Quando eu comecei a ouvir as
bandas de stoner rock em meados da primeira década dos anos 2000, eu sempre
achei que as bandas que eu ouvia, em especial, era uma espécie de resposta
nostálgica dos fãs aos anos 1970 e todas as suas manifestações culturais e/ou
comportamentais.
Mesmo assim continuei a ouvir
desbravar os sons dessa nova cena que, mesmo sem apoio da indústria
fonográfica, e de alguns fãs de rock mais “conservadores”, e fui percebendo, ao
ouvir álbuns e bandas, que não era apenas lembranças, reminiscências do
passado, mas eram sons mais arrojados, mais destemidos, sonoramente falando.
Muitas bandas começaram a
aglutinar sonoridades psicodélicas, de blues e até mesmo de rock progressivo.
As viagens sonoras se tornaram mais chapadas e até mesmo sofisticadas, o que
pode parecer impossível com o stoner rock, tido como um som mais duro, mais
rústico e, por vezes, sujo e despretensioso.
E uma banda, em especial, me
apresentou a essa nova cena e não me fez querer sair mais. A banda se chama
ORCHID! E quando eu falei que essa cena dos anos 2000, começou a flertar com
outros elementos sonoros do rock n’ roll, entre outros o psych rock, o Orchid
foi formado em uma das cidades mais importantes para a cena psicodélica dos
anos 1960, São Francisco, nos Estados Unidos. Tem algo a ver? Não sei dizer se
tem, foi apenas um dado sem muita relevância.
Mas coincidências à parte, a
história do Orchid inicia em 2008, aproximadamente com o vocalista Theo Mindell,
quando estava construindo, em sua mente, uma ideia do que viria ser o Orchid.
Ele não estava tocando em banda nenhuma à época e há muito tempo. Estava cansado
do que estava acontecendo nas cenas daquela época e começou a compor, na
guitarra, naquele mesmo ano.
Ele tinha tocado em uma banda
com o guitarrista Mark Thomas Baker, isso muito anos antes de se juntarem ao
Orchid! Theo sabia que Mark era o único cara que poderia materializar o seu
projeto, que era capaz de trazer o Orchid à vida. E o incomodou, de forma
incansável e determinada, para convencer Mark a participar de sua empreitada,
até que finalmente ele aceitou.
O próximo passo era buscar
mais músicos para compor a banda e a busca foi longa e difícil, principalmente
para a escolha de um baixista. Foram muitos baixistas que fizeram audição e
muitos que não se encaixavam na proposta da nova banda, alguns entraram na
banda, mas ficaram por pouco tempo. Até que Keith Nickel foi escolhido e em
seguida entraria na banda o baterista exímio Carter Kennedy. Esse foi o começo
do Orchid.
As origens do nome da banda,
“Orchid”, claro, veio do título da música do Black Sabbath, do excelente álbum,
de 1972, “Vol.4”. A ideia de Theo era um nome que não soasse tão clichê dessas
bandas de heavy metal. Ele queria um nome que evocasse sentimentos de
psicodelia do final dos anos 1960 e início dos anos 1970 e o Sabbath foi
lembrado. Talvez se fosse um nome sombrio ou mau teria soado algo fingido ou
forçado.
A ideia de Theo e os demais
caras da banda era um nome ambíguo que desse a eles algum espaço para crescer
musicalmente e comercialmente falando. E Orchid era ideal, eles sempre gostaram
da maneira como o nome da banda estava atrelado a eles.
E, com isso, vem também
algumas comparações, um tanto quanto maldosas, com o próprio Sabbath. Mas
encaro, bom amigo leitor, como apenas uma influência inevitável. E deixo com os
senhores uma declaração do próprio Theo Mendell, em uma entrevista concedida
para um blog chamado “Temple of Perdition”, que diz:
“Quanto às comparações com o
Sabbath? Eu realmente não me preocupo com isso. Eu amo o Sabbath. Eles têm sido
uma das minhas bandas favoritas desde que eu era criança. Eu não sei como eu
poderia escrever músicas de rock pesado sem esse som ou identidade. É apenas o
que eu acho legal. Eu acho que há muitas outras influências que estão bastante
presentes no som do Orchid também. Mas as pessoas sempre pegarão o caminho mais
curto para um destino, mesmo que seja prendendo algum tipo de "etiqueta de
roubo" em você. Se esse é o pior crachá que eu já tive que usar na minha
vida musical, vou usá-lo com orgulho”.
