e disse que a mesma lhe mostrou que ele iria para o céu e precisava difundir a todos sobre tudo isso. Ele disse também que isso seria bom para todos da banda e para choque de todos decidiu que sairia da banda.

Ele não deixaria apenas o Surprize, deixaria também a sua carreira musical e se transferiu para Faculdade Bíblica, pois gostaria de se tornar um pregador. O tecladista Frank Bissel, semanas depois da saída de Accardi, deixaria a banda, para seguir os passos de seu agora ex-companheiro de banda. Diante disso o Surprize finalizaria as suas atividades. Atualmente Accardi e Bissel servem na Igreja Batista Elkdale, em West Clifford, na Pensilvânia. Accardi como evangelista e Bissel serve como pastor da igreja.

Accardi pregando

Cada ser humano é dono de suas escolhas, embora o Surprize estivesse em um franco crescimento, fazendo shows, tornando-se famoso e evidente, seu principal músico teve uma experiência, segundo o próprio, sobrenatural, interrompendo sua trajetória e começando outra. A realização e o prazer devem estar em primeiro lugar, mas é inegável dizer que a tendência era forte para um futuro consistente para o Surprize e isso se reflete em seu único álbum. Mas quis os ventos da mudança soprarem no caminho dos seus músicos. “Keep on Truckin'” teve um relançamento, em CD, pelo selo GEMA.

Apesar da precocidade fica a história, que é fabulosa e um registro para que a banda se eternize por intermédio de sua única obra. E aqui, neste reles e humilde blog, as histórias sempre serão contadas, sejam elas de todos os teores e enredos possíveis, sempre harmonizando, claro, com a música e o Surprize, definitivamente entregou os dois. Espero que todos se divirtam com ambos.


A banda:

Peter Accardi no vocal, percussão e gaita

Mark Shapiro na guitarra e vocal de apoio

Frank Bissel nos teclados e vocal de apoio

Rick Martin no baixo e vocal de apoio

Fred Kieffer na bateria

 

Faixas:

1 - Earth Odyssey

2 - Sweet Love

3 - Keep On Truckin'

4 - Ev'ry Day

5 - See the Light

6 - Try a Little More



"Keep on Truckin" (1972) - Ouça o álbum aqui!