O primeiro trabalho do Orchid
sairia em 2009, mas não seria um álbum, mas um EP e, convenhamos, começaram,
ainda assim, muito bem, com o “Through the Devils Doorway”. Eram quatro músicas
de uma banda avassaladora, que trazia o conceito de hard rock muito fortemente,
mas trazia também pegadas de storner, psych e até mesmo de um doom metal. Um
começo à altura das ambições desses jovens músicos que queriam fazer música dos
anos 1970 com um pé nos anos 2000 e com muito recurso sonoro.
Mas o melhor estava por vir, o
tão esperado debut do Orchid e, apesar de ter demorado um pouco, ele viria e
com força e impacto na cena stoner underground e o nome dele? “Capricorn”, de
2011. O conceito, a proposta era basicamente a mesma de seu EP, lançado há dois
anos antes, mas veio com uma excelente produção, com arranjos e melodias bem-feitas.
Era um álbum diversificado, não era datado, o hard rock, o heavy rock, o stoner
e o psych rock eclodia a cada nota musical. Se você, bom amigo leitor, aprecia
Black Sabbath e aquele som arrastado e sombrio, verá em “Capricorn” a melhor
das audições.
Theo Mendell assinaria a arte
gráfica de “Capricorn”, bem como também no EP que abriu a história discográfica
do Orchid. Nada mais do que natural, haja vista que de Theo que surgiu a
concepção da banda e nada mais interessante que o próprio fizesse o trabalho
estético e gráfico da banda, o que aconteceu. E é com “Capricorn” que falaremos
nessa resenha.
A produção de “Capricorn”, já
que comentei sobre o belo trabalho, ficou sob a responsabilidade de Will
Storkson e ele foi determinante para a construção sonora desse álbum e lançado
pelo selo Nuclear Blast. Há relatos, ainda na entrevista concedida para o blog
“Temple of Perdition”, de Theo Mendell onde fala sobre as influências da banda
para a concepção de seu debut:
“Se eu fosse deixado por conta
própria, nossos discos poderiam acabar soando como uma mistura de Stooges Raw
Power e Sabbath Bloody Sabbath ... Eu adoraria, mas pode parecer muito
ensopado. Vou continuar empilhando fuzz e reverb até que você não consiga ouvir
nada”.
Will ajudou e foi
preponderante na produção de “Capricorn” e o fez com um radar direcionado aos longínquos
anos 1970, mas sem negligenciar as tendências da contemporaneidade. Quanto ao
teor das letras, suas temáticas trafegam no occult rock, mas também em temas
sociais e comportamentais.
O álbum é inaugurado com a
faixa "Eyes Behind the Wall" que já entrega o ouvinte um estrondoso e
poderoso riff de guitarra, um trovão sonoro e potente. Bateria pesada, marcada,
batida forte, baixo pulsante. A “cozinha” realmente se destaca e dá o tom, o
ritmo, não é à toa que é a seção rítmica. E para aqueles que aprecia o hard dos
anos 1970, perceberá uma espécie de gravação “vintage”, com nuances antigas.
Sem dúvida a banda e o produtor conceberam a música e todo álbum assim
intencionalmente.
Segue agora com a faixa
título, “Capricorn” e a percepção de que voltamos aos anos 1970 é nítida. A
batida cadenciada, tendendo para uma levada meio jazzística é adorável e
dançante. O vocal é ameaçador, sombrio e segue também com um timbre cadenciado.
Mas logo ela irrompe em uma hecatombe pesada, um volumoso hard rock. O vocal
ganha mais alcance, mais potência, a música fica mais rápida, mas logo fica
mais lenta e assim alterna, mostrando a capacidade instrumental da banda.
“Black Funeral” surge
vagarosa, lenta, uma bateria ao fundo, com seus pratos, mas logo depois, por
pouco tempo explode em um heavy metal com guitarra tocada ao extremo e bateria
igualmente pesada. Logo volta ao clima soturno, sombrio e perigoso, com o vocal
dando a tônica. Um occult rock com linhas de heavy metal e pitadas discretas de
doom metal.
“Masters of It All” inicia com
dedilhados de guitarra ao estilo Sabbath de tocar bem interessantes. Ela é
responsável por colocar lenha na fogueira, porque, aos poucos, a faixa vai
“encorpando”, ganhando camadas mais pesadas. A bateria é tocada com um pouco
mais de agressividade e assim alterna, voltando para os dedilhados de guitarra.
Os vocais ficam mais altos no clímax hard.
“Down into the Earth” traz um
baixo dedilhado ao estilo Sabbath e explode para riffs grudentos e pesados de
guitarra te remetendo ao heavy metal. A bateria bem marcada, tocada com técnica,
mas orgânica. Riffs de guitarra, na metade da música, são percebidas com uma
pegada mais doom, mais suja e despretensiosa.
“He Who Walks Alone” é, sem
dúvidas, uma das melhores faixas do álbum, pois traz uma mescla de passado e
presente com uma incrível sinergia. Te remete ao hard rock dos anos setenta,
com o peso e a cadência e o doom metal dos anos 1980, que traz a parte mais
suja e arrastada. É agitada, enérgica, animada, encantadora e, claro, pesada.
Aqui o Sabbath, juntamente com bandas do naipe de Saint Vitus são devidamente percebidas.
Segue com “Cosmonaut of Three” que começa aterrorizante, um estilo sombrio e ameaçador que parece ser uma trilha sonora de um final de terror. A “cozinha” se destaca novamente. A bateria segue marcada, mas pesada e o baixo pulsa feito um coração em um momento dramático e tenso de pavor. Há riffs de guitarra que corroboram essas condições dando uma camada interessante à música. Uma atmosfera perigosa e que dá aula de occult rock.
“Electric Father” segue
basicamente a mesma proposta sonora de sua antecessora, explodindo em um
temperamento de doom metal, mesclado ao heavy rock e o hard rock com pegadas
setentistas. Aqui os sintetizadores ganham algum destaque e dão um tom mais
sombrio à faixa, além de um solo rápido, direto, mas competente de guitarra que
traz mais peso.
E fecha com “Albatross” que
foge um pouco do tom e da vibe das faixas anteriores. Começa com uma pegada
mais viajante e chapante, te remetendo a coisas mais experimentais e
psicodélicas. O vocal continua com aquele tom mais ameaçador e soturno,
enquanto, aos poucos, a bateria vais surgindo um pouco mais forte e discretos
dedilhados de guitarra. Os teclados entregam a condição mais viajante da faixa.
E fecha, de forma espetacular e inspiradora, com solos de guitarra lisérgicas.
O prog psych se faz presente nessa última faixa de “Capricorn”.
Em 2012, um ano depois do
lançamento de “Capricorn” o Orchid lançaria mais uma EP, o seu segundo, chamado
“Heretic”, com quatro faixas, sendo que uma delas era uma faixa de seu debut, “He
Who Walks Alone” e, no ano seguinte, em 2013 lançaria outro EP, com três
músicas e que se chamou “Wizard of War”.
E finalmente o tão aguardado
segundo álbum sairia, intitulado “The Mouths of Madness”, em 2013. A banda,
neste novo trabalho, me soou mais polida, a produção mais bem acabada e uma
banda nitidamente mais experiente e ciente da sua proposta sonora que não, não
mudou em relação ao seu debut, “Capricorn”. A sonoridade poderosa, calcada no
hard rock setentista, com pegadas atualizadas de stoner e doom metal, tendo a
concepção do occult rock dominando as ações, mostra uma banda coesa e muito
competente e coerente no que vinha, até então, fazendo. O álbum pode ser ouvido aqui!
Naquele mesmo ano, de 2013, a
banda lançaria a sua primeira coletânea, “The Zodiac Sessions”, com o que há de
melhor nos seus primeiros trabalhos. Atualmente a banda está um tanto quanto parada,
não tem realizado lançamentos, mas há informações de que um novo trabalho virá
e quando o Orchid se propõe a fazer um novo álbum, aguardem, pois há muita
coisa boa pela frente!
Theo Mindell, ainda em uma
entrevista que concedeu para o blog “Temple of Perdition”, disse não fazer ou
pelo menos não ter nenhuma intenção, com a sua música, com o Orchid, de estar
em uma cena musical, mas apenas compor as músicas que amam. Mas o fato é que o
Orchid, com a sua sonoridade que flerta com o tempo ou com “vários tempos”,
trouxe uma nova perspectiva para o rock no início dos anos 2000, o rock como
ele era, vivo e genuíno, marginalizado.
A banda:
Mark Thomas Baker na guitarra
e sintetizadores
Keith Nickel no baixo
Carter Kennedy na bateria e
percussão
Theo Mindell nos vocais,
percussão e sintetizadores
Faixas:
1 - Eyes Behind the Wall
2 - Capricorn
3 - Black Funeral
4 - Masters of It All
5 - Down into the Earth
6 - He Who Walks Alone
7 - Cosmonaut of Three
8 - Electric Father
9 - Albatross
